A FORMAÇÃO DE VALORES NO ENSINO PRIMÁRIO

RESUMO
O presente artigo tem como finalidade fazer um esboço inicial sobre a formação de valores no ensino primário, apegando-se na influência que os pais, professores e profissionais exercem sobre as crianças e adolescentes desde os primeiros anos de escolaridade. Pretende-se também identificar os procedimentos utilizados nas escolas para se ensinar valores aos alunos do ensino primário. Observando a influência do ambiente escolar na transmissão e criação de valores nos alunos.
Detectando as estratégias mais usadas pelos professores. Identificando o que os pais esperam da escola em relação à transmissão de valores a seus filhos e analisando o nível de satisfação dos alunos. com sua escola e os valores que ela defende. A transferência de papeis dos pais para os professores, quando se refere à educação das crianças, é uma realidade facilmente encontrada na sociedade de hoje. Onde os pais fogem da sua responsabilidade de ensinar os princípios básicos da educação a seus filhos e deixam esse papel para os professores nas escolas.
A escola por sua vez preocupa-se com o desenvolvimento académico do aluno e muitas vezes se esquece de se trabalhar os valores. Em contrapartida, é sabido que a Educação não deve estar apenas a serviço do sucesso académico, mas precisa desenvolver estratégias que alcancem os valores perdidos no tempo.
PALAVRAS-CHAVE: Valores morais – Ensino primário – Ensino de valores morais.





INTRODUÇÃO
Pensar em Educação não é apenas deter-se em conteúdos curriculares. Na realidade, a necessidade do homem moderno não é limitada a estes conteúdos contidos nos currículos escolares que somente podem oportunizar o sucesso ou fracasso académico. A Educação com vias de transformação do ser humano e da sociedade precisa estar intimamente vinculada aos valores das civilizações antigas e, evidentemente, às que perduraram até os dias actuais. Valores estes que ajudam a moldar o carácter de nossas crianças e torna a nossa sociedade mais humana.
Neste trabalho de pesquisa a pergunta que procuramos responder é a de que estratégias ou procedimentos são utilizados pelas escolas para ensinar valores aos alunos do ensino primário. Esse é o problema que norteia todo esse estudo e para tanto temos como objectivo identificar tais procedimentos observando a influência do ambiente escolar na transmissão e criação de valores nos alunos, detectando as estratégias mais usadas pelos professores em suas práticas educativas para estimular nos alunos a reprodução de valores, identificando o que os pais esperam da escola em relação à transmissão de valores a seus filhos e analisando o nível de satisfação dos alunos com sua escola e os valores que ela defende.





REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

A FORMAÇÃO DE VALORES NO ENSINO PRIMÁRIO
Antecedente histórico
Os valores humanos existem desde os primórdios da humanidade e são metas de todas as religiões, códigos de ética e filosofias. Considerar a expressão “valores” na modernidade do século XXI é bastante sugestivo. O termo valor pertence essencialmente ao vocabulário da economia; entretanto, a proposta deste trabalho é reflectir na definição mais aceita pela Educação da sociedade moderna.
Segundo Jean Piaget (1896-1980), “os valores são investimentos afectivos”. Isso significa que, apesar de se apoiarem em conceitos, estão relacionados a emoções, tanto positivas quanto negativas. Logo, educar para os valores é ajudar aos filhos ou alunos a descobrirem ideias e valores em que realmente se acredita. Os valores constituem o conjunto de qualidades que salientam nossas diferenças como seres humanos independentemente de credo, raça, condição social ou religião, e como já nos foi dito anteriormente, estando presentes em todas as filosofias ou crenças religiosas.
Os valores dignificam e ampliam a nossa capacidade de percepção. É por elas que obtemos as qualidades que os homens consideram importantes, como a verdade, rectidão, paz, amor e não violência, que unificam e libertam as pessoas do egocentrismo, engrandecendo a condição humana e dissolvendo preconceitos e diferenças. É por não se observar a importância dos valores nos comportamentos sociais que a sociedade tem passado por um período de desordem, diante da corrupção, dos jogos de poder, da violência, do desprezo pelo ser humano e pelo meio ambiente.
Ao não cultivá-los, oportunizaram a formação de adultos sem referenciais de cidadania e de respeito ao próximo. Concede-se, então, à Polícia, ao Ministério Público, ao Poder Judiciário e a outros órgãos estatais a função de responsabilizarem-se pelo destino das pessoas em conflito com a lei, a fim de que sejam afastadas do convívio social e (re)educadas. Diante desta evidência, torna-se ainda mais necessário o estudo de valores nas escolas desde a Educação Infantil, para que as crianças ainda que não tenham estes conceitos em casa, tenham a possibilidade de ser moldadas e preparadas para uma educação transformadora. Sem transmitir os valores humanos universais, não há como formar cidadãos éticos e preparados para viver em sociedade.
O ADULTO E A FORMAÇÃO DOS VALORES DA CRIANÇA
A busca pela sobrevivência na sociedade moderna fez com que a mulher, na qualidade de mãe, se unisse ao esforço mantenedor do homem e pai ― chefe da família ― para prover-lhe o meio de subsistência. Assim, os filhos ficaram sujeitos aos cuidados de parentes próximos ou estranhos, o que acarretou na transferência de responsabilidade da transmissão de valores na educação dos menores.
Esse novo modelo de organização familiar — pai e mãe ausentes do ambiente doméstico durante grande período — trouxe a necessidade de se ter uma profissional qualificada para ajudar na criação dos filhos. A questão é que uma vez que os pais são substituídos pela figura de uma terceira pessoa para cuidar da educação dos filhos, estes receberão intensa influência daquele que se fizer presente na maior parte do tempo, pois o adulto não somente olha e cria a criança simplesmente, ao estar com elas mesmas sem querer fazê-lo ensina-lhes seus valores e crenças.
Sendo que em cada família há uma grande variedade de valores que são transmitidos de geração a geração como uma experiência vivida. Estes valores são partilhados num ambiente de afecto e de identidade, que sobrevive com o passar do tempo, desenvolvendo um sentido de poder e orgulho que reforça o carácter e inspira o comportamento.
Se a criança ou adolescente for criada por alguém que não faz parte da família ela receberá influencia dos valores e crenças desta pessoa e muitas vezes pode não ser o que os pais gostariam que seus filhos aprendessem.  Quando os pais decidem buscar o auxílio de um parente ou de um profissional para a criação dos filhos, não cogitam a possibilidade de entregar-lhes a responsabilidade de também educar os pequenos e transmitir-lhes valores diferentes dos que defendem. Para os pais, o acto de criar é diferente do acto de educar, ou seja, ambas as acções não estão relacionadas.
Ellen G. White (1993) acredita que a criança, principalmente em seus primeiros anos de vida, tem uma mente mais impressionável, quer seja com coisas boas ou más e é durante esse período que devemos estimulá-las ao processo da direcção correcta e do conhecimento.
É durante os primeiros anos da vida da criança que sua mente é mais susceptível a impressões, sejam boas ou más. Durante esses anos, faz-se decidido progresso, quer na direcção certa, quer na errada. De um lado, muita informação inútil pode ser adquirida; de outro, conhecimento muito sólido e valioso. A força do intelecto, o saber substancial são riquezas que o ouro de Ofir não pode comprar. Seu preço está acima do ouro ou da prata (WHITE, 1996a, p. 132).
Exactamente quando mais necessitam da companhia e amor paternos as crianças são submetidas aos cuidados de estranhos que indirectamente imprimem-lhes as marcas do próprio carácter. A necessidade das crianças não fica limitada à companhia e amor dos pais, se considerarmos o que Ellen White diz de que até os sete anos de idade elas têm o carácter formado através do aprendizado e influências recebidas. É preciso aqui destacar o papel relevante dos pais na educação da criança até os sete anos de idade.
A FORMAÇÃO DE VALORES NA ESCOLA
Embora exista bom grau de concordância a respeito do ensino de valores à criança e ao adolescente e suas consequências na vida adulta, observa-se que tal fato ocorre superficialmente na prática, e não com o necessário vigor a tal formação. Ou seja, vários dos que concordam sobre a importância do ensino de valores e da moral no desenvolvimento da pessoa parecem não empreender essa tarefa com a dedicação que lhe é devida. Estimular a criança e o adolescente a exercitar cotidianamente certos valores é acção educacional necessária ao estabelecimento das virtudes que se almeja para ela.
Percebe-se o empenho que deve ter o responsável por essa educação, empregando energia e tempo na convivência com a criança. Em síntese, a escola, como instituição que exerce decisivo papel na formação do aluno, deve desenvolver suas actividades não só cognitivas como também voltadas para a transmissão de valores, como elemento indispensável para a formação da cidadania.
Sanches (1997, p. 170-189) apresenta os seguintes modelos de educação em valores:
a) A função da educação formal não é de transmitir valores, mas de possibilitar a reflexão sobre eles: trata-se de um processo de ajuda ao estudante para ter uma visão crítica de sua vida, meta, sentimentos, interesses e experiências, com o objectivo de descobrir quais são seus valores.
b) Formação do carácter moral: Remonta à tradição aristotélica e sintetiza a ideia de que, para se conseguir o desenvolvimento moral de uma pessoa, não basta que ele seja capaz de conhecer, intelectualmente, o que é o bem, o justo, porque a mera actividade intelectual não é suficiente para apreender essa ideia. Há necessidade de que a pessoa seja capaz de agir, conforme essa ideia de bem e de justiça. Deve-se recorrer à prática e à formação de hábitos virtuosos. Têm relevância à ideia do bem, da felicidade humana, a formação de hábitos e as virtudes. O papel do educador apresenta-se relevante, diante dos valores que pretende transmitir.
c) Educação em valores concebida como um projecto de vida: consiste em um exercício constante de autonomia, de reflexão e deliberação individual e de projecção pessoal. O projecto ideal de vida conduz a dimensão valorativo-moral da pessoa a uma finalidade última de aperfeiçoamento de seu carácter individual, mas em consonância também com o social. Consegue-se, também, esta formação mediante a acção, o exercício, mas difere do modelo anterior, por se tratar de um exercício guiado por um projecto pessoal de vida. Trata-se, na verdade, da última etapa do modelo anterior, com forte presença da filosofia aristotélica. Nesse modelo, os valores orientam a conduta da pessoa, levando-a a agir em consonância, formando sua personalidade.
d) Educação em valores concebida como construção da personalidade moral: orientar e estimular a pessoa na construção significativa de sua própria dimensão valorativo-moral, tanto em seus hábitos individuais e privados como nos públicos e colectivos. A educação em valores, concebida como construção da personalidade moral, tem por objectivo principal colaborar no processo de construção de princípios universais aceitáveis que permitam, não só regular a sua própria conduta, mas construir, também, uma vida autónoma, considerada mais justa, melhor e mais apropriada. Este objectivo se perfaz mediante o diálogo, a reflexão, a empatia e a auto-regulação (autonomia e razão dialógica), tendo como referência a racionalidade, que implica defender uma postura crítica. Três são os eixos sobre os quais este modelo se desenvolve: autonomia, diálogo e vontade.
Araújo e Aquino (2001, p. 14), ao discorrerem sobre a forma de transmissão dos valores pelos professores, anotam dois modelos que, tradicionalmente, são concebidos, para, após, chegarem a uma conclusão do método mais eficiente. No primeiro, relatam que “a maioria dos modelos educacionais parte do pressuposto epistemológico de que o conhecimento é exógeno em relação ao sujeito que o internalizaria a partir de suas experiências sensórias com o mundo moderno – ex. professor, livros, palestras e outros eventos informativos” e que na educação moral ou em valores não seria diferente, no sentido de que a “formação da pessoa virtuosa se daria por meio de palestras, ou outros eventos informativos, livros de conteúdo moral ou mesmo por meio das novas tecnologias (vídeo, Internet)”.
No segundo modelo, a “transmissão dos valores ocorre por meio da convivência com pessoas que agem de maneira coerente com determinados valores morais, e que o exemplo é a melhor forma de se educar moralmente”. Sem desconhecer os méritos de tais sistemas, os autores apontam que “os valores são construídos na interacção entre um sujeito imbuído de razão e emoções e um mundo constituído de pessoas, objectos e relações multiformes, díspares e conflituantes.
Os valores são construídos a partir do diálogo e da qualidade de trocas que são estabelecidas com as pessoas, grupos e instituições em que vive”. Tratando, ainda, da questão da forma de educar em valores, Marques (2001) centra sua reflexão nos ensinamentos aristotélicos, no sentido de se alcançar à educação em valores por meio do desenvolvimento das virtudes. Virtude, na concepção aristotélica, deve compreender-se como uma disposição que se encontra centrada entre o excesso e a falta, ou seja, um meio termo entre dois extremos, como se infere, igualmente, da proposição de Pitágoras: “virtus est in medius” (a virtude está no meio). Decorre de uma deliberação voluntária do cidadão de saber, o que faz com justo equilíbrio, visando à felicidade.
A propósito, afirma Marques (2001, p. 35) “A pessoa virtuosa é aquela que sabe o que faz, que é conhecedora de seus deveres, que escolhe deliberadamente seguir a conduta recta e é capaz de repetidamente executar a rectidão com espírito e vontade inabalável”. Ainda na visão aristotélica, as virtudes dividem-se em (a) morais e (b) intelectuais (sabedoria e conhecimento). As morais, como coragem, temperança, mansidão, liberalidade, magnificência, magnanimidade, afabilidade, reserva e justiça, podem ser ensinadas, mas “mais do que produto de ensino, são produto do hábito” (MARQUES, 2001, p. 34).
Hábito de praticar acção recta torna a pessoa virtuosa, ou seja, a educação ética, em valores e virtudes, não se faz apenas pela via intelectual (por via de uma disciplina específica), mas pelo hábito do educando em praticar acções virtuosas. Platão chama de treinamento a forma de a educação transmitir valores éticos, que é da sua própria essência:
Chamo educação àquele treinamento que é dado, através de hábitos adequados, aos primeiros institutos de virtude existentes nas crianças a disciplina correcta de prazer e sofrimento através dos quais um homem, desde o início até o fim de sua vida, abominará o que deve ser abominado e terá amor pelo que se deve amar (BEUST, 2000:45).
Arrematando esta questão, Marques (2001) aponta como educar em valores, transmitindo virtudes na concepção aristotélica. Ele comenta sobre a importância que Aristóteres dá à educação ética e como isso o conduziu à defesa de uma educação pública capaz de complementar e de substituir, quando necessário, as influencias da família, de modo que as novas gerações pudessem beneficiar-se de uma boa formação de carácter. E diz ainda que:
... a escola e a educação em geral, embora não sendo uma panaceia, podem contribuir para ajudar os jovens a encontrarem os caminhos para a vida digna e para a felicidade (MARQUES 2001, p.27).
Para transmitir as virtudes, não há necessidade de uma disciplina autónoma independente, mas um comportamento profissional e social do professor, comprometido com os valores que serão transmitidos. O hábito de praticar estas acções levará à construção de uma verdadeira cidadania.
Buxarrais (1998, p. 84-86), ao tratar da educação moral, apresenta três modelos de educação baseados em: Valores absolutos; “de grande tradição pedagógica baseia-se numa visão de mundo que contém um conjunto de valores e normas de conduta indiscutíveis e imodificáveis. Os valores e as normas impõem-se com a ajuda de algum poder autoritário e têm como objectivo regular todos os aspectos da vida pessoal e social”.
Valores relativos; parte-se do princípio de que os valores representam uma questão casual e que nenhuma opção de valores é preferível em si mesma. Não há como afirmar valores absolutos, pois dependem da subjectividade. As opções morais são decisões de carácter exclusivamente individual. No campo da pedagogia, este modelo limita o papel da educação moral e do próprio professor.
QUAIS OS VALORES QUE DEVEM SER TRABALHADOS?
A educação em valores está presente em todas as disciplinas do currículo escolar. Para educar em valores, é necessário que o professor organize seu plano de ensino em actividades lúdicas, reflexivas e conceituais sobre temas transversais. A questão que fica no ar é a de que valores devem ser trabalhados.
Para Tillman (2001), os valores que devem ser ensinados pela escola aos seus alunos são os seguintes: paz, respeito, amor, tolerância, felicidade, responsabilidade, cooperação, humildade, honestidade, simplicidade, liberdade e união. No entanto, Antunes (2010) em um dos seus livros mais novos nos dá outra lista de valores. Nesta lista temos a honestidade, a coragem, a amizade, o respeito, a liberdade, a criatividade, a auto-estima, a bondade, a confiança, prestatividade, força de vontade, a lealdade, o optimismo, a responsabilidade, a paciência e a sinceridade. Podemos trazer ainda a visão de Libânio quanto a isso. Ele diz:
É preciso que a escola contribua para uma nova postura ético-valorativa de recolocar valores humanos fundamentais como a justiça, a solidariedade, a honestidade, o reconhecimento da diversidade e da diferença-o respeito à vida e aos direitos humanos básicos, como suportes de convicções democráticas (LIBÂNEO, 1998, p. 67).
Embora esses autores possam divergir em que valores são mais importantes para serem trabalhados na escola acredito que convergem em um pensamento, o de que é necessário se saber o que queremos ensinar. Antunes (2010) diz que um barco que navega sem destino nunca chegará ao porto que deseja. Esta ilustração nos mostra que nunca educaremos para “alguma coisa” se não sabemos que “coisa” é essa. Trabalhar valores em sala de aula é algo essencial, mas de igual modo é importante saber que valores serão trabalhados.
Portanto em primeiro lugar a escola deverá estabelecer quais os valores que ela julga mais importante para serem ensinados e cultivados diariamente com seus alunos, para depois se estabelecer estratégias e métodos de se trabalhar tais valores.
Fontana (1991) descreve as seis fases de desenvolvimento moral de Kohlberg. Fases essas que são baseadas nas fases de desenvolvimento de Piaget e que podem dar um norte aos educadores no sentido de saberem que valores se trabalhar em sala de aula em cada fase do desenvolvimento da criança. Essas fases são as seguintes: (crianças de 2 a 7 anos) modalidade pré-convencional – 1- Obediência; 2- egoísmo ingénuo; (crianças de 2 a 11 anos) modalidade convencional – 3- Orientação bom menino/ boa menina; 4- Orientação de manutenção da autoridade; (crianças a partir de 12 anos) modalidade pós convencional – 5- Legalismo contratual; e 6- Princípios gerais de consciência.
OS PROFESSORES E A CONSTRUÇÃO DE VALORES
No cotidiano da escola, os professores ocupam papel essencial no processo educativo. Boa parte da responsabilidade no êxito ou fracasso desse processo reside no modo como o realiza o educador. No campo da formação moral dos alunos, acontece o mesmo. A postura desse profissional quando discute diferentes temas, transmite conhecimentos e, principalmente, torna-se “exemplo de vivência” do conjunto de valores que apregoa, será, sem dúvida, uma das condições essenciais na obtenção do êxito educativo. Os professores são “interlocutores da educação moral”. Entretanto, é importante não deixar de considerar, que “os professores, além de serem professores, também são pessoas envolvidas e afectadas nas suas convicções, sensações, aspirações como qualquer outra pessoa que conviva com os conflitos e ambivalências éticas e morais da sociedade contemporânea” (GOERGEN, 2007, p.748).
É interessante destacarmos que o professor poderá ou não, ser revestido de uma figura de autoridade a ser “imitado” servir de exemplo ou de modelo de conduta e/ou atitudes, auxiliar no processo de construção dos valores nos alunos, a partir dos sentimentos que despertar em seus alunos. Segundo La Taille (2006, p.108-132), o “querer agir moral” está alicerçado em seis sentimentos. Os dois primeiros aparecem indissociáveis para o sentimento de obrigatoriedade: o medo e o amor.
Os demais: confiança, simpatia, indignação e a culpa, com excepção da culpa, não estão directamente relacionados aos sentimentos de obrigatoriedade, mas o alimentam e o fortalecem. Particularmente, no que se refere à confiança, é importante tecer mais alguns comentários. Para o autor (2006, p.111), “[...] para depositarmos confiança em alguém, além de fazermos hipóteses a respeito da qualidade de suas acções também fazemos hipóteses sobre suas qualidades enquanto pessoa moral. Em suma, a confiança implica a dimensão moral”.
Muitos defensores da integração das áreas disciplinares argumentaram que ela não representa simplesmente uma mudança na pedagogia e, sim, que implica uma mudança fundamental nas crenças sobre o ensino e a aprendizagem, bem como uma visão de realidade em que as coisas são interconectadas e interdependentes. Aqueles que a advogam declararam que:
[...] as experiências do mundo real não são fragmentadas em áreas e, por isso, a integração aumenta a relevância e a motivação para aprender. De um ponto de vista prático, o conhecimento vem aumentando rapidamente, e a integração pode evitar a duplicação, identificando conteúdos e habilidades transversais. (YUS RAMOS, 2005, p.11)
Ainda, segundo esse autor, os obstáculos para a integração são inúmeros, mas o maior deles é a própria especialização docente. Drake (1998 apud YUS RAMOS, 2005, p. 11) assinala que:
[...] os programas das séries iniciais do ensino fundamental sempre foram mais fáceis de integrar, visto que todas as matérias são dadas por um mesmo professor, ainda que tal realidade esteja mudando nos últimos tempos com a introdução de especialistas diversos. Entretanto, as coisas ficam mais difíceis a partir da 5ª série, visto que a compartimentalização do conhecimento escolar em espaços e tempos é muito maior [...]. Os professores de 4ª a 8ª séries, que foram educados em um mundo onde as disciplinas constituem o princípio organizativo, são formados como especialistas e costumam argumentar que esse enfoque levaria à perda de sua identidade. Contudo, os que se integraram com êxito tendem a se considerar como “professores de estudantes” mais do que como professores de domínios académicos específicos.
Nesse contexto, não é possível deixar de considerar a importância da actuação dos cursos de formação de professores, seja no nível do magistério ou do ensino superior, que possuem o compromisso de preparar o profissional que trabalha na escola. Que conhecimentos são necessários para constituir esse profissional? A formação do educador precisa considerar o contexto em que se realizará sua actuação profissional. Considerando que irá trabalhar com alunos, que estão em processo de formação, independente da faixa de idade em que se encontram, é necessário despertar nesse profissional um senso crítico e moral.
Segundo Goergen (2007) é preciso que os docentes recebam uma formação correspondente à oferecida aos alunos, que tenham passado por um processo de conscientização de sua própria moralidade, de seus ideais e sentidos de homem, de mundo e de vida, dos fundamentos que orientam seu julgar e agir, para só então, e a partir daí, pensarem no papel que lhes cabe como agentes da formação moral. O estudo dos valores na formação do educador visa tornar os (futuros) professores conscientes de sua responsabilidade na promoção desses conteúdos em seus alunos. O professor necessita ser formado para respeitar as características de seus alunos vivendo seus próprios valores, respeitando os valores de seus alunos e propondo novas opções de valores (SCHMITZ et al, 2003). Esse profissional necessita fazer continuamente um exame sério de seus valores e atitudes, para melhorar sua actuação.
O professor é um portador de valores, e é impossível que não seja vivenciador de valores bem definidos, para sentir-se seguro perante o desafio da promoção dos valores de seus alunos (MORAIS, 1991). Ressaltamos que a atitude/postura do educador não é só uma condição do êxito educativo, mas é também um dos aspectos mais importantes em qualquer proposta de educação moral.
Nesse sentido, ele poderá assumir a posição do profissional heterónomo, centralizar o processo educativo em si e não permitir as trocas entre alunos, suas experiências e os conhecimentos/reflexões obtidas a partir delas, ou um profissional que, por meio de sua postura e da base moral que possui, possibilita a análise e discussão de problemas sociomorais, processos de reflexão sobre eles, trocas significativas entre os alunos. Um dos elementos mais significativos da educação moral a ser desenvolvido pelos alunos é o diálogo.
Os alunos desenvolvem sua capacidade de expressão e de compreensão à medida que sentem a necessidade progressiva de escutar os demais, de entender o que outros dizem, de ceder ante um argumento melhor ou de criticar aquilo que não compartilham (PUIG, 1998, p.118).
Diante deste quadro, cabe a reflexão: O que é ser professor hoje? Estamos em consenso com a posição de Gadotti (2000) quando enfatiza que ser professor hoje é viver intensamente o seu tempo, conviver; é ter consciência e sensibilidade. Não se pode imaginar um futuro para a humanidade sem educadores, assim como não se pode pensar num futuro sem poetas e filósofos. Os educadores, numa visão emancipadora, não só transformam a informação em conhecimento e em consciência crítica, mas também formam pessoas.





CONCLUSÃO
A disseminação que a educação emerge em valores que se desenvolve na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas escolas, nas manifestações culturais, nos movimentos e organizações socais, é uma questão fundamental da sociedade actual, e considerado importante tanto pelos pais como pelos professores e pelo governo expressado na lei de directrizes e bases da educação.
Se a escola deixa de cumprir o seu papel de educador em valores, o sistema de referenciação ético de seus alunos estará limitado à convivência humana que pode ser rica em se tratando de vivências pessoas, mas pode estar também carregada de desvios de postura, atitude comportamento ou conduta, e mais, quando os valores não são bem formal ou sistematicamente ensinados, podem ser encarados pelos educandos como simples conceitos ideais ou abstractos, principalmente para aqueles que não os vivenciam no cotidiano.



BIBLIOGRAFIA
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