evolução histórica do direito da família
Introdução
Direito
de família é o ramo do direito que contém normas jurídicas relacionadas com a
estrutura, organização e proteção da família. Ramo que trata das relações
familiares e das obrigações e direitos decorrentes dessas relações, ou seja, é
o ramo do Direito que regula e estabelece as normas de convivência familiar.
Dentro
do Direito de Família, encontramos o Casamento, que é a união voluntária entre
duas pessoas dos sexos opostos, formalizada nos termos da Lei, com o objetivo
de manter uma plena comunhão de vida.
Evolução
Histórica Do Direito Da Família
A invenção do Direito Matrimonial
(séc. XII e XIII)
Por
“invenção” do Direito matrimonial quer-se significar a transformação em normas
jurídicas estaduais, em Direito aceite e aplicado pelo “Estado”, das normas
eclesiásticas sobre o casamento que viam neste um vínculo indissolúvel,
perpétuo, monogâmico, heterossexual e de carácter sacramental. Sobretudo a
afirmação “jurídico-estadual” da sua perpetuidade. “Invenção” que se enraizou
na competência exclusiva da jurisdição eclesiástica sobre o matrimónio
verificada a partir do séc. XI.
O
séc. XIII é o da ordem: política, social, profissional, religiosa. Ordem
querida por Deus, e mantida pelo Papa, detentor das “duas espadas”, do poder
espiritual e temporal.
O
séc. XIII, os ideólogos compraziam-se em descrever a ordem: o inferior
subordinado ao superior; o “júnior” sujeito ao “sénior”; os ofícios agrupados
em corporações; tal como Deus-pai, a Virgem Maria e Cristo, também o casal
cristão e os FILHOS, o casamento disciplinado as paixões, e organizando a
procriação.
O trabalho complementar: a reelaboração dos
fins do casamento
Na
época em que os canonistas impõem à sociedade a “sua” instituição matrimonial,
havia que a justificar socialmente. Pouco a pouco abandona-se a severidade dos
padres da Igreja para quem o casamento, inquinado pela concupiscência, vizinho
próximo do pecado. Através da procriação, primeiro, do auxílio mútuo dos
cônjuges e do remédio da concupiscência, depois o casamento aparece
justificado, correspondendo às necessidades permanentes da sociedade e dos
próprios cônjuges. Mas foi este um processo longo e tardio, talvez só nos
nossos dias completo. Desvalorizando perante a “ordem do ministério”, o
sacramento do matrimónio tem sempre, próximas, as suas raízes de simples
“remédio” tolerado.
Santo
Agostinho via em três “bens”: “proles”, “fides” e “sacramentum”, a razão
determinante da instituição do matrimónio por Cristo. “Proles” significa a
procriação e a educação dos filhos; “fides”, a fidelidade que se devem os
cônjuges; “sacramentum”, o vínculo indissolúvel entre os cônjuges, que
simboliza a ligação entre Cristo e a Igreja.
O
uso do casamento deve estar sempre subordinado à geração, sendo a procura do
prazer um pecado venial. É assim que o casamento é um “remédio da enfermidade”,
permitindo o uso ordenado dos prazeres da carne.
O
matrimónio como sacramento
Os
teólogos e canonistas sempre qualificaram o matrimónio como sacramento.
Contudo,
até meados do séc. XII, fundamentalmente até à obra de Pedro Lombardo, a
incerteza sobre o conteúdo da noção “sacramentum”, tomado este em sentido muito
lato, tornava pouco precisa a qualificação do matrimónio como um sacramento. A
partir do séc. XII, com a precisão do conceito de sacramento, as incertezas
acabaram.
Santo
Alberto Magno considera o matrimónio perfeito pela simples troca dos
consentimentos. Figurando a união de Cristo com a sua Igreja, através da união
dos esposos, confere a graça. É pois, um sacramento. Pontos de vista que são seguidos
por S. Tomás de Aquino.
Evolução
Do Direito Da Família
Segundo
Gonçalves o direito de família, se
comparado a todos os outros ramos do direito, é o que encontra-se mais
intimamente ligado à própria vida, afinal, os indivíduos no geral são providos
de um organismo familiar. Para este autor, família é considerada como um instituto
de realidade sociológica e constitui a base do Estado, o núcleo central de
qualquer organização social, conforme se demonstra a seguir:
Em
qualquer aspecto em que é considerada, aparece a família como uma instituição
necessária e sagrada, que vai merecer a mais ampla proteção do Estado. A
Constituição Federal e o Código Civil a ela se reportam e estabelecem a sua
estrutura, sem no entanto defini-la, uma vez que não há identidade de conceitos
tanto no direito como na sociologia. Dentro do próprio direito a sua natureza e
a sua extensão variam, conforme o ramo.
O
conceito de família para o estudo deste trabalho pode ser dividido em três
vertentes uma mais jurídico-normativa, outra antropológica e por fim a que deve
ser maior objeto de estudo neste projeto, a subjetivista.
Gonçalves
que possui uma visão mais normativa do direito de família, disserta que os
direitos de família são aqueles que existem por uma pessoa pertencer a uma
determinada família, sendo classificado como cônjuge, pai, mãe ou filho,
diferente dos direitos patrimoniais que tem valor pecuniário. O direito de
família, contudo, pode ter atribuído a si conteúdo patrimonial, pois, é um ramo
que disciplina não só as relações patrimoniais como também as patrimoniais,
conforme ser exposto a seguir:
“Conforme
a sua finalidade ou o seu objetivo, as normas do direito de família ora regulam
as relações pessoais entre os cônjuges, ou entre os ascendentes e os
descendentes ou entre parentes fora da linha reta; ora disciplinam as relações
patrimoniais que se desenvolvem no seio da família, compreendendo as que se
passam entre cônjuges, entre pais e filhos, entre tutor e pupilo; ora
finalmente assumem a direção das relações assistenciais, e novamente têm em
vista os cônjuges entre si, os filhos perante os pais, o tutelado em face do
tutor, o interdito diante do seu curador. Relações pessoais, patrimoniais e
assistenciais são, portanto, os três setores em que o direito de família atua.”
Entrando
na vertente antropológica, Luiz Gonzaga
de Mello entende que é comum não percebermos que os laços que unem marido e
mulher não são de origem consanguíneas, sendo então laços de afinidade que os
unem em matrimônio. Tais laços de afinidade são de extrema importância para
configuração da organização social de qualquer agrupamento humano.
Ao
se falar de família, via de regra, surge logo o entendimento de uma unidade
social composta de pessoas unidas por laços que podem ser afetivos ou
sanguíneos. O doutrinador disserta ainda que o termo família é um termo vago,
como será visto a seguir:
“Na
família pode-se discernir varias instituições familiares, tais como: o namoro,
o noivado, o casamento, a vida conjugal com todos os seus papéis (pai, mãe,
filhos, sogros, etc.).No entanto, não se pode esquecer que as instituições
familiares são universalmente reconhecidas, embora em cada sociedade elas
assumam formas diferentes. O certo é que o termo “família” é um tanto vago e
pode significar: a)o grupo composto de pais e filhos; b) uma linhagem
patrilinear; ou uma linhagem patrilinear; c) um grupo cognático, isto é, de
pessoas que descendem de um mesmo antepassado, seja através de homens ou de
mulheres; d) um grupo de parentes e seus descendentes, que vivem juntos.”
Segundo
o entendimento subjetivista de Maria
Berenice Dias, a sociedade só aceitava o conceito de família instituído sob
uma base matrimonial, por isso o ordenamento jurídico brasileiro só dissertava
sobre casamento, as relações de filiação e o parentesco. As relações
extramatrimoniais só começaram a ingressar no ordenamento por jurisprudência,
contudo as relações homoafetivas não foram disciplinadas pelo Código Civil. O
instituto familiar ao contrário do que se diz não está em decadência, de acordo
com o entendimento da autora a seguir:
“A
família, apesar do que muitos dizem, não está em decadência. Ao contrário, é o
resultado das transformações sociais. Houve a repersonalização das relações
familiares na busca do atendimento aos interesses mais valiosos das pessoas
humanas: afeto, solidariedade, lealdade, confiança, respeito e amor. Ao Estado,
inclusive nas suas funções legislativas e jurisdicionais, foi imposto o dever
jurídico-constitucional de implementar medidas necessárias e indispensáveis
para a constituição e desenvolvimento das famílias.
O
dever jurídico com a sociedade mudou, sendo necessário que a jurisprudência
seja o maior aliado das mutações pelo qual a sociedade esta passando, seja no
âmbito da família, da adoção ou até mesmo de sucessões.
A
família, ao longo da evolução história sofreu importantes transformações, sendo
considerada por alguns povos antigos como um instituto de ampla importância.
Segundo
o autor Venosa nas primeiras civilizações como as assírias, hindu, egípcia,
grega e romana, a família era uma entidade ampla e hierarquizada, sendo hoje
quase de âmbito exclusivo de pais e filhos.
Com
a evolução do instituto da família, confirma-se que os motivos para constituir
a família mudaram, e é necessário um amparo jurídico legislativo para
acompanhar o processo de evolução do instituto familiar.
Evolução
histórica da família
A
família, primeira célula de organização social, vem evoluindo gradativamente,
desde os tempos mais remotos até a atualidade. Noé Medeiros afirma que a
família, por ser mais antiga que o Estado, constitui-se como célula germinal da
comunidade estatal.
Rodrigo da Cunha Pereiraexplica
a evolução da família fazendo menção a três fases históricas, sendo elas: o
estado selvagem, barbárie e civilização.
“No
estado selvagem, os homens apropriam-se dos produtos da natureza prontos para
serem utilizados. Aparece o arco e a flecha e, consequentemente, a caça. É aí
que a linguagem começa a ser articulada. Na barbárie, introduz-se a cerâmica, a
domesticação de animais, agricultura e aprende-se a incrementar a produção da
natureza por meio do trabalho humano; na civilização o homem continua
aprendendo a elaborar os produtos da natureza: é o período da indústria e da
arte.”
Friedrich Engelsanalisa
as fases pré-históricas até a civilização, descrevendo primeiramente o estado
selvagem, dividindo-o em três fases. Na fase inferior, o homem vivia em árvores
e lutava pela sobrevivência em meio a feras selvagens. Sua alimentação era à
base de raízes e frutos. Na fase média, o homem começou a agregar à sua
alimentação frutos do mar, e caracterizou-se pelo surgimento do fogo, a maior
descoberta da humanidade. Em virtude de tal descoberta, o homem buscou
aprimorar sua alimentação com tubérculos, caça e farináceos cozidos com cinzas
quentes. Por fim, o autor destaca a fase selvagem superior, a qual ocorreu
quando o homem despertou para as invenções de armas usadas na caça de animais.
As residências fixavam-se em aldeias e os homens passavam a desenvolver
atividades como construção de utensílios feitos de madeira e tecidos
confeccionados a mão.
Quanto à fase da
barbárie, Friedrich Engels divide
seu estudo também em três fases idênticas às acima mencionadas. Primeiramente a
fase inferior, quando da descoberta da argila e da utilização da mesma para
revestir cestos e vasos para torná-los refratários. Outra característica importante
dessa fase foi que o homem passou a produzir o seu próprio sustento, através do
cultivo doméstico de plantas e da criação de animais. O mesmo autor descreve
algumas características importantes desse período:
“Viviam
em casas de tijolos secados ao sol ou pedra, casas em forma de fortalezas,
cultivavam em terrenos irrigados artificialmente o milho e outras plantas
comestíveis, diferentes de acordo com o lugar e clima e que eram sua principal
fonte de alimentação. Haviam chegado até a domesticar alguns animais: os
mexicanos, o peru e outras aves; e os peruanos, a lhama. Além disso, sabiam
trabalhar os metais, exceto o ferro, razão pela qual não conseguiam ainda
prescindir das armas e instrumentos de pedra”.
Percebe-se
que nesse momento histórico o homem despertou para o cultivo de produtos
agrícolas e para a domesticação de animais, passou a viver em casas e a
conviver em grupos, nas chamadas aldeias. E, na fase superior da barbárie, o
homem inventou a escrita e despertou para a fundição do minério de ferro.
No que diz respeito
especialmente à evolução da família, Noé
de Medeiroselenca algumas teorias:
“Basicamente
a família segundo Homero, firmou sua organização no patriarcado, originado no
sistema de mulheres, FILHOS e servos sujeitos ao poder limitador do pai. Após
surgiu a teoria de que os primeiros homens teriam vivido em hordas promíscuas,
unindo-se ao outro sexo sem vínculo civis ou sociais. Posteriormente,
organizou-se a sociedade em tribos, evidenciando a base da família em torno da
mulher, dando origem ao matriarcado. O pai poderia até ser desconhecido. Os
filhos e parentes tomavam as normas e nome da mãe”.
Desse
modo, conforme o autor, a família inicialmente foi chefiada pela mulher, mas
por um período muito curto, pois, em seguida o homem assumiu a direção da
família e dos bens. Neste diapasão, Friedrich
Engels, ao estudar a família, divide sua evolução em quatro etapas: família
consanguínea, família punaluana, família pré-monogâmica e a família monogâmica.
A
família consanguínea foi a primeira etapa da família. “Nela, os grupos
conjugais se separam por gerações. Todos os avôs e avós, dentro dos limites da
família, são em seu conjunto, marido e mulher entre si”.
Nessa
espécie de família, seus membros se relacionavam sexualmente, entre si: irmãos com
irmãs, marido e mulher. Esse modelo de família, no entanto, acabou
desaparecendo, dando lugar ao modelo de família punaluana, excluindo a prática
da relação sexual entre os membros da própria família, sendo que em seu auge,
foi determinada a proibição do casamento entre primos de segundo e terceiro
graus.
Friedrich
Engels enfatiza como era a relação materno-filial, nas famílias formadas por
grupos:
“Em
todas as formas de famílias por grupos, não se pode saber com certeza quem é o
pai de uma criança, mas sabe-se quem é a mãe. Muito embora ela chame seus
FILHOS a todos da família comum e tenha para com eles deveres maternais, a
verdade é que sabe distinguir seus próprios filhos dos demais. É claro,
portanto, que, em toda a parte onde subsiste o casamento por grupos, a
descendência só pode ser estabelecida do lado materno e, portanto, reconhece-se
apenas a linhagem feminina. De fato é isso que ocorre com todos os povos que se
encontram no estado selvagem e no estado inferior da barbárie.”
Pelo
fato das famílias viverem em grandes grupos, era normal que as mulheres se
relacionassem com diversos homens, dificultando a identificação do pai, porém a
mãe estava sempre certa, vez que estava vinculada à gestação. A partir da
proibição do casamento entre seus membros, a família foi se fortalecendo
enquanto instituição social e religiosa.
Na
família pré-monogâmica, a mulher deixa de relacionar-se com vários homens para
ser de propriedade de um só, enquanto ao homem era permitido a prática da
poligamia. Se fosse constatado o adultério, por parte da mulher, ela era
castigada de forma cruel.
Nas
formas anteriores de família, o homem nunca sentira dificuldade em encontrar
mulheres, podiam optar por uma ou mais, porém na família pré-monogâmica esses
hábitos tornaram-se raros, sendo necessário procurá-las. Friedrich Engels afirma: “por isso começam com o casamento
pré-monogâmico, o rapto e a compra de mulheres, sintomas bastante difundidos,
mas nada mais que sintomas de uma transformação muito mais profunda que se
havia efetuado”.
O
casamento passou a ser uma forma de manter para si uma esposa, já que eram
raras, dando origem à família monogâmica, caracterizada pelo casamento e pela
procriação.
Conforme
o mesmo autor, somente ao homem era concedido o direito de romper o casamento
ou então repudiar sua mulher, em caso de traição ou esterilidade. A lei da
época, o Código de Napoleão, permitia que o homem fosse infiel desde que não
levasse a sua concubina para o lar conjugal.
No
mesmo sentido é o entendimento de Fustel de Coulanges:
“Tendo
sido o casamento contratado apenas para perpetuar a família, parece justo que
pudesse anular-se no caso de esterilidade da mulher. O divórcio, para este
caso, foi sempre, entre os antigos, um direito; é mesmo possível tenha sido até
obrigação. Na Índia, a religião prescrevia que “a mulher estéril fosse
substituída ao fim de oito anos”. Nenhum texto formal nos prova ter sido este
mesmo dever obrigatório, igualmente na Grécia e em Roma. Todavia, Heródoto
cita-nos dois reis de Espanha que foram obrigados a repudiar as suas mulheres
porque estas se mostravam estéreis.”
A
mulher além de ser propriedade do marido era obrigada a dar-lhe filhos, podendo
ser anulado o casamento nos casos de esterilidade. Por outro lado, não se
cogitava a hipótese do homem ser infértil.
Com
o passar do tempo a família deixou de conviver em grandes grupos para aos
poucos se individualizar, fortalecendo seus laços. Nessa trajetória muitos
foram os motivos que uniram a família. Na Antiguidade houve épocas, como o
estado selvagem, onde era a busca pela sobrevivência que unia a família. No
entanto, com sua evolução o que realmente passou a uni-la foi a religião. De
acordo com Fustel de Coulanges, se
nos reportarmos aos nossos antepassados, encontraremos em cada lar um altar, no
qual se cultuavam oferendas e cultos aos mortos e aos deuses. A família
reunia-se ao redor do altar a cada manhã para iniciar o dia com orações, e à
noite para ofertar preces de agradecimentos. Sob esta argumentação, pode-se
dizer que foi a religião que transformou a família em um corpo.
Outra
característica da Antiguidade, merecedora de destaque, é a ausência de laços
afetivos entre os membros da família. Nesse sentido, Philippe Airés destaca:
“Essa
família antiga tinha por missão - sentida por todos - a conservação dos bens, a
prática comum de um ofício, a ajuda mútua quotidiana num mundo em que um homem,
e mais ainda uma mulher isolados não podiam sobreviver, e ainda nos casos de
crise, a proteção da honra e das vidas. Ela não tinha função afetiva.O sentimento
entre os cônjuges, entre os pais e FILHOS, não era necessário à existência nem
ao equilíbrio da família: se ele existisse, tanto melhor.”
Era
a busca pela procriação e a necessidade de conservar os bens que induziam as
pessoas a constituir família. Quanto aos filhos, quando crianças, não viviam a
infância, pois logo que adquirissem porte físico para trabalhar, misturavam-se
aos adultos e partilhavam dos afazeres domésticos. Ainda segundo Philippe Aires, os filhos desde muito
cedo viviam praticamente independentes e tudo que aprendiam era observando os
adultos.
Fustel
de Coulanges menciona que o pai era
sinônimo de autoridade, homem forte protegendo os seus, “o pai é, além disso, o
sacerdote, o herdeiro do lar, o continuador dos avós, o tronco dos descendentes,
o depositário dos ritos misteriosos do culto e das fórmulas secretas da oração.
Toda a religião reside no pai”.
O
mesmo autor, lembra que na Antiguidade os filhos eram diferenciados. Prova
disso é o fato de que a filha quando casava deixava de fazer parte da família
de origem. Um pai podia amar sua filha, mas seus bens só podiam ser delegados
aos filhos homens.
Contudo, no decorrer dos séculos, a família
passou por uma transformação marcante na sua constituição. Por isso, faz-se
necessário analisar alguns períodos da História para compreender quão profunda
foi a mudança na estrutura familiar.
No
Direito Romano, a família era uma entidade que se organizava em torno da figura
masculina, muito diferente da contemporaneidade. Em Roma, reinava o
autoritarismo e a falta de direitos aos componentes da família, principalmente
no que diz respeito aos filhos e à mulher. Existia uma concentração de poder e
quem o detinha era a figura do pater.
Orlando Gomes
define a família romana, como sendo um “conjunto de pessoas sujeitas ao poder
do paterfamílias, ora grupo de parentes unidos pelo vínculo de cognição, ora o
patrimônio, ora a herança”.
Fustel
de Coulangesfaz menção ao fato de
que ao estudar a família romana, fica evidente que o afeto nunca foi uma de
suas características, enquanto que a autoridade do homem sobre a mulher e os
filhos foi seu principal fundamento.
A
família era uma unidade econômica, religiosa, política e jurisdicional ao mesmo
tempo. Quanto aos bens, inicialmente, havia um patrimônio só que pertencia à
família, embora administrado pelo pater. Numa fase mais evoluída do Direito
Romano, surgiram patrimônios individuais, como os pecúlios, administrados por
pessoas que estavam sob a autoridade do pater.
A
mulher, não tinha direito a possuir bens, não possuía capacidade jurídica, a
ela apenas cabia os afazeres domésticos, dependendo inteiramente do marido.
Conforme
salienta Engels, o homem possuía
muito mais liberdade do que o restante da família, seja ela civil ou moral.
Assim, atitudes que para a mulher eram encaradas como crimes e penalizadas
severamente, para o homem era algo considerado honroso, ou, quando muito, uma
leve mancha moral que carregava com satisfação, como era o caso do adultério.
Ademais,
em virtude do absolutismo do homem, a paternidade não podia ser questionada, a
não ser nos casos em que fosse comprovado não ter havido a coabitação ao tempo
da concepção. Desta forma, “a família romana, longe de ser uma organização
democrática alicerçada no princípio ético da afeição, tal qual a moderna,
apresenta antes as características de uma entidade política, fundada no
princípio da autoridade”
Para
os romanos, era obrigatório ter FILHOS para se perpetuar os cultos religiosos,
mas não bastava apenas ter filhos, era necessário que esses fossem frutos do
casamento. Fustel de Coulanges
complementa que os filhos que não fossem gerados pela esposa não podiam fazer
parte do culto e oferecer refeições fúnebres. Todavia, a falta de filhos
declinavam consequências cruéis aos considerados estéreis, de regra, atingindo
somente às mulheres por estarem estas ligadas à gestação e não haver na época
formas de provar a esterilidade masculina, aplicando como sanção à anulação do
casamento e à exclusão da sociedade.
Em vista disso, surgiu
o instituto da adoção, favorecendo os casais que realmente não pudessem ter
filhos, vez que, não se tratava de uma opção, em ter filhos e sim uma exigência.Fustel
de Coulanges menciona que com o
passar dos anos a mulher passou a desempenhar papel importante na família
romana:
“A
mulher tem direitos porque tem seu lugar no lar, sendo a encarregada de olhar
para que não se extinga o fogo sagrado. É a mulher, sobretudo, que deve estar
atenta a que este fogo se conserve puro, invoca-o e oferece-lhe sacrifícios.
Tem pois também o seu sacerdócio. Onde a mulher não estiver, o culto doméstico
acha-se incompleto e insuficiente. Grande desgraça para os gregos é ter o “lar
sem esposa”. Entre os romanos a presença da mulher é de tal modo indispensável
ao sacrifício que o sacerdote, ficando viúvo, perde o seu sacerdócio.”
A
mulher aos poucos foi conquistando seu espaço no lar e na sociedade. Aos
poucos, passou a ser responsável pela manutenção do culto, iniciando assim, uma
nova fase, e mesmo sem autonomia, começou a cumular funções, através de seu
sacerdócio doméstico.
O Direto Romano marcou de forma expressiva o
Direto de Família. Os conceitos de família e filiação eram alicerçados no
casamento e no autoritarismo, imposto pela figura do pater, dando origem ao
termo pátrio poder, hoje denominado poder familiar. Esses conceitos incorporaram-se
ao antigo Código Civil brasileiro, sendo que ainda hoje se percebe a sua
influência e seus resquícios na legislação vigente.