Vida e obra de Alda Lara
INTRODUÇÃO
Neste trabalho poderemos
falar detalhadamente da poetisa Alda Lara que deu muito contributo nos textos
poéticos de Angola. É muito importante falar dos grandes autores que deram
muito do seu saber para a libertação de Angola na era colonial e deram muitos
incentivos nos nossos antepassados para que despertassem de como o colono
estava a interagir com os produtos de Angola. Por sua vez Alda Lara contribui
de uma forma literal com poesias para despertar a visão dos irmãos angolanos
que naquele tempo trabalhavam com a mão de obra muito barata. E neste trabalho
tratamos de muitos assuntos que tocam nos aspecto ligados a literatura.
A
ESCRITA FEMININA NO PANORAMA LITERÁRIO AFRICANO EM LÍNGUA PORTUGUESA
A produção literária de autoria feminina ainda é muito
incipiente nos países africanos de língua portuguesa. Isto constitui um
paradoxo, já que durante as lutas libertárias as mulheres desempenharam
importante papel político nas organizações que lutavam contra o colonialismo. No
cenário literário angolano figura como precursora na poesia Alda Lara, autora
de Poemas (1966), Poesia (1979) e de um livro de contos
intitulado Tempo de Chuva (1973). A temática de sua obra é a opressão,
que assola homens e mulheres em geral, e, apesar de abordar questões universais
como a fraternidade, a solidariedade e a paz, seu enfoque poético está
direccionado para as formas de acção feminina na busca do espaço sonhado, em
especial nos anos de 1950-1960, quando se intensificava o projecto libertário
angolano.
Trilhando entre o «eu», o sonho e o povo,
características que a aproximam de Alda Lara, Noémia de Sousa direcciona seus
versos para apreender o próprio «eu» como expressão da subjectividade feminina
repleta de imagens que corporificam os desejos «espirituais, admirações, dores
e sensações». Numa leitura intertextual entre «Negra», de Noémia de Sousa, e
«Prelúdio», de Alda Lara, verifica-se a força da voz poética feminina, que no
dizer de Inocência Mata, em Literatura Angolana: silêncios e falas de
uma voz inquieta, se liga à ideia de regresso e comunhão com a Terra, com o
Povo e com a causa colectiva.
As marcas da oralidade e da História permeiam a poesia
de Alda Lara.
Entre os temas propostos pelas escritoras, está o
repensar da condição feminina, num cenário social marcado pela opressão, pela
submissão feminina e pelas guerras coloniais que silenciaram a confraternização
presente no ritual do contar estórias em volta das fogueiras. Mas há também
lugar para o amor revivificado na intersecção dos tempos, ponto de convergência
entre tradição e modernidade.
A poética e a prosa femininas nas comunidades
africanas de língua portuguesa colocam o leitor diante de cenas e sinais de
mulheres em espera e acção, em silêncio e canto, em cansaço e renovação,
metaforizadas por vozes marcadamente orais que aproximam os sentidos na
reescrita literária, reinventando imageticamente o papel da mulher nessas
comunidades.
A poetisa Alda Lara aparece na antologia [revista
Mensagem] com alguns de seus mais conhecidos poemas. As características mais
significativas de sua poesia são, sem dúvida, a expressão de um grande amor ao
seu semelhante e a acolhida ao sofrimento do outro. Estas características podem
privilegiar visões contrastantes sobre a beleza da natureza e o sofrimento do
angolano (conforme “Prelúdio”) ou declarar um amor intenso a Angola, valendo-se
da poesia para descrever as belezas “das acácias, dos dongos e dos cólios” que
marcavam um forte contraste com os cenários europeus. É interessante observar,
nos poemas de Alda Lara, uma preocupação visual que se concretiza na composição
de pequenos quadros que procuram captar as belezas de Angola, metonimizada
pelos “coqueiros de cabeleiras verdes”, e de sol ardente e pelas “acácias
rubras, /salpicando de sangue as avenidas, /longas e floridas” (p. 111).
Distante das descrições de cenários africanos presentes na chamada “literatura
exótica” produzida em vários momentos do período colonial ou nas famosas
“cartes de visite”, postais ilustrados com paisagens e tipos humanos dos
espaços colonizados, produzidos com a intenção de vender a diferença exótica
aos europeus, os cenários poéticos criados com detalhes da natureza africana
produzem outros significados na poesia de Alda Lara. A intenção mais evidente em
seus poemas é a de expressar um grande amor à terra angolana (“Noites africanas
langorosas/esbatidas em luares..../perdidas em mistérios…“), exaltar a
exuberância das cores das flores e os odores dos frutos, e, através desses
artifícios de motivação pictórica, denunciar a opressão sofrida pelos
angolanos, seus irmãos. Por isso, em alguns poemas, os recursos picturais
utilizados pela poetisa procuram ressaltar o horror disseminado por acções
humanas, pela opressão intensa sofrida pelo seu povo. Por isso é preciso
considerar que, na poesia de Alda Lara, a descrição do horror e de atrocidades
figura intenções que vão além de aspectos meramente descritivos. As cenas de
mutilação, tal como aparecem, por exemplo, no belo poema “Momento” almejam descrever sentimentos de
compaixão, repúdio, mas também dão à descrição um peso que ratifica a denúncia
e inscreve nos versos a abjecção.
O impacto da cena descrita, com recursos visuais
explorados com grande perícia pela poetisa, fica intensificado na referência à
dor das mães, das noivas e na alusão às crianças, que, por uma estratégia
discursiva de grande efeito, podem ser visualizadas porque assim o permitem os
significantes que compõem o primeiro verso da 3 estrofe: “e do ventre de
além-mundo”, distendendo o tempo da acção invocada pelo poema.
No poema “Regresso” (pp. 116-118), referentes da terra angolana são
empregados para ressaltar as cores vivas e os odores fortes que compõem
paisagens singulares. O eu-poético se regista com marcas de intensa subjectividade
e as paisagens lembradas são esmiuçadas para compor cenários em que as cores
das casuarinas, das acácias rubras e dos cheiros exalados pelo “húmus
vivificante” e pelo desenho do mar que contorna “uma cidade em convulsão”
possam construir uma visão em que o feminino se mostra com intensidade na
declaração do amor pela terra natal.
Conforme se destacou em outro trabalho, a visão e o olfacto
são os sentidos privilegiados para propiciar recortes em que a terra africana é
descrita em toda sua pujança, vista como um lugar paradisíaco, onde é possível
viver o “prazer sem lei” expandido em excesso (cf. FONSECA: 2004). A simbologia
da Mãe-Africa, reiterativa nos poemas de afirmação da identidade africana,
inscreve um outro olhar que procura descrever os cenários da terra aquecida por
um sol “esplendoroso e quente”. Também no poema “Presença [Africana]” (pp. 114-115), a relação entre o
feminino e a terra angolana, entre o corpo da mulher e o da terra africana,
ressalta aspectos que tornam Angola um micro-cosmo de um continente significado
por “coqueiros de cabeleiras verdes! e corpos arrojados sobre o azul”. Nesse
poema, a mulher, literariamente construída (“E apesar de tudo/ainda sou a
mesma!/Livre e esguia”), realça-se com os atributos da terra africana e,
através desse recurso poético, concretiza uma visão feminina do ideal a ser
conquistado. A terra do “dendém”, “das palmeiras”, das “acácias rubras” é
percebida através de atributos que se relacionam com a função materna (“mãe
forte da floresta e do deserto”) ou com um sujeito que se declara afetivamente
irmã (“ainda sou /a irmã-mulher”). Assim os poemas de Alda Lara, ao cantar o
amor pelos irmãos miseráveis ou construir flagrantes em que a beleza da terra
angolana é reiterada, expande o intimismo e faz da visão um mecanismo hábil à
apreensão de cenários em que o outro (a Mãe-negra, os oprimidos, os
companheiros de ideal) é a motivação maior de uma arte feita com a
escrita.
ESBOÇO
DE INTERPRETAÇÃO DA POESIA DE ALDA LARA
Alda Lara pertence a um núcleo de
alta burguesia comercial, que dispunha das disponibilidades necessárias para
dar aos filhos cursos superiores nas terras longes de Portugal. Elemento este
que, como é óbvio, nos ajuda a colocar o poeta e a entender melhor a
articulação do seu canto. Em tal caso a poesia surge como uma soma orgânica de
conteúdos humanos e a poesia sugere a elaboração de uma atitude coerente que
representa a totalidade de uma acção humana. Neste aspecto a poesia de Alda
Lara caracteriza não só o ambiente Benguelense que foi o da sua infância e de
parte substancial da sua adolescência, mas também o despaisamento, o exílio,
como será melhor dizer, do estudante angolano nas universidades
portuguesas.
Decerto que Alda Lara só por reflexo familiar sentiu a
totalidade dos problemas cívicos que atingiram o cume nos anos 40; não os podia
ainda investigar e sentir com exacto conhecimento de causa. E o facto de ter
abandonado Benguela muito cedo para fazer em Lisboa e em Coimbra o seu curso de
medicina, iria deixar-lhe na retina o canto rubro e incendiado (para alguns
poetas angolanos também incendiário) das acácias das ruas de S. Filipe de Benguela,
os cólios e os coqueiros e também a imagem dos quintalões benguelenses, que
eram ainda o compromisso entre uma cultura que procurava assentar as suas bases
numa efectiva mestiçagem e o despontar de atitudes mais rígidas entre as etnias
(que a rápida valorização dos «produtos coloniais», nos anos seguintes a 1945
firmou definitivamente) que hoje são moeda corrente. Não podemos esquecer que é
desse ambiente que lhe nasce o pendor patriarcalista que pode beber ainda no
trato familiar, embora muitas vezes se perturbe perante a mestiçagem que é
elemento comum, irreversível. Como já iremos ver, a atitude irracional da
poesia de Alda Lara, assenta em grande parte numa atitude utópica, que
desconhece os elementos imediatos do real.
A poesia de Alda Lara está incompleta. É, antes de
mais, uma poesia que vive no mundo da infância ou de uma primeira fase da
adolescência. Poesia duplamente exilada, por consequência. Toda a vida interior
do poeta se articula em relação a uma angolanidade que, embora não sendo conjugada
com todos os elementos do real, é no entanto uma força aglutinadora que não
pode ser descurada, mas nas palavras entrevemos, implícito ou explícito, o
sentimento do exílio e, algumas vezes, a suspeita dolorosa de que a sua
angolanidade não se apoderou dos elementos mais significativos. Ou, se não
quisermos ir tão longe, a poesia sente que não cuidou de se apoderar de todos
os elementos significativos. É este sentimento angustioso que leva Alda Lara a
escrever no poema «Presença [Africana]», em que se promete à sua terra,
ainda intacta, ainda idêntica a rapariguinha que saiu de Benguela, não para se
deixar destruir nas terras frias e opacas da Europa, mas sim para regressar
viva, senhora de uma sageza actuante. Eis que Alda Lara examina os seus mínimos
gestos para saber se, realmente, enquanto anda, bebe, dorme, trabalha, passeia,
não se transformou na Outra, que poderia trair, que por certo trairia, a
sua mesma angolanidade. Problema que, em tal caso, a obriga a verificar as
roldanas da sua intimidade, para acabar, por verificar que, apesar de tudo, é
ainda a mesma (mas quanta inoculta angústia aqui se insinua, no receio de que
alguém possa destruir a afirmação denunciando-lhe os desvios). Pois é esta
forma adversativa que nos importa reter já que através dela chegaremos ao cerne
de uma poesia desgarrada, por não lhe ter sido possível viver os problemas na
sua imediatidade, pois eram elementos apenas sentidos. Não esqueçamos que lhe
faltam pontos de referência, e que a sua linguagem trabalha num vácuo que o
poeta não pode evitar; deseja ir ao mais fundo dos problemas, mas não lhe estão
próximos, sente-os por refracção. E a ordem da sua poesia não é já um lento
caminhar através das essências de uma angolanidade racionalmente estruturada,
mas um assalto precipitado aos signos, engendrando um estilo que, embora dotado
de boas qualidades rítmicas, pretende chegar depressa. Esta busca apaixonada da
sua própria raiz, não aniquila a possibilidade de um estilo, mas corroe o imo
significativo da poesia transformando-a num elemento ambíguo. Coisa que Alda
Lara sente, e que nos leva a concluir que a sua poesia não chegou a
completar-se. Em vez do círculo fechado e total, temos o ângulo raso.
OS VALORES DO
CENTRO
Se, simultaneamente, atentarmos nos textos escritos a
partir do Centro e do Sul [de Angola], verificaremos ainda que em alguns deles
perpassa, ora uma tímida consciência regional, ora uma procura de diferenciação
face a Luanda.
Na apresentação da colecção Bailundo, no livro
de Alexandre Dáskalos, há um manifesto assinado por Ernesto Lara Filho e Inácio
Rebelo de Andrade, que se localizam no Huambo. A peça afirma claramente a
intenção de “dar a conhecer os valores do centro de Angola, ao mesmo tempo que
se pretende estender dois braços — um para o Norte e outro para o Sul — para
ligar num amplexo fraterno essas duas correntes literárias já com vida própria
[referem-se à colecção Autores Ultramarinos e à Imbondeiro].
Numa carta sintomática, enviada a Inácio Rebelo de
Andrade a partir de Lisboa e datada de 21 de Janeiro de 1962, Ernesto Lara
Filho garante, a propósito da sequência a dar à Colecção Bailundo: “Eu
creio que a Alda, depois do Aires e com os «apports» do Alexandre Dáskalos e
meu, apesar de pobres, temos muito ainda que dizer em Angola, devemos dizê-lo.
Acho melhor sacrificar o resto da colecção a essa necessidade premente que há
imediatamente, de dizer algo, sobre o Centro de Angola, literariamente
falando, claro. Aliás, autores ultramarinos acabam de publicar os seguintes
poetas: António Jacinto, Agostinho Neto, Alexandre Dáskalos, Manuel Lima, etc
etc, dando um carácter estritamente político à coisa. Bailundo é
literatura como nós combinámos e de «pés fincados na terra». Assim, eu creio
que ainda e acima de Imbondeiro e Autores Ultramarinos, vamos no
caminho mais certo que é o moderado, o do centro, o do centro de Angola, por
casualidade.”
Numa carta de
Alda Lara ao irmão (parcialmente copiada por este naquela a que
acabamos de aludir, e talvez escrita em 1961) a identificação regional da sua
poesia é igualmente assumida conectando-se com o distanciamento face à estrita
partidarização da Mensagem: “Gostaria que me dissesses o que devo fazer
para te enviar uma selecção dos meus poemas para a Colecção Bailundo.
Creio já ser tempo de os pôr cá fora, e na verdade gostaria mais de os ver
«integrados» na Colecção Bailundo do que na dos Autores Ultramarinos.
Nem sequer é por razões políticas. Nunca as tive e agora é que as não tenho
mesmo. A política e tudo quanto dela deriva dá-me vómitos, para te falar com
franqueza. E apenas porque situo a minha poesia mais próximo da tua ou da do
Aires de Almeida Santos do que da dos outros. Compreendido? Mais tarde, a
geração futura decidirá quais foram os verdadeiros «poetas». O resto é
nada.”
TEMAS
DE ESTUDO EM TORNO DA POÉTICA DE ALDA LARA:
- Auto-representação do
“eu”.
- A imagética feminina:
inconformismo vs destino de mulher.
- Uma educação para os
valores: solidariedade, fraternidade, generosidade, evangelismo…
- Representação de
África: os lugares de afecto, enfeitiçamento e amor pátrio.
- Um olhar sobre o outro
(o objecto de desejo amoroso).
COM
NOTÁVEIS QUALIDADES DE NARRADORA
Após a morte poetisa, a câmara
municipal de Sá da bandeira (actual Lubango) criou em sua homenagem o Prémio
Alda Lara de Poesia, tem as seguintes obras editadas.
Poemas obras completas de
Alda Lara (1966/1973); tempo de chuva (1973); Poesia (1979). Alda Lara figura
na maioria das antropologias de literatura africana em língua portuguesa.
Obra completa do Alda
Lara do 1º livro.
abandono, entardecer,
destino, lago, ronda, poemas que eu escrevi na areia;
Misere, Apelo poema da
mesa pintada, Testamento, Momento, Confissão, As belas meninas pardas, Carta
aberta, Romance, Círculo, Maturidade, Toada da menina Bela, Herança, A caminho,
presença, presságio, voz na encruzilhada, trilogia do autono, anúncio, Quadra
da minha solidão, Prelúdio, presença africana.
Alda Lara: Alda Pires
Barreto de Lara e Albuquerque nasceu em Benguela a 9 de Junho de 1930 e faleceu
em Cambambe a 30 de 01 de 1962. Formou-se em medicina na Universidade de
Coimbra, em Portugal com uma tese sobre psicatria infantil. Enquanto estudante
manteve ligação estreita com a casa dos estudantes do imperior, em Lisboa.
Convidada para se especializar em Paris , preferiu voltar para o seu país de
origem declamadora de notáveis recursos ,
deu várias receitas em Lisboa Coimbra, divulgando a poeta das diversas colónias
portuguesas. Deixou o completo um livro de conto e outras escritas dispersas,
além de colaboração diversas em vários jornais de Portugal, Angola e
Moçambique.
O escritor Orlando de Albuquerque que foi casado com Alda Lara escreveu a sua
poesia se caracteriza por uma intensa angolanidade implícita e, sobretudo por
um extremo amor e carinho quase ternura, pelos outros, acrescentando que era
possuidor de um estilo rico e influente.
Entardecer
I
A
hora medrosa do
entardecer desfolha
mariposas de sonhos nos jardins...
II
E vou de mãos dadas com ela,
Caminhando silenciosa e
leve,
p´ra não acordar os
lilases que dormem, encostando as suas
cabecinhas roxas sobre
almofadas
dos muros...
III
Vou em bicas silenciosa e breve...
03 de 1959
Coimbra
Destino
I
Nenhum seria mais longo
que o da asa roçando ao
de leve uma
Corola...
II
Nenhum
abraço mais quente que o
vento orno de verão
embalando
as folhas...
III
Nenhum adeus seria mais ardente
que o adeus olhas
levemente...
IV
Nada seria mais denso que a presença
frágil de um desejo
apenas...
E tudo o resto que foi?
Senão a presença frágil,
senão
a asa e o vento, senão
adeus silente
com que só amas e olhas
os que
olhas levemente?
1951
Lago
I
Todo o meu ser é um lago fundo e doce...
II
Por
onde passeiam barcos com meninas...
III
Namorados
que se beijam em noites sem destino...
IV
E
também tu! Oh belo solitário inesquecível...
V
Todo
o meu ser é um lago doce e fundo...
VI
Onde
a tristeza é uma ansiosa e indefinível aspiração...
Toada da menina Bela
- Menina Belas, queres a
lua?
- Não... basta me o que
só me deram.
- Menina Bela, queres a
lua?
- Não...
Mas a voz tornou ao fundo
dessa rua:
- Q queres então menina?
E a menina soluçou:
- A lua!
1950
Herança
Meu filho: que os teus
braços sejam longos como
a menina Esperança nos
longos dias...
e o teu corpo, que
antevejo, venha flexível e liso como a justiça que desejo...
Os teus lhos nasçam poços
onde descansam para sempre a
paz do tempo todo e o teu
peito seja tão grande e tão produzindo, que lhe
possa confiar o mundo...
Lisboa,
1950
A
caminho
Vai amigo...
vai, e não esperes mim...
ao longe fica a estrada, talvez certa,
talvez bela. É tua esta
jornada. Já passas a cancela...
porque olhas para
trás?...
Vai amigo...
Amanhã voltarás.
É longo o meu adeus.
Estão tristes os meus olhos por tudo, eles me estão tristes neste fim...
Mas vai, que a hora é
breve...
Não esperes por mim.
1948
- 195?
Presença
Não perguntes por que
vim...
trazendo não - flores nos
dedos,
falando línguas
diferentes,
dizendo em risos -
segredos,
todos os sonhos dementes...
Não pergunte porque
vim...
Se pudesses entender este
este pulsar sem medida
terias chegado
do fim...
Mas estou junto a ti, a
ti, irmão, diz-me então,
que mais te importa?
Não perguntes porque
vim...
Lisboa
1952
Presságio
Algum dia, o sol virá apodrecer a minha, carne antiga...
a chuva derreterá o gelo
que me impediu de sentir durante tanto tempo!,
e um vento doloroso e
forte varrerá toda a campina...
E ficarei então
deserta...
E na solidão da planície,
incerta puderas-me
caminhar ao longe...
Vestida de sifêncios e de
lírios,
com a libertação a
coalhar no fundo das matérias...
E não me recompensarás.
Lisboa 1953
CONCLUSÃO
Chegamos a conclusão de que Alda Lara nunca
deixou de partilhar as preocupações da angolanidade, soube escrever
aproveitando a superação lírica do neo-realismo realizada pelos poetas da Távola Redonda, ainda que mantenha
por vezes um tom conclamatório e didáctico que de lá lhe terá vindo. As
considerações a respeito de Alda Lara como a expressão da fase dura das lutas
contra o regime colonial, em que o “fazer poesia significou um comprometimento
com a luta pela libertação”. Os seus versos cantam as belezas do continente ou
denunciam as atrocidades impostas pela colonização, uma vez que tinham, por
missão, fazer com que os africanos redescobrissem a África que existia por
detrás da opressão.
BIBLIOGRAFIA
ü
EVERDOSA, Carlos. Roteiro da Literatura
Angolana. Luanda: Edição da Sociedade Cultural de Angola, 1974.
Faça Comentário