o enquadramento das ciências sociais na sociedade moderna

INTRODUÇÃO
O presente estudo visa a debruçar sobre ciências sociais que por sua vez podemos dizer que é o estudo das origens, do desenvolvimento, da organização e do funcionamento das sociedades e culturas humanas. O objecto de estudo da ciência social estuda os fenómenos, as estruturas e as relações que caracterizam as organizações sociais e culturais. Ele analisa os movimentos e os conflitos populacionais, a construção de identidades e a formação das opiniões. Pesquisa costumes e hábitos e investiga as relações entre indivíduos, famílias, grupos e instituições. Desenvolve e utiliza um conjunto variado de técnicas e métodos de pesquisa para o estudo das colectividades humanas e interpreta os problemas da sociedade, da política e da cultura.



AS ORIGENS DA CIÊNCIA SOCIAL
As Ciências Sociais são mencionadas, pela maioria dos intelectuais, como as disciplinas de natureza do modo de produção capitalista, ou seja, disciplinas que surgiram com o advento do capital, após a grande indústria. Aceitá-las como ciências históricas (produtos), referentes a um determinado desenvolvimento das forças produtivas, como resultado da atividade de toda uma série de gerações as quais são responsáveis pela compreensão e transformações do cenário social é algo que, recorrentemente, se observa na obra de Marx.
Entretanto, é mister virar-se para o passado e perceber de que modo se dava a apreensão do pensamento frente aos problemas sociais oriundos das condições materiais de existência do homem para entender a totalidade das Ciências Sociais na sociedade burguesa.
Em todos os modos de produção da história, a apropriação do conhecimento sempre foi uma atividade necessária para que o homem conseguisse superar a natureza e transformar as coisas para si.
A dialética da atividade e da passividade do conhecimento humano manifesta-se, sobretudo, no fato de que o homem, para conhecer as coisas em si, deve primeiro transformá-las em coisa para si; para conhecer as coisas como são independentemente de si, tem primeiro de submetê-las à própria práxis: para poder constatar como são elas quando não estão em contacto consigo, tem primeiro de entrar em contacto com elas. O conhecimento não é contemplação. A contemplação do mundo se baseia nos resultados da práxis humana. O homem só conhece a realidade na medida em que ele cria a realidade humana e se comporta antes de tudo como ser prático (KOSIK, 2002: 28).
Desta maneira, tinha-se na era pré-capitalista, mormente na sociedade grega, a filosofia como instrumento necessário, cujo sentido era a busca do conhecimento acerca das condições de existência do homem, isto é, usar o conhecimento para desenvolver e reproduzir a realidade na qual vivia. Com Platão e Aristóteles quiçá tenha-se alcançado o sentido mais acabado da investigação da realidade social.
Porquanto é em Hegel que a filosofia - como conhecimento da realidade – assume um caráter de destaque quando expressa a concepção de que o mundo das ideias determina o ser social, quando explica à práxis a partir da ideia. Hegel anuncia, portanto, o espírito idealista da história (evolucionismo espiritualista) o que seria o germe da crítica de Marx à perspectiva hegeliana.
A força motora da História, também de religião, da filosofia e de todas as demais teorias, não é a crítica, mas sim a revolução. Ela mostra que a história não termina resolvendo-se na “Consciência de Si” como “espírito do espírito”, mas que nela, em todo os estádios, se encontra um resultado material, uma soma das forças produtivas com a natureza e dos indivíduos uns com os outros que a cada geração é transmitida pela sua predecessora, uma massa de forças produtivas capitais e circunstanciais que, por um lado, é de fato modificada pela nova geração, mas que por outro lado também lhe prescreve as suas próprias condições de vida e lhe dá um determinado desenvolvimento, um caráter especial – mostra, portanto, que as circunstâncias fazem os homens como os homens fazem as circunstâncias (MARX. 2002: 48).
Marx, por sua vez, estabelece a sua concepção da história:
Não se parte daquilo que os homens dizem, imaginam ou se representam, e também não dos homens narrados, pensados, imaginados, representados, para daí chegar aos homens em carne e osso; parte-se dos homens realmente ativos, e com base no seu processo real de vida apresenta-se também o desenvolvimento dos  reflexos e ecos ideológicos deste processo de vida (Op. cit. 2002: 54).
Pensa-se, com isto, que em Marx tem-se a passagem do pensamento social – filosófico - ao pensamento científico, Ciência Social. As condições materiais para se chegar a esta conclusão concernem ao grau de desenvolvimento que alcançaram as forças produtivas do capital no período industrial, cujo sentido é determinado, pela maioria dos cientistas sociais, como o momento que engendra o nascimento das Ciências Sociais.
Este artigo tem a intenção de contribuir nesta perspectiva, ou seja, mostrar a institucionalização das Ciências Sociais na América Latina como o resultado do processo de industrialização e da subsequente complexidade social que emerge. Com efeito, as Ciências Sociais, em grande medida, surgem para apreenderem o novo cenário social das sociedades modernas e para investigar acerca das transformações engendradas pelo grassar das forças produtivas do capital. Não resta dúvida que as Ciências Sociais traduzem a produção do conhecimento sobre os problemas sociais em uma gigantesca organização da ciência onde a metodologia, epistemologia e a teoria ganharam importância na escala do desenvolvimento social.
Desta maneira, tentar-se-á dividir o artigo em dois eixos temáticos, isto é, o primeiro eixo apresentará as condições pelas quais a institucionalização foi possível. O espírito será situar as Ciências Sociais como as formas mais acabadas do pensamento filosófico-social e como as somas das compreensões históricas sobre as condições materiais de existência humana feitas por gerações passadas.
O segundo eixo, versar-se-á sobre, as características e os avanços das Ciências Sociais na América Latina; para tanto, mostrar-se-á a forma pela qual se constituíram, cuja condição, em um longo período, era de ser caixa de ressonância do pensamento europeu e, somente, em meados do século XX foi possível uma investigação mais contundente e séria acerca da realidade social latino-americana.








A SOCIEDADE MODERNA E AS CIÊNCIAS SOCIAIS
Uma relevante contribuição para este tema é o livro de Immanuel Wallerstein “Impensar las Ciencias Sociales” cuja publicação, vale comentar, está inteiramente a serviço da compreensão e consolidação do seu “sistema mundo moderno”. Neste livro Wallerstein menciona que:
a institucionalização das Ciências Sociais, as quais, como chegou a se defini-las no século XIX, foram o estudo empírico do mundo social, um estudo realizado com a intenção de compreender o “cambio normal” e, assim influir nele. As Ciências Sociais não foram o produto de pensadores sociais solitários, senão, a criação de um grupo de pessoas dentro de estruturas específicas para alcançar fins específicos. Implicou em uma inversão social importante, que nunca antes havia sucedido com o pensamento social (1998: 260).
Nas palavras de Wallerstein – para quem “as Ciências Sociais são as enunciações dos conjuntos de regras universais que explicam o comportamento social dos seres humanos” (1998: 262) – após a grande indústria as Ciências Sociais são abarcadas pelas universidades, centros e institutos de pesquisas e estudos apontando assim a produção do conhecimento científico para explicar as relações sociais decorrentes do modo de produção capitalista. “As Ciências Sociais se converteram cada vez mais em uns instrumentos para governar, de maneira inteligente, um mundo onde a transformação social era normal e, portanto, ajudaram a limitar o alcance de ditas transformações” (Op. cit. 1998: 23).
Uma outra, central, contribuição foi o modo pelo qual as Ciências Sociais constituíram-se na emergente sociedade burguesa moderna, isto é:
O principal modo de institucionalizar as Ciências Sociais foi mediante a diferenciação na estrutura universitária tradicional europeia que em 1789 quase se encontrava moribunda. As universidades, que nesse momento dificilmente eram centros intelectuais vitais, se encontravam ainda organizadas a maneira tradicional de quatro faculdades: teologia, filosofia, direito e medicina. Ademais, havia relativamente poucas universidades. No transcurso do século XIX se criaram muitas cátedras novas, em grande medida na faculdade de filosofia e sem menor grau na de direito (Op. cit. 1998: 21-22).
Embora as produções supracitadas dos intelectuais brasileiros fossem, no seu valor sociológico, consideradas controvertidas, caracterizavam a produção brasileira em uma área que estava em franco desenvolvimento. As novas transformações sociais provocadas pela “grande depressão” de 1929 aceleraram ainda mais o caráter produtivo das áreas das Ciências Sociais.
No México, ainda sob os efeitos da Revolução Mexicana de 1910, as transmutações sociais ocorridas no segundo decénio do século vinte – no âmbito acadêmico institucional – mostram o novo carácter da sociedade. A maior universidade da América Latina – UNAM – redimensiona a Faculdade de Ciências Sociais em 1929, cria o Instituto de Investigações Económicas em 1941, dentro da Escola Nacional de Economia, e o Departamento de Psicologia na Faculdade de Filosofia e Letras e os Departamentos de Humanidades e Investigação Científica em 1944.
Na Argentina, precisamente em Córdoba, o terreno para a institucionalização das Ciências Sociais havia sido “adubado” um pouco mais de uma década atrás, pela Reforma Universitária de Córdoba de 1918.
La Reforma Universitária de 1918 foi um acontecimento que mobilizou a maioria dos centros universitários latino-americanos no sentido de repensar e revolucionar os mecanismos de dominação das universidades, que naquele momento estavam embrenhados nas garras do regime colonial. Os estudantes, os protagonistas, sem vacilar rebelaram-se contra o regime autoritário, contra a administração que não respondia às demandas dos acadêmicos, contra o método docente inexequível ausente das investigações científicas e contra o paradigma de ensino que não contemplava a objetividade da realidade social.
Evidentemente, que não se descarta a existência de um pensamento social profundamente inclinado a analisar a realidade social fora das universidades. Isto seria um olímpico desprezo pelos intelectuais independentes, incorretos, aqueles que não estão sobre a tutela do estado burocrático para responder às suas exigências teóricas, tal qual propôs Schopenhauer na sua filosofia universitária, ou os intelectuais revolucionários no México no final do século XIX.
Portanto, “a massiva institucionalização das ciências sociais na grande maioria dos países latino-americanos ocorreu paralelamente com o período de expansão capitalista global...” (SONNTAG citado por Sotelo. 2005: 32), é a razão para o aparecimento de uma abordagem mais segura e comprometida acerca dos assuntos latino-americanos, terminando de uma vez por todas “a difícil gestação de uma Ciência Social crítica, centrada na problemática de nossas estruturas econômicas e sociais, políticas e ideológicas”, (MARINI. 2000: 265).
Com a institucionalização, dialeticamente surge outro fenômeno que é mister sublinhar, a saber, o pensamento revolucionário do século XIX, perde vitalidade com o nascimento das Ciências Sociais. Tinha-se com José de San Martí e com Simon Bolívar, e soma-se a eles os precursores intelectuais do México, um pensamento esclarecido e com o horizonte teórico-revolucionário muito bem definido. As Ciências Sociais, evidentemente, marcam um outro momento da história da América Latina, porém a vocação de uma teoria voltada para a revolução e inclinada totalmente aos assuntos latino-americanos perde força com a institucionalização. As correntes teóricas eurocêntricas e norte-americanas aparecem no novo cenário da América Latina e buscam explicar a realidade social mediante as suas concepções. Nesta perspectiva, muitas vezes, ocultavam o verdadeiro significado do pensamento revolucionário da América Latina; este foi, sem dúvida, o maior embate teórico que o pensamento latino-americano enfrentou.
É oportuno trazer à luz, que o desenvolvimento das Ciências Sociais no segundo quartel do século XX não se dá através do processo permanente de crítica, ou seja, o pensamento social crítico, que combatesse os modelos hegemônicos e que estivesse debruçado profundamente no conhecimento da realidade social latino-americana, não era a característica das Ciências Sociais no período de institucionalização; o padrão organizativo e institucional subsume a possibilidade de uma Ciência Social crítica. O espírito crítico aparece em meados do século vinte, especialmente, com teoria marxista da dependência e com alguns intelectuais que de maneira isolada produzem obras de excelente nível.
Uma outra abordagem são as intensificações comerciais que suscitavam entre os países latino-americanos. Ruy Mauro Marini prossegue observando:
Paralelamente, se intensificam as relações comerciais e políticas entre os países da região, suporte necessário para um conceito autônomo de latino-americanismo. Até aquele momento, a ideia de América Latina se havia esboçado desde a Europa, como simplificação adequada para um esquematismo ignorante, tanto por parte dos setores dirigentes como da esquerda (2000: 264).
Com isso, não resta dúvida que as Ciências Sociais da América Latina, acabam de surgir; doravante, começam a aparecer trabalhos da mais alta qualidade teórica e metodológica. A busca de uma investigação que abarcasse a epistemologia e a relação de dependência e subdesenvolvimento de nossas sociedades passa a ser, em grande medida, o paradigma das pesquisas das Ciências Sociais.
Contudo, é mister fazer outras considerações acerca deste fenômeno. Nos finais da década de quarenta do século XX, a Comissão de Estudos para a América Latina e o Caribe - CEPAL - surge como uma via extraordinariamente importante para explicar os assuntos políticos-econômicos latino-americanos; reflexo evidente do novo cenário que apresentam as Ciências Sociais.
Os mais expoentes pensadores da CEPAL como: Raul Prebisch e Celso Furtado fazem análises referentes ao caráter de subdesenvolvimento em que se encontra o continente latino-americano.  Na visão da CEPAL, o mecanismo de superação deste atraso estaria na consolidação de um maciço processo de industrialização “uma vez que ele será capaz de provocar a transformação das estruturas econômicas, corrigir o desequilíbrio nas relações comerciais internacionais, e permitir a assimilação do progresso técnico”, segundo analisa José Sérgio R. De Castro Gonçalvez. (Em: Furtado. 1983: 14)
Outra fonte de inspiração das Ciências Sociais, ante o processo de institucionalização, foi o papel que desenvolveu o marxismo no cerne da sociedade; o marxismo em meados do século XX foi uma relevante teoria a elaborar trabalhos sérios.
É neste sentido que se pode citar autores marxistas, como o argentino Sérgio Bagú (1949), o brasileiro Caio Prado Júnior (1959) e o chileno Marcelo Segall (1953) que, duas décadas depois da crise de 1929 e do subsequente processo de institucionalização das Ciências Sociais, já faziam abordagens acerca da nova realidade.















AS CIÊNCIAS SOCIAIS NO MUNDO CONTEMPORÂNEO
A história da humanidade pode ser compreendida sob um ponto de vista epistêmico que a ordene com base nos valores dominantes em cada época, levando em conta que as relações sociais são sempre permeadas por  um modo específico de pensar (Marcondes Filho, 1987: 9).
Assim entendendo, podemos ordenar longos períodos históricos á luz  de incontestes hegemonias (no sentido gramsciano) quanto as formas de pensar; a saber: o período dominado pelo pensamento mágico, pelo filosófico, pelo religioso e, a partir da modernidade, pela crença na eficácia da ciência. Essas formas de conhecimento, uma vez hegemônicas, independem de “acertos” ou grau de “verdade”, pois se legitimam na medida em que dão fundamentos ideológicos  ao modu vivendi dominante no período considerado.
Sendo na atualidade a ciência, ainda, e apesar da propalada “crise dos paradigmas”, a forma hegemônica de conhecimento, ela imprime modos específicos de pensar que permeiam as relações sociais. Mas pode-se simplesmente dizer que a vida social é regida por esta forma específica de conhecimento hegemônico? Ambiguamente pode-se responder: sim e não.
De certo modo há um forte grau de consenso em torno da premissa de  ser a ciência basicamente um conjunto articulado de conhecimentos sobre determinado objeto, ou seja, os conhecimentos obtidos mediante a observação dos fatos e um método próprio de investigá-los. Método que sofre variações quanto as diferentes escolas do pensamento e áreas de investigação. Acrescente-se ao dito que a ciência observa regras de sistemática, objetividade, controle, predição, precisão e mais uma infinidade de estatutos, chegando a desqualificar juízos de valor (Weber: 1977), enfatizando a neutralidade e a mensurabilidade. Por outro lado, de forma panorâmica, pode-se também dizer que as formas de pensar que orientam o ordenamento das relações sociais na contemporaneidade, não são inteiramente informadas pelo saber científico, enquanto maneira de pensar hegemônica.

Fatos sociais
Emile Durkheim (1858-1917), contribuiu sobremaneira no sentido de dar  estatuto científico à sociologia, ao construí-la à luz de objeto de estudo e método próprio. Através de um esforço monumental dotou-a de um corpo de conceitos adequados e de específicos processos de investigação e de interpretação. No livro “As Regras do Método Sociológico”, Durkheim postulou serem os “fatos sociais” externos aos indivíduos (portanto fatos objetivos)  e “também dotados de um poder imperativo e coercitivo, em virtude do qual se lhe impõem, quer queira, quer não”. (Durkheim, 1982: 2).
A distância temporal que nos separa dos escritos de Durkheim, inclui, necessariamente, todo o advento do processo científico-tecnológico moderno e seus desdobramentos. Os fatos sociais, na atualidade, podem ser artificialmente construídos tanto pela “propaganda ideológica” que “visa controlar o juízo público” (Chomsky, s/d: 11), intentando forjar consenso político, quanto pelos modernos meios de comunicação de massa, em atendimento aos interesses econômicos através da fabricação de gostos e padrões de consumo coletivos, pois os fatos sociais foram transformados em mercadorias que, no dizer de um estudioso: “são as mais humanas de todas, pois vendem a varejo, os hectoplasmas de humanidade, os amores e os medos romanceados, os fatos variados do coração e da alma”. (Morin, 1975: 9).
Os homens necessitam dar um significado à realidade que os rodeia pelo simples fato dela existir e, portanto, não podem prescindir de elaborar justificativas para os fenômenos naturais e sociais. Essa justificativa imperativa, os leva a criar padrões culturais. Sociedades diferentes, dão sentido às suas existências de formas diversas, uma vez que produtos de culturas diferenciadas. Este  anti-etnocentrismo cultural deixa patente que as ideias de “certo” e de “errado” não podem ser encontradas num absoluto, mas sim na cultura de cada sociedade. Se fosse um absoluto, teríamos apenas uma cultura única, uma mesma e indiferenciada visão de mundo, universalizada. As diversas culturas legitimam as suas respectivas visões de mundo, pois estas dão significado à existência, independente de serem de caráter religioso, mágico, filosófico ou científico, ou seja, “nas culturas pré-industriais a magia é o ‘estabilizador cultural’ enquanto que na cultura industrial moderna tal função é desempenhada pela ciência como técnica”. (Bartholo Jr., 1986: 23).
A cultura de determinada sociedade estabelece um patamar no qual as normas e leis (folkways e mores) tornam a convivência possível. Costumes, normas, leis, formam o suporte sob o qual os membros de determinada sociedade se baseiam na busca de um equilíbrio para as suas existências. É como um paradigma (no sentido kuhniano). É como um corpo geral, um sentimento do mundo, nem sempre explicitado. Nas sociedades modernas, fazem parte deste corpo geral, além do aparato jurídico, possibilidades ideais tais como: igualdade, equidade, justiça, honra, honestidade e outros “sentimentos edificantes”... Mas há uma idealidade que se destaca das demais, sob o aspecto de apresentar a capacidade de oferecer uma quase mensurabilidade: a ideia de igualdade política e jurídica entre todos os homens. Realizando o pressuposto baconiano de desvendar os “mistérios da natureza”, as ciências naturais, através da instrumentalização dos fecundos conhecimentos produzidos, vai efetivando cada vez mais um avassalador controla sobre os fenômenos naturais. Desta forma, a moderna ciência natural torna-se ciência aplicada apresentando o seu traço distintivo enquanto ciência: a “sua indissolúvel vinculação ao método experimental e com isso a exatidão dos aparatos técnicos de medida” (Bartholo Jr., 1986: 61). O mesmo não ocorre com as ditas ciências sociais; isto por uma impossibilidade intrínseca, pois como argumentou Max Weber o método das ciências naturais é explicativo e o das ciências da cultura, compreensivo. Ainda em fase de gestação, há um rascunho de teoria social que tenta justificar as mazelas humanas (fome, exclusão, violência, injustiças, etc.) no fato de as ciências da sociedade não possuírem “precisão” comparável á das ciências naturais. Esse problema, apesar de uma aparente clareza e simplicidade de raciocínio, encobre uma lógica perversa, uma tautologia, ou mesmo a velha história de se entregar à raposa a chave do galinheiro.
No que tange a anteriormente referida necessidade de explicação das coisas, consideramos que ela possui um duplo aspecto: interno e externo. Sob o aspecto interno, as possibilidades de um subjetivismo manipulador, são quase nulas, pois que dispensáveis enquanto exercício já que “foram validadas num processo argumentativo em que o consenso foi alcançado, sem deformações externas, resultantes da violência” (Rouanet, 1984: 14). Por outro lado, sob o seu aspecto externo, as explicações que muitas vezes têm sido produzidas tipificam-se pela farta manipulação. É exatamente sob os seus aspectos de externalidade que a manipulação encontra seus motivos e suas justificativas nos interesses de grupos, classes ou frações de classe.
Uma excessiva manipulação do sistema de valores de um mundo cada vez mais globalizado tende a comprometer o sistema de hábitos estabilizados e introduzir situações caóticas. Assim como o nosso meio ambiente (entendido como sistema fechado) possui seus limites e irreversibilidade quanto à intervenção técnica, a intervenção no sistema simbólico decerto estabelece limites e irreversibilidade quanto à indiscriminada intervenção no sistema de valores. Esta intervenção em nada se compara às hegemonias mágica, filosófica ou religiosa do passado, uma vez que estas buscavam uma permanência ao passo que a intervenção moderna, de caráter lógico-operativo, está ancorada em mudanças constantes e contraditórias.
Na atualidade, por artes da denominada globalização, há pelos quatro cantos da terra um processo de franca e inequívoca degradação da credibilidade. Um unânime manto de suspeição reveste quaisquer enunciados - objetivos ou subjetivos - que porventura possam ser elaborados. Perplexas as pessoas comuns e mesmo os estudiosos (e suas teorias) buscam uma apreensão lógica, na tentativa de captura racional para estes rumos tecnológicos e mesmo um entendimento dos efeitos de todo esse processo sobre a humanidade. Tal problema, de tamanha magnitude e complexidade, desafia a capacidade de síntese e a possibilidade de discernimento abrangente.



CONCLUSÃO
Por suas especificidades, as ciências sociais desenvolveram um pensamento marcado por fortes reacções contra interpretações biologistas. De qualquer forma, acreditamos que seria incorrecto ver suas teorias como um retrocesso em relação às anteriores. Pelo contrário, os clássicos, sempre que correctamente contextualizados historicamente, representam um avanço sobre as teorias sociais de sua época. A preocupação com a classe na teoria e na análise dos movimentos sociais parece suscitar antigas questões que foram ultrapassadas pela evolução da sociedade moderna. A classe não cumpre mais um papel nos discursos diagnósticos sobre as sociedades modernas avançadas. Tornou-se até elegante fazer diagnósticos críticos das sociedades modernas além e contra o discurso em termos de classe. A queda dos regimes comunistas e a ascensão do nacionalismo deram um ímpeto adicional a argumentos em favor da obsolescência da análise de classe para as sociedades modernas. A classe tem a ver com a sociedade industrial e suas ideologias, e como essas sociedades e suas ideologias não mais existem, deveríamos nos livrar das velhas concepções e ferramentas analíticas usadas para entender a sociedade moderna.




BIBLIOGRAFIA
_______________AS CIÊNCIAS SOCIAIS NO MUNDO CONTEMPORÂNEO E O ENIGMA DA ESFINGE. Disponível em em: http://www.achegas.net/numero/dezoito/m_cavalcante_18.htm. Acessado aos 18 de Novembro de 2014 
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