Empresa como centro de decisões

Introdução
            O estudo sobre o processo decisório nas empresas tem sido objecto de investigação de diversos teóricos e executivos. Nos últimos 50 anos, tem sido descoberto e analisado sobre o tema.
Sua importância e relevância para profissionais de diversas áreas envolvidas em processos de tomada de decisão são inquestionáveis, mas o actual contexto econômico-político-social – de globalização, intensa concorrência, desenvolvimento tecnológico tem exigido, cada vez mais dos profissionais a tomada de decisões mais certas, num espaço de tempo cada vez mais reduzido.
Por isso, a crescente importância de se tentar entender e construir modelos que proporcionem uma melhor aplicabilidade de técnicas e regras num processo de tomada de decisão empresarial onde a informação se apresenta como recurso fundamental para o embasamento deste processo.


















OBJECTIVO:
Este artigo tem por objectivo apresentar as conclusões de um trabalho sobre modelos de tomada de decisão estratégica em empresas de pequeno porte, tendo como referencial teórico os modelos de tomada de decisão apresentados por Chun Wei Choo.
O PROCESSO DE TOMADA DE DECISÃO ESTRATÉGICA NAS EMPRESAS
Segundo Choo (2003) as decisões resultam da adopção de um determinado curso de acção, e facilitam esta acção na medida em que definem e elaboram propósitos e alocam e autorizam o dispêndio de recursos.
Portanto, o processo decisório pode ser visto como um conjunto de acções e factores que têm início a partir da identificação de um estímulo para a acção e que se finaliza com o compromisso específico para a acção. Harrison (1993) cita que cada decisão deve levar em conta determinados aspectos, e que não há uma fórmula pronta que se aplique a todos os casos. Para este autor, o modelo processual de tomada de decisão pode ser a escolha ideal no caso de decisões que terão consequências de longo prazo, ou seja, decisões de carácter estratégico.
Mintzberg et  (1976) cita os processos decisórios não-estruturados, que se referem aos processos decisórios para os quais não existem, de forma pré-determinada e explícita, um conjunto de respostas ordenadas na organização.
Simon (1976) afirma que os homens são racionalmente limitados: quando tentam ser racionais, o seu comportamento racional é limitado por suas capacidades cognitivas e por restrições da organização. Os tomadores de decisão adoptam estratégias reducionistas para simplificar a complexidade dos problemas:
1) Preferem a ‘solução satisfatória’ à ‘solução óptima’, ou seja, a decisão é orientada pela busca de alternativas suficientemente boas, e não pela busca das melhores alternativas possíveis;
2) Procedem de forma a descobrir, gradativamente, as alternativas e consequências no processo de busca;
3) Os programas de acção servem como soluções alternativas recorrentes;
4) Cada programa específico de acção lida com um número restrito de situações e consequências;
5) Cada programa de acção pode ser executado com uma relativa independência – sem ligações rígidas.



Harrison (1993) cita que o processo de tomada de decisão é um produto da cultura onde a decisão acontece e, ao mesmo tempo, influencia essa cultura. Além disso, afirma que este processo, no actual mundo mutável e complexo, leva em conta relevantes aspectos de muitas disciplinas, não só da economia, da matemática e da estatística.
Diante disso, os aspectos interdisciplinares do processo de tomada de decisão são mais bem ilustrados através da construção de modelos.
Segundo Barbosa (2004), um modelo é uma representação simplificada da realidade, suficiente para explicar esta realidade. Um modelo mostra, graficamente, qual a ênfase que as disciplinas apropriadas devem receber no processo de tomada de decisão, e deve incluir um número ‘óptimo’ de variáveis que irão explicar os fenómenos do mundo real de forma mais simplificada.
OS QUATRO MODELOS DE TOMADA DE DECISÃO DE CHUN WEI CHOO
Segundo Harrison (1993), não há limite para o número de modelos de tomada de decisão que podem ser desenvolvidos. Entretanto, para este trabalho, tomar-se-á como referência Choo (2003), que considera quatro modelos de tomada de decisão presentes nas organizações: o modelo racional, o modelo processual, o modelo político e o modelo anárquico.
No Modelo Racional, a tomada de decisões é um ato orientado para objectivos e guiado por problemas, sendo o comportamento de escolha regulado por normas e rotinas, de modo que a organização possa agir de uma maneira procedimental e intencionalmente racional. Este modelo foi desenvolvido, inicialmente, por March e Simon (1975), March (1994) e Cyert e March (1992). De acordo com estes autores, e devido aos limites da mente humana (limites cognitivos) e à complexidade dos problemas que ela enfrenta, a tomada de decisão requer simplificações, sendo uma das simplificações a utilização de programas de desempenho. Estes programas podem conter especificações sobre as actividades de trabalho, sobre os produtos e sobre o ritmo de trabalho.
Para estes autores, os procedimentos operacionais são a memória da organização, e oferecem estabilidade e orientação para a execução de actividades e decisões recorrentes. Eles distinguem quatro principais tipos de procedimentos:
1º- Regras para o desempenho de tarefas;
2º- Constantes registos e relatórios;
3º- Regras para lidar com a informação;
 4º- Planos e regras de panejamento.



As regras e procedimentos decisórios baseiam-se em três princípios gerais: evitar a incerteza, adoptando métodos como o feedback de curto prazo para desencadear a acção e impor regras para a tomada de decisão; manter as regras, buscando conservar procedimentos decisórios pelo máximo tempo possível para evitar a tarefa de re-elaborar todo o processo, e; usar regras simples. Diante do exposto, o modelo de tomada de decisões de Cyert e March (1992) compõe-se de quatro conceitos:
1) Evitação da incerteza;
2) Quase resolução do conflito;
3) Busca motivada por problemas e;
4) Aprendizado organizacional.
Inicialmente, a organização analisa o feedback do ambiente e, se a incerteza é alta, negocia com o ambiente para a redução desta incerteza. Considera-se um objectivo de cada vez, e avalia-se o desempenho e a consecução dos objectivos usando as regras para uma decisão aceitável.
Se um objectivo não está sendo atingido, activa-se uma busca orientada por problemas, num primeiro momento, localmente, e se não tiver sucesso, é expandida para incluir fontes e alternativas mais remotas.
No Modelo Processual, as fases e ciclos que dão estrutura às actividades decisórias (estratégicas), complexas e dinâmicas, são elucidados. Este modelo é exemplificado no trabalho de Mintzberg, Raisinghani e Théorêt (1976), que conseguiram discernir fases e rotinas que indicam uma estrutura subjacente aos processos decisórios.
Dada a complexidade e a amplitude das decisões estratégicas, o modelo possui três fases decisórias principais, três rotinas de apoio às decisões e seis grupos de factores dinâmicos. As três principais fases decisórias são a identificação, o desenvolvimento e a selecção.
 A fase de identificação reconhece a necessidade de se tomar uma decisão e desenvolve a compreensão das questões implicadas na decisão, e consiste em rotinas de reconhecimento e de diagnóstico.
Na rotina de reconhecimento, a necessidade de uma decisão (reconhecida) é definida como uma necessidade de informação, ou “a diferença entre a informação sobre uma situação real e um padrão esperado” (Mintzberg et al., 1976). Na rotina de diagnóstico, a administração tenta compreender os estímulos que desencadeiam a decisão e as relações causais relevantes para a situação, através, primordialmente, da actividade de busca de informação, envolvendo a “consulta aos canais de informação existentes e a abertura de novos canais para esclarecer e definir os problemas”.


A fase de desenvolvimento leva à busca de uma ou mais soluções para um problema ou à criação de uma oportunidade, e consiste em rotinas de busca (pesquisa) e rotinas de criação (desenvolvimento/projectos). Com relação às rotinas de busca, estas são de quatro tipos: busca na memória, busca passiva, busca-armadilha e busca activa. Já as rotinas de criação envolvem o desenvolvimento de uma solução customizada (única) ou uma solução com o intuito de modificar uma alternativa já existente (escolha entre múltiplas alternativas).
A fase de selecção avalia as alternativas e escolhe uma solução para um compromisso com a acção, e consiste em rotinas de sondagem (crivo), rotinas de avaliação-escolha (julgamento, negociação/barganha e análise) e rotinas de autorização.
Além das três principais fases decisórias, o modelo decisório processual é facilitado por três rotinas de apoio à decisão: rotinas de controlo (que consistem em panejamento e em comutação, onde quem decide não apenas executa os passos que levam à decisão, como também planeja como chegar até ela e como alocar os recursos necessários para isso), rotinas de comunicação (que reúnem e distribuem a informação como parte do processo decisório, e consistem na exploração, na investigação e na disseminação da informação) e rotinas políticas (que reflectem a influência de indivíduos e as relações de poder presentes na organização, e podem assumir a forma de barganha, persuasão ou de cooptação).
A tomada de decisão no modelo processual ainda sofre a influência de seis grupos de factores dinâmicos: as interrupções, o adiamento ou adiantamento de prazos, feedbacks, ciclos de compreensão e ciclos de fracasso.
No Modelo Político, a política é considerada o mecanismo de decisão, quando diferentes jogadores ocupam diferentes posições e exercem graus diferentes de influência, de acordo com as regras e seu poder de barganha, de modo que as decisões resultam menos de uma escolha racional do que dos altos e baixos da política.
Este modelo é desenvolvido por Allison (1972), que se utiliza da metáfora da tomada de decisão como um jogo. Neste sentido, as acções e decisões podem ser analisadas com base nas respostas a uma sequência de quatro perguntas:
1) Quem são os jogadores?;
2) Quais as posições dos jogadores?;
3) Qual a influência de cada jogador?;
4) Como a posição, a influência e os movimentos de cada jogador combinam-se para gerar decisões e acções?
Finalmente, no Modelo Anárquico, as organizações são consideradas ‘anarquias organizadas’, onde as situações de decisão são caracterizadas por preferências problemáticas (mal definidas e incoerentes), tecnologia obscura (onde os processos e procedimentos não são bem entendidos) e por uma participação fluida (onde as pessoas dedicam às actividades uma quantidade de tempo e esforço variáveis).

Este modelo é discutido com referência ao ‘modelo da lata de lixo’ proposto por Cohen, March e Olsen (1972), onde vários tipos de problemas e soluções são atirados pelos participantes, à medida que vão sendo gerados, e as decisões resultam do encontro de correntes independentes de problemas, soluções, participantes e situações de escolha.
Neste modelo, o senso de oportunidade é um elemento importante na escolha (tomada de decisão) de um projecto, e as decisões são tomadas de três diferentes maneiras: por resolução (pensa-se no problema por determinado tempo antes de se tomar a decisão), por inadvertência (quando uma escolha é adoptada rápida e incidentalmente para que outras escolhas sejam feitas) e por fuga (quando o problema original desaparece, e a decisão não resolve mais nenhum problema). De acordo com Choo (2003, p.298):
Embora o modelo anárquico possa parecer improdutivo, o processo da lata de lixo não é disfuncional, porque pode gerar decisões sob condições incertas e conflituosas, quando: os objectivos são ambíguos, os problemas não são bem compreendidos e os que tomam as decisões dedicam tempo e energia variáveis aos problemas.
Independentemente do modelo de decisão a ser utilizado por uma organização, Choo (2003, p.275) destaca que:
O ambiente organizacional no qual a decisão ocorre é definido, no mínimo, por duas propriedades: a estrutura e a clareza dos objectivos organizacionais, que têm um impacto sobre as preferências e escolhas, e a incerteza ou quantidade da informação sobre os métodos e processos pelos quais as tarefas devem ser cumpridas e os objectivos devem ser atingidos
Figura 1 – Modelos de tomada de decisões: ambiguidade/conflito sobre objectivos X incerteza técnica.
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Considerações finais
O trabalho realizado mostrou que o modelo processual, apresentado por Choo (2003), é o que mais se encaixa e se aproxima ao processo de tomada de decisão adoptado pela empresa. Conforme destacado por Harrison (1993), o modelo processual é muito útil para os momentos em que a inovação e a mudança organizacional se mostram necessárias, como no caso de tomadas de decisões estratégicas, sendo o mais recomendado na maioria dos processos de tomada de decisão.




REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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