Vida e obra de Agostinho André Mendes de Carvalho ou Uanhenga Xitu
INTRODUÇÃO
Agostinho
André Mendes de Carvalho ou Uanhenga Xitu, foi inegavelmente um dos escritores
angolanos de primeira linha. Pertenceu à geração de
autores mais velhos ainda em actividade. Foi um dos mestres da literatura
angolana. E ele fez jus a esse estatuto não apenas no domínio estrito da
criação literária, em que os seus livros servem de inspiração e modelo a muitos
neófitos da coisa literária, mas também no do activismo literário, transmitindo
aos jovens a sua vasta experiência humana e até
apadrinhando-os de modo quase incondicional. Apesar de
ter a sua obra estudada em várias universidades, sendo objecto de teses de mestrado
e doutoramento, para além de possuir uma legião incomensurável de leitores
fiéis em Angola e noutros países de língua portuguesa, Uanhenga Xitu nunca se
assumiu como escritor. Preferiu que o considerem apenas um “contador de
estórias”. Mas claro que ele foi um escritor. Um escritor de estilo despojado
de circunlóquios e floreados “literários”, dono de uma escrita que parece
brotar directamente da fala popular. É como se essa escrita fosse tão somente a
fixação dessa fala. Uanhenga Xitu, na sua própria concepção, seria assim um
griot, um desses emblemáticos bardos africanos depositários da memória
colectiva.
VIDA E OBRA DE UANHENGA XITU
Uanhenga Xitu, nome quimbundo de Agostinho André Mendes de Carvalho,
nasceu em Calomboloca, a 29 de Agosto de 1924 e morreu aos 13 de Fevereiro de
2014. Estudou Enfermagem, em Luanda e Ciências Políticas na extinta República
Democrática Alemã. Em 1959, durante a ditadura de António de Oliveira Salazar,
que se estendeu desde o golpe de Estado em Portugal a 28 de Maio de 1926 até 25
de Abril de 1974, data da Revolução dos Cravos, Uanhenga Xitu foi preso pela
Polícia Internacional de Defesa do Estado (PIDE), por ser militante do
Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA).
O primeiro manifesto do MPLA foi publicado em Dezembro de 1956 e, em 4 de
Fevereiro de 1961, o movimento iniciou a revolução armada com o assalto às
prisões de Luanda.
A tentativa de libertar dirigentes e militantes do movimento foi
reprimida brutalmente pelas autoridades. Alguns prisioneiros, como Uanhenga
Xitu, António Jacinto, Luandino Vieira e António Cardoso, foram desterrados
para o Tarrafal. (cf. ERVEDOSA, 1979, p. 136-137) Uanhenga Xitu permaneceu, de
1962 a 1970, no campo de concentração do Tarrafal (Cabo Verde), onde começou a
escrever seus contos. Publicou O meu discurso (1974), “Mestre” Tamoda (1974),
Bola com feitiço (1974), Manana (1974), Vozes na sanzala / Kahitu (1976), Maka
na sanzala (1979), Os sobreviventes da máquina colonial depõem (1980), Os
discursos do Mestre Tamoda (1984), O ministro (1989) e Cultos especiais (1997).
Após a Independência, proclamada, em Luanda, à meia-noite do dia 11 de
Novembro de 1975, por Agostinho Neto, Uanhenga Xitu exerceu cargos como: Membro
do Conselho da Revolução, Comissário (Governador) da Província de Luanda,
Ministro da Saúde de Angola, Embaixador da República Popular de Angola na
República Democrática Alemã e na República da Polônia. Actualmente, é Deputado
na Assembleia Nacional pela Bancada do MPLA, tendo sido membro do Comitê
Central do MPLA até 1998. É membro da União dos Escritores Angolanos (UEA).
Fundada em 10 de Dezembro de 1975, a
União dos Escritores Angolanos tem por objectivos defender a dignidade e
especificidade cultural angolana, activar o inventário cultural do país no
contexto do renascimento cultural africano, e organizar os escritores para prosseguirem
na luta pela conquista de um futuro digno. (cf. ERVEDOSA, 1979, p. 154-155)
Ainda que Uanhenga Xitu tenha nascido literariamente na década de 1970, o
crítico literário angolano Luis Kandjimbo não hesita em enquadrá-lo na geração
de 1948, marcada pelo movimento
intelectual “Vamos Descobrir Angola!”, que pretendia uma “reacção à tentativa
assimilatória que vinha despersonalizando o negro sem o integrar de fato em um
novo contexto de valores.” (MOURÃO, 1978, p. 33) Uanhenga Xitu tornou-se
célebre por “Mestre” Tamoda, publicado pela primeira vez na Colecção
Capricórnio, iniciada em 1973, no Lobito, pelo editor Orlando de Albuquerque. Nesse conto, o escritor
situa-se entre duas culturas bem conhecidas por ele: a tradicional (do
colonizado) e a moderna (do colonizador), e os traços de ambas poderão ser
notados no diálogo entre a sanzala e a cidade.
A
abordagem rural da escrita de Uanhenga Xitu hoje, 39 anos depois da nossa
independência, de liberdades constitucionalmente asseguradas ao cidadão logo à
nascença, pode parecer aos olhos de leitores desavisados algo normal e pouco
importante. Ela pode ser melhor compreendida se dissermos que Uanhenga Xitu
pertence a uma geração de angolanos que foi submetida aos rigores do processo de
assimilação cultural, pelo regime colonial. Esse processo visava, em última
instância, que o autóctone negasse a sua própria cultura, a sua história, e
adoptasse a cultura do colonizador.
É
nesse contexto que se deve valorizar o feito de Uanhenga Xitu: constitui um
acto de resistência, ou melhor, de libertação. (Lembre-se que tanto “Mestre
Tamoda” como “Kahitu” foram escritos durante os anos em que o autor esteve
preso, por actividades nacionalistas, no centro prisional do Tarrafal, na ilha
de Santiago, em Cabo Verde).
Agostinho André Mendes de Carvalho, o homem, o político e também o escritor, já foram alvos de homenagens públicas, merecidas. É sempre bom quando um ente humano é testemunha das homenagens públicas e cerimoniais que lhe são prestadas. Mas o maior tributo que se pode prestar a um escritor é a reedição e a difusão dos seus livros. Aos 84 anos de idade, Agostinho Mendes de Carvalho, a encarnação de Uanhenga Xitu, é um político angolano de referência.
Agostinho André Mendes de Carvalho, o homem, o político e também o escritor, já foram alvos de homenagens públicas, merecidas. É sempre bom quando um ente humano é testemunha das homenagens públicas e cerimoniais que lhe são prestadas. Mas o maior tributo que se pode prestar a um escritor é a reedição e a difusão dos seus livros. Aos 84 anos de idade, Agostinho Mendes de Carvalho, a encarnação de Uanhenga Xitu, é um político angolano de referência.
Os Livros
Eminente
contador de ‘estórias’ populares, a narrativa de Uanhenga Xitu, estava cheio do rigor literário, pois a preocupação
primária do autor é estabelecer uma ligação semiótica com o seu povo, que o
estimula a escrever. A sua vivência na senzala transformou-o num homem
solidário e interessado com as necessidades humanas. Numa entrevista, Uanhenga
Xitu afirmou que "o que me preocupa é a situação social do povo". Em
2006 recebe a distinção do Prêmio de Cultura e Artes na categoria de literatura
pela qualidade do conjunto da sua obra literária, causando-lhe uma enorme
surpresa. Sendo assim, o homenageado e culto escritor angolano entrou na lista
dos melhores autores da história literária Angolana.
Alguns títulos da obra de Uanhenga Xitu :
- O Meu
Discurso
-
"Mestre" Tamoda
- Bola com
Feitiço
- Manana
- Vozes na
Sanzala (Kahitu)
-
"Mestre" Tamoda e Outros Contos
- Maka na
Sanzala
- Os
Sobreviventes da Máquina Colonial Depõem
- Os
Discursos do "Mestre" Tamoda
CONCLUSÃO
Uanhenga
Xitu foi um escritor popular, cuja escrita simples é um perfeito passaporte
para quem se queira iniciar no mundo da leitura. É preciso ressaltar que em
literatura, como nas artes em geral, o simples não é necessariamente sinónimo
de fácil. O mais fácil é escrever difícil, complicado.
Por detrás da aparente simplicidade da escrita de Uanhenga Xitu emergem figuras
e ambientes que jamais tinham sido, tão claramente, realçados na literatura
angolana. Na sua obra o quotidiano da vida rural, o
homem do mato, o ambiente das sanzalas, em toda a sua singeleza e riqueza,
foram descritos de modo tão honesto e humanizante que se gravam,
indelevelmente, na memória do leitor. A sua morte pois embora já mais velho,
deixou um vazio para o povo angolano. neste contexto poderemos preservar os
seus ensinamentos nas nossas mentes, seguindo os seus conselhos lendo livros e
poemas que foi escrito por ele. De facto foi um dos compatriotas que tanto
lutou para o colonialismo português e para a independência de Angola.
BIBLIOGRAFIA
ERVEDOSA,
Carlos. Roteiro da literatura angolana. 2. ed. Lisboa: Edições 70, 1979.
LEITE,
Ana Mafalda. Oralidades & escritas nas literaturas africanas. Lisboa:
Edições Colibri, 1998.
MACEDO,
Jorge. Literatura angolana e texto literário. Porto: Edições Asa / Luanda: UEA,
1989.