1962-1974 DIFICULDADES, CONTRADIÇÕES, E DIVISÕES NACIONALISMO ANGOLANO
1962-1974
DIFICULDADES, CONTRADIÇÕES, E DIVISÕES NACIONALISMO ANGOLANO
De 1962 a 1965 - Reorganização das
forças em conflito
O segundo ano do conflito marca a
reorganização, e modernização, das tropas portuguesas, tanto ao nível logístico
como dos equipamentos. Em termos tácticos adoptou-se a
"quadrícula" em detrimento de pequenas unidades móveis de
intervenção rápida, defendidas por Costa Gomes. Embora melhor organizadas e superiores
em termos militares, as tropas continuam sujeitas às dificuldades do terreno,
aos guerrilheiros e à ameaça física e psicológica da utilização das primeiras
minas. As forças da UPA, apoiadas pelo Congo, são as que ameaçam mais os
portugueses dado que, desde o 4 de Fevereiro, os guerrilheiros do MPLA sofreram
uma fractura na sua organização dada a repressão recebida naquele dia. A
UPA organiza-se e, em 1961, forma o GRAE - Governo Revolucionário de Angola no
Exílio - reconhecido por vários estados africanos; em 1962 altera a sua
designação para FNLA - Frente Nacional de Libertação de Angola. No entanto, e
dado o alegado apoio dos Estados Unidos, o seu líder, Holden Roberto vê a sua
imagem prejudicada. Também o ano de 1962, assiste à modernização do seu
equipamento bélico: recebem a metralhadora AK-47, a semiautomática Simonov, a
pistola-metralhadora PPSH e lança-granadas RPG-2 e RPG-7, granadas de mão de
origem italiana "Società Romana" e minas do leste europeu.
Ao nível interno dos movimentos de
libertação, continuavam as divergências e as tentativas de criação de uma
frente única. Em 1962, durante um congresso do MPLA, Agostinho Neto e Mário de
Andrade formaram um novo comité executivo deixando de fora Viriato da
Cruz. No ano seguinte, em Julho de 1963, tem lugar uma conferência em
Brazzaville que reúne três organizações – Ngwisako, Movimento para a Defesa dos
Interesses de Angola e Movimento Nacionalista de Angola. O objectivo era a
criação de uma frente única designada por Frente Democrática de Libertação de
Angola (FDLA). Dos seus membros fazia parte Viriato da Cruz que acaba por
criticar o movimento, afirmando tratar-se de uma ligação do MPLA com
organizações simpatizantes com os portugueses; Viriato, e outros elementos,
acabariam expulsos da Frente. No mesmo mês, a OUA reúne-se com elementos da
FNLA, da FDLA e outros, e aponta a FNLA como o único movimento nacionalista de
Angola; pede, também, que o GRAE fosse reconhecido pelos demais países
africanos, e que os outros movimentos nacionalistas se unissem à
FNLA. Mário de Andrade era contra a criação do FDLA, e Agostinho Neto,
nomeado para presidir a esta frente, criticou a recomendação de adesão à FNLA.
Entretanto, em 1963, surge um novo
movimento independentista, a Frente
de Libertação do Enclave de Cabinda (FLEC), liderado por Luis
Ranque Franque, cuja luta era a independência do seu território, Cabinda. Geograficacamente
separada de Angola, Cabinda é uma região com grandes reservas costeiras
de petróleo. Protectorado português
desde 1885, data do Tratado de Simulambuco, no governo de
Salazar (1956), a região foi integrada administrativamente em Angola, violando
o Tratado.
Até 1974, a FLEC lutou contra Portugal.
Com o Acordo do Alvor (1975), do qual a FLEC foi excluída, Cabinda passa a
fazer parte integrante de Angola e, a partir dessa data, a luta passou a ser
feita contra a própria Angola, quando o MPLA invade o território.
Críticas e apoios ao colonialismo
português
As primeiras críticas à resistência do
governo português de descolonizar datam de 10 de Março de 1961 quando a questão
é apresentada na ONU. A Delegação portuguesa abandona a Assembleia-geral e, no
mês seguinte, esta anuncia a sua posição favorável à auto-determinação de
Angola. No ano seguinte, a OUA -Organização
de Unidade Africana - corta relações com Portugal. O governo de Salazar, consciente
das várias divisões existentes entre os países africanos, aproveita-se dessa
situação para apoiar o movimento do Catanga, do recém-independente Congo Belga,
liderado por Moisés Tschombé. No entanto, em 1963, as forças militares da ONU
atacam aquele movimento provocando a sua fuga para o Nordeste angolano,
controlado pelas forças portuguesas.[151] Em 1964, depois de uma reviravolta
política devido à conturbada conjuntura interna do Congo Belga, Tschombé assume
o cargo de Primeiro-ministro em Leopoldville. Tanto para Portugal como para
Tschombé, a situação é positiva, pois a região Norte de Angola deixa de estar
pressionada, e Tschombé recebe armamento português para lutar contra um
movimento rebelde.[151] Em 1965, nova reviravolta:
primeiro o Presidente Kasavubu demite Tschombé, e de seguida, depois de um
golpe de estado, Mobutu assume o poder do Zaire. Mobutu, familiar de
Holden Roberto, aumenta o apoio à FNLA.
Após o assassinato do Presidente John F. Kennedy e da subida ao poder de Lyndon Johnson em
1964, os Estados Unidos alteraram a sua política anticolonial e diminuíram o
apoio à FNLA. A nova política norte-americana via o anticolonialismo como mais
vantajoso para os países de Leste, em particular a União Soviética; este
pensamento político era semelhante ao português. A falta de apoio por
parte dos EUA leva a uma forte diminuição da actividade dos guerrilheiros de
Holden Roberto. No entanto, a subida ao poder de Mobutu em 1965, iria
representar um novo ânimo à organização. Porém, dadas as relações não oficiais
do Zaire com Portugal, este apoio modificar-se-ia em 1969, por um lado pelo
mal-estar causado pelos guerrilheiros do FNLA junto das populações da fronteira
com o Congo; e, por outro lado, pela necessidade de utilização dos
caminhos-de-ferro de Benguela para exportar os seus minérios através do porto
do Lobito. A partir desta altura, os combatentes da FNLA
estavam confinados a uma base de Kinkusu, próximo de Kinshasa, ou seja, fora de
Angola. Este novo apoio tinha interesse político para Mobutu que queria estar
comprometido com a luta pela libertação colonial.
1966: abertura da frente Leste
Criação da UNITA
Em 1966, Jonas Savimbi cria a UNITA,
depois de ter saído em conflito com Holden Roberto da FNLA/GRAE. Praticamente
limitado ao apoio dos Ovimbundu, Savimbi estabelece a sua base na Zâmbia, e em alguns pontos de Angola. A primeira
operação da UNITA data de Dezembro de 1966, com um ataque a Cassamba, no
Leste, seguido de outro a Teixeira
de Sousa. De acordo com os militares portugueses, porém, o MPLA reivindica
para si a autoria deste ataque em Março desse ano. No entanto, um ano
depois, a organização de Savimbi é expulsa da Zâmbia após ter atacado o
caminho-de-ferro de Benguela e um comboio que
transportava cobre. Embora frágil
em relação ao armamento, a força da UNITA baseava-se essencialmente na
personalidade forte de Savimbi que conseguia o apoio em massa das populações.
Neste ano, a UNITA de Savimbi, aumenta a sua actividade na zona Leste, rumo
ao Bié. Em 1968, com o apoio da população, a UNITA consegue
infligir sérios danos ao caminho-de-ferro de Benguela, destruindo vários metros
de carris e fazendo descarrilar várias composições. De acordo com
Savimbi, a UNITA passa a ter a sua sede no interior de Angola.
Frente Leste
Em 1963, o MPLA é expulso de Kinshasa por Mobutu, e fixa a sua nova sede
em Brazzaville. Porém, o MPLA continuava a ter dificuldades em progredir no
terreno dada a presenças das tropas portuguesas e, mais importante, da presença
do FNLA, com quem teve diversos confrontos e perdeu vários homens. No ano
seguinte, em 1964, o MPLA inicia uma ofensiva contra o enclave de Cabinda mas não obtém
grande êxito devido à pequena dimensão da região, à pouca receptividade da
população e ao facto de Portugal ter reforçado militarmente a zona para
defender a Gulf Oil Company, uma empresa norte-americana de exploração de
petróleo. O ano de 1964, marca uma série de contratempos no interior do
MPLA. No entanto, Agostinho Neto consegue efectuar uma reestruturação da
organização, chegando a conseguir o reconhecimento do movimento por parte da
OUA, que já tinha reconhecido a FNLA. Esta situação significa uma vitória
política a nível interno e externo.
Em Março de 1966, o MPLA abre a frente
Leste causando alguma surpresa às forças portuguesas que julgavam ter a
situação militarmente controlada. Já há algum tempo que não havia actividade
militar significativa por parte do MPLA, que se encontrava parado a Norte e,
por seu lado, a FNLA efectuava apenas ataques pontuais. O MPLA continuaria
a sua progressão no terreno até Cuando-Cubango, penetrando na zona central do
território, uma zona estratégica, importante pelos seus recursos naturais e
onde se concentrava a população. Por esta altura, as tropas portuguesas
controlavam a maioria das populações, as vias terrestres entre as diferentes
localidades e as infiltrações de guerrilheiros no território. Chegou mesmo
a ser equacionada, por oficiais médios e inferiores do Exército, uma solução
política para o conflito como forma de proteger uma das principais fontes de
receita que eram os diamantes e o Caminho de
Ferro de Benguela. No entanto, o mesmo não pensavam os oficiais superiores, que
gozavam de boas condições de vida em Angola, e nem o Governo de Lisboa que
continuava intransigente na questão da independência angolana. Por esta altura,
assiste-se a uma grande circulação monetária em Luanda
A partir de 1967, a estratégia do MPLA é
o controlo da zona Leste de Angola, junto da fronteira com a Zâmbia. Juntos, o
governo do MPLA, a população e a guerrilha começam obter algum sucesso militar
e é criado o conceito de "zona libertada".
Com a abertura da frente Leste, a guerra
entra numa nova fase em que todas as forças lutam entre si, e em que o conflito
ganha uma dimensão internacional. Em 1968, cerca de 2000 catangueses juntam-se às tropas portuguesas
recebendo treino dos Comandos. A UNITA dá
apoio a tropas da SWAPO que circulam
entre a Zâmbia e a Namíbia através de Angola, nomeadamente pela região de
Cuando-Cubango; em troca, a UNITA recebe armamento de qualidade. A África do
Sul, tentando evitar a penetração da SWAPO na Namíbia, fornece pilotos e
helicópteros às forças portuguesas.