Cultura e Sociedade
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APONTAMENTOS DE ANTROPOLOGIA SOCIOCULTURAL 2011-2012- Prof. Dr. Xerardo Pereiro
– Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) - antropólogo- Correio
electrónico: xperez@utad.pt Web: www.utad.pt/~xperez/
TEMA 2: CULTURA E SOCIEDADE
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Objectivos:
-Que o aluno compreenda a noção de cultura e a sua
interligação com o social.
-Que o aluno se familiarize com os conteúdos conceituais e
as dinâmicas das culturas.
-Dialogar com a turma e colocar a questão nas suas mentes.
-Problematizar os conceitos com exemplos etnográficos.
-Debates sobre as definições de cultura
Guião:
2.1. Cultura e Sociedade
2.2. A noção antropológica de cultura
2.2.1. A cultura é aprendida
2.2.2. A cultura é simbólica
2.2.3. A cultura liga-se com a natureza
2.2.4. A cultura é geral e específica
2.2.5. A cultura inclui tudo
2.2.6. A cultura é compartida
2.2.7. A cultura está pautada
2.2.8. A gente utiliza criativamente a
cultura
2.2.9. A cultura está em todas partes
2.3. Cultura material e imaterial
2.4. A noção sociológica e a noção estética do conceito de cultura
2.5. Os conteúdos do conceito antropológico de cultura
2.6. Os universais da cultura
2.7. A mudança cultural
2.8. A mudança social
Bibliografia
Sítios em Internet
2.1. CULTURA E
SOCIEDADE
“As pessoas querem cultura, delimitada, reificada,
essencializada e atemporal, algo que hoje em dia as Ciências Sociais rejeitam
em geral” (Sahlins, 1999: 399).
A antropologia, enquanto ciência social e humana que é,
estuda o ser humano como um animal social e cultural. Cultura e Sociedade são
palavras sinónimas na fala: “Pertencemos à sociedade portuguesa”, “vivemos
dentro da cultura portuguesa”. Mas os científicos sociais tentam definir de uma
maneira mais exacta, porque é preciso ter conceitos afinados para analisar
correctamente os fenómenos sociais e culturais. Em realidade não são sinónimos,
pois dentro de uma sociedade podem coexistir diversas culturas. Portanto podem
entrar em conflito sociedade e cultura.
SOCIEDADE
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Há um consenso á hora de considerar a sociedade como “um
grupo de pessoas”, “que interligam entre si” e “que estão organizados e
integrados numa totalidade” para atingir algum objectivo comum. No interior
de uma sociedade podem coexistir e existem varias culturas e subculturas. A
diversidade cultural é cada vez mais inerente a todas as sociedades devido ao
aumento dos contactos interculturais. Sócrates (in Carrithiers, 1995: 13) já
se perguntava cómo devemos viver e a antropologia faz uma pergunta
semelhante: como viver juntos?. De aí que o conhecimento da diversidade
cultural seja um bem por ele próprio. A Sociedade está organizada através de
um sistema.
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RELAÇÕES SOCIAIS
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As relações sociais são tipos de acção pautada, e os antropólogos
sociais estão interessados nas pautas de interacção social que existem no
interior dos grupos, pelos papéis sociais (expectativas de conduta dos
indivíduos que realizam alguma tarefa) e a estrutura social (a ordenação dos
componentes ou grupos de cada sociedade). As pessoas fazem coisas com, para e
em relação com outras pessoas. A estrutura social é um quadro para
a acção (Firth, 1964: 35).
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CULTURA → Modo de vida (Linton, 1945: 30): pensar, dizer, fazer,
fabricar
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Cultura é um dos conceitos mais difíciles de definir no
vocabulário antropológico. Em 1871, o antropólogo E.B. Tylor (1975) definiu a
cultura como: “esse todo complexo que incluí conhecimentos, crenças, arte,
moral, lei, costumes e toda a série de capacidades e hábitos que o Homem adquire
enquanto que membro de uma sociedade dada”. Esta definição, criada no século
XIX e à qual sempre olhamos como referência, trata das qualidades que temos
os humanos enquanto membros de uma sociedade:
-Cultura
não material (“Ideofacto”): crenças, normas e valores. São os princípios acordados de convivência.
-Cultura
material (“Artefacto”): tecnologia. São as técnicas de sobrevivência.
Mas estas qualidades não são inatas (biológicamente
herdadas), porém são adquiridas como parte do crescimento e desenvolvimento
de uma determinada cultura.
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HOLISMO
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Na actualidade é próprio dos antropólogos tentar
explicar cada elemento da cultura concreta pela sua relação com os outros. É
esta perspectiva denominada “holística”, pois intenta ligar os aspectos
culturais e os aspectos sociais, uns são incompletos sem os outros e ao
revés. Acontece que os antropólogos socioculturais podem salientar alguns
aspectos mais do que os outros, porém na realidade os valores e as crenças
são inseparáveis da estrutura social e a organização social. Marcel Mauss
(1988: 200) chamava a isto “facto social total” ou “geral”, porque põe em movimento a totalidade da
sociedade e das suas instituições.
Estes fenómenos são, a um
tempo, jurídicos, económicos, religiosos, estéticos, morfológicos, sociais,
etc.
Exemplo: Um operário de uma fábrica de Verim, no fim do
seu trabalho saia dela em bicicleta, caminho de Chaves era parado e
inspeccionado por um guarda em Feces, mas como não levava outra coisa nela,
deixavam-no passar, assim durante várias semanas, até que se descobriu que o
que roubava eram bicicletas. O guarda só olhava uma parte, não o todo.
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2.2. A NOÇÃO
ANTROPOLÓGICA DE CULTURA
Numa obra dos
antropólos Alfred Kroeber e C. Kluckhohn (1963) foram reunidas 164
definições do conceito de cultura. Mais recentemente o antropólogo brasileiro
Roque de Barros Laraia (2009) e o antropólogo espanhol Ángel Díaz de Rada
(2010) realizaram reflexões profundas sobre este conceito tão complexo.
Apresentamos neste ponto o que
têm em comum estas definições e
as características da noção
antropológica de cultura. Vamos analisar agora algumas definições que representam a diversidade e a
complexidade deste conceito e que nos podem ajudar a entender melhor as
características da noção antropológica
de cultura:
E.B. TYLOR (1975,
or. 1871)
“A cultura ou
civilização, num sentido etnográfico alargado, é aquele tudo complexo que
inclui o conhecimento, as crenças, a arte, a moral, a lei, os costumes e qualquer outros hábitos e
capacidades adquiridos pelo homem em quanto que membro da sociedade” (Tylor,
1975: 29).
F. BOAS (1930)
"La cultura incluye todas las
manifestaciones de los hábitos sociales de una comunidad, las reacciones del
individuo en la medida en que se ven afectadas por las costumbres del grupo
en que vive, y los productos de las actividades humanas en la medida en que
se ven determinadas por dichas costumbres” (Boas, 1930:74; citada por Kahn,
1975:14).
B.
MALINOWSKI (1931)
"Esta
herencia social es el concepto clave de la antropología cultural, la otra
rama del estudio comparativo del hombre. Normalmente se la denomina cultura
en la moderna antropología y en las ciencias sociales. (...) La cultura
incluye los artefactos, bienes, procedimientos técnicos, ideas, hábitos y
valores heredados. La organización social no puede comprenderse
verdaderamente excepto como una parte de la cultura" (Malinowski, citada
por Kahn, 1975:85).
W.H.
GOODENOUGH (1957)
“La cultura
de una sociedad consiste en todo aquello que conoce o cree con el fin de
operar de una manera aceptable sobre sus miembros. La cultura no es un
fenómeno material: no consiste en cosas, gente, conducta o emociones. Es más
bien una organización de todo eso. Es la forma de las cosas que la gente
tiene en su mente, sus modelos de percibirlas, de relacionarlas o de
interpretarlas” (Goodenough, 1957:167; citada por Keesing, 1995: 56).
C. GEERTZ
(1966)
"La
cultura se comprende mejor no como complejos de esquemas concretos de
conducta —costumbres, usanzas, tradiciones, conjuntos de hábitos—, como ha
ocurrido en general hasta ahora, sino como una serie de mecanismos de control
—planes, recetas, fórmulas, reglas, instrucciones (lo que los ingenieros de
computación llaman "programas")— que gobiernan la conducta"
(Geertz, 1987: 51).
L.R. BINFORD, L.R. (1968)
“Cultura é todo aquele modelo, com formas que não estão
baixo o controlo genético directo... que serve para ajustar aos indivíduos e
os grupos nas suas comunidades ecológicas”, (Binford, 1968: 323; citada por
Keesing, 1995: 54).
R. CRESSWELL,
R. (1975)
"[A cultura é] a configuração particular que adopta cada
sociedade humana não só para regular as relações entre os factos tecno –económicos,
a organização social e as ideologias, porém também para transmitir os
seus conhecimentos de geração em geração (Cresswell, 1975: 32).
M. HARRIS
(1981)
"La
cultura alude al cuerpo de tradiciones socialmente adquiridas que aparecen de
forma rudimentaria entre los mamíferos, especialmente entre los primates.
Cuando los antropólogos hablan de una cultura humana normalmente se refieren
al estilo de vida total, socialmente adquirido, de un grupo de personas, que
incluye los modos pautados y recurrentes de pensar, sentir y actuar"
(Harris, 1982:123).
A. GIDDENS
(1989)
"Cultura
se refiere a los valores que comparten los miembros de un grupo dado, a las
normas que pactan y a los bienes materiales que producen. Los valores son
ideales abstractos, mientras que las normas son principios definidos o reglas
que las personas deben cumplir" (Giddens, 1991:65).
P. WILLIS (2003)
“... es un
sistema relativamente coherente de acciones materiales y de sistemas
simbólicos engranados que, con respecto a cada área, tienen sus propias
prácticas y objetivos; y que estas prácticas y objetivos constituyen el medio
ordinario de la vida social” (Willis, 2003: 448).
N. GARCÍA CANCLINI (2004)
`Cultura como o conjunto de processos sociais de
significação, de produção, circulação e consumo da significação na vida social´ (García Canclini,
2004: 34).
ANGEL DÍAZ DE RADA
`A cultura é a forma de vida social, o conjunto de regras
das relações sociais, o conjunto de regras da acção social, a descrição
dessas regras, as regras para relacionar-nos em cada situação concreta, um
discurso ´(Díaz de Rada, 2010: 19).
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Características da noção antropológica de cultura
2.2.1. A Cultura é aprendida
A definição de Tylor incide nesta ideia fundamental, a
cultura não é adquirida através da herança biológica, porém é adquirida pela
aprendizagem (consciente e inconsciente) numa sociedade concreta com uma
tradição cultural específica. O processo através do qual as crianças aprendem a
sua cultura é denominado inculturação.
Ainda que as crianças não são uma página em branco na qual escrever, a
inculturação é um processo de interiorização dos costumes do grupo, até o ponto
de fazer estes como próprios. Este processo é fundamental para a sobrevivência
dos grupos humanos, assim por exemplo os esquimos tem de aprender a proteger-se
do frio. O processo de inculturação produz-se fisicamente (gestos, formas de
estar, de comer...), afectiva e sentimentalmente (por causa da acção de reforço
ou repressão da nossa cultura) e também intelectualmente (esquemas mentais de
percepção do mundo). Os agentes de inculturação são a família, as amizades, a
escola, os media, os grupos de associação, etc.. Eles têm como missão
introduzir o indivíduo na sua sociedade através da aprendizagem da cultura. A
cultura organiza-se em cosmologias, isto é, em teorias sobre a ordem do mundo
como um todo; a cosmologia é uma forma de classificar o mundo e definir os seus
princípios.
Segundo Margaret Mead (2001), os tipos
de aprendizagem das culturas podem classificar-se em:
a) Culturas pós-figurativas: Aquelas nas
quais os filhos aprendem com os pais e o futuro dos filhos é o passado dos
pais.
b) Culturas pré-figurativas: Aquelas nas
quais os adultos aprendem com os filhos e os mais novos.
c) Culturas co-figurativas: Aquelas nas
quais todos aprendem com todos.
Alguns animais (i.e.: primates) também têm alguma capacidade
de aprendizagem, incluso para distinguir plantas, mas a diferença dos humanos,
os animais não podem transmitir culturalmente a informação cultural acumulada,
nem podem registar (ex.: escritura,...) codificadamente a informação cultural.
Exemplo etnográfico: Os macacos de Kosima (Japão):
Em 1953 biólogos japoneses realizaram uma experimentação
com macacos na praia de Kosima. Enviaram por mar batatas-doces para a praia.
Ao chegar as batatas eram comidas pelos macacos, mas apanhavam salitre e um
macaco começou a lavar e limpar de salitre as batatas. Cinco anos depois todo
o grupo tinha aprendido o comportamento de limpar a batata antes de comer.
Criou-se assim o conceito de “cultura animal”.
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A cultura é informação herdada através da aprendizagem
social, portanto diferente da “natura” (herdada geneticamente) e com uma
especificidade baseada no cérebro que é a linguagem. A linguagem permite aos
humanos articular, transmitir e acumular informação aprendida como nenhuma
outra espécie pode fazer.
Em relação com esta característica da
noção
de cultura, o antropólogo Clifford Geertz (1987) define a cultura como ideias
baseadas na aprendizagem cultural de símbolos. A gente converte em seu um
sistema previamente estabelecido de significados e de símbolos que utilizam
para definir o seu mundo, expressar os seus sentimentos e fazer os seus juízos.
Este sistema guia o seu comportamento e as suas percepções ao longo da sua
vida. A cultura transmite-se através da observação, da imitação, da escuta,
etc.; nesse processo de aprendizagem fazemos consciência do que a nossa cultura
define como bom e mau (princípios morais). Mas a cultura também se aprende de
maneira inconsciente, é o caso das noções culturais a manter com as pessoas
quando falam entre si, a distância da conversa e a linguagem não verbal. Por
exemplo, os latinos mantêm menos distância nas conversas pela sua tradição
cultural. Neste sentido, para Clifford
Geertz (1987) a cultura é:
- Uma
fonte ou programa extrasomático de informação.
- Um
mecanismo de controlo extragenético.
- Um
sistema de significados.
- Um
“ethos”.
- Um
conjunto de símbolos que veiculam a cultura.
- Um
conjunto de textos que dizem algo sobre algo (interpretações de
interpretações).
No sentido gertziano a cultura é um conjunto de “modelos de”
representação do mundo e da realidade, mas também um conjunto de “modelos para”
actuar no mundo (padrões, guias para a acção, o que está bem e o que está mau).
Clifford Geertz é muito ontológico e pouco fenomenológico, esquece que as
formas culturais não são só pautas de significado, senão que estão inseridas em
relações de poder e conflitos.
Segundo o antropólogo Carmelo
Lisón Tolosana (1974: 11), podemos entender o ethos (Weltanschauung)
como os sistemas de valores e normas morais, aquilo que a gente pensa que deve
ser, os estilos e modos de vida aprovados em um grupo humano, os hábitos
emotivos, as atitudes, tendências, preferências e fins que conferem unidade e
sentido à vida, os aspectos morais, religiosos e estéticos do grupo. O ethos
era definido por Gregory Bateson como os comportamentos específicos que
expressavam um sistema padrão de atitudes emotivas (Bateson, 1990: 286).
Face ao ethos, o pathos
representaria as emoções e as paixões, os sentimentos que se expressam nas
acções humanas. A estes dois conceitos, seguindo o esquema aristoteliano do
livro segundo da “Arte Retórica”, haveria que acrescentar o logos, isto
é, a razão e argumentação que o ser humano utiliza.
2.2.2. A Cultura é simbólica
O pensamento simbólico é exclusivamente humano. A capacidade
para criar símbolos é só humana. Que é um símbolo? Um símbolo é aquilo que
representa uma coisa, está em lugar de algo, e esta conexão pode ser
simbolizada de maneira diferente segundo as culturas:
Português
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Francês
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Inglês
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Swahili
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Espanhol
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Cão
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Chien
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dog
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Mbwa
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Perro
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Por tanto de alguma maneira esta associação é arbitrária e
convencional, socialmente aceite e compartida. O símbolo serve para veicular
uma ideia ou um significado que tem um significado social (sentido atribuído e
intencionado compartido socialmente).
A diferença
do resto dos seres vivos, que se comunicam de forma diádica
(estímulo-resposta), os humanos estabelecem comunicação de forma triádica por
meio de signos e símbolos que são abertos, arbitrários, convencionais e que
requerem descodificação (emisor-mensagem-receptor) e tradução.
2.2.3. A Cultura liga-se com a natureza
O debate sobre o binómio natureza-cultura é histórico. Não
podemos negar a importância da cultura em todos os aspectos da vida humana, mas
hoje a ciência tem demonstrado que existem mecanismos inatos complexos que
permitem a inculturação, portanto cultura e natureza não se excluem (Gómez Pin,
2005). E ainda que a natureza tenha as suas regras próprias, os seres humanos,
enquanto seres culturais, regulamentamos e pautamos o seu uso. Observemos um
exemplo para compreender estas características:
“Quando eu cheguei a umas colónias de verão á beira do mar
eram as 13:30 horas, e tinha desejos de tomar um banho nele, mas o regulamento
das colónias não permitia tomar banho nessa hora; o mar é parte da natureza,
mas estava submetido a uma ordenação cultural, os mares naturais não fecham ás
13:30 horas, mas sim os mares culturais”.
As pessoas têm que comer, sem embargo a cultura ensina-nos
que, como e quando. A gente tem que defecar, mas não todos o fazem da mesma
maneira (i.e.: Bolívia /Europa). A cultura, entendida como sistema de signos, é
contraposta à natureza (Lévi-Strauss, 1982), ao biológico e ao inato. O ser
humano é um ser biológico, mas o que o faz completamente humano é a cultura,
especificamente humana e constitutiva do humano. A biologia é uma condição
absolutamente necessária para a Cultura, mas insuficiente, incapaz de explicar
as propriedades culturais do comportamento humano e as suas variações de um
grupo a outro (Sahlins, 1990), de aí que possamos falar em certa autonomia, mas
também em interdependência entre cultura e natureza.
CULTURA
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NATUREZA
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2.2.4. A Cultura é geral e específica (Cultura –Culturas)
Num sentido geral todos os humanos temos “Cultura”
(“universal humano”), mas num sentido particular a “cultura” descreve um conjunto
de diferenças de um grupo humano específico com outros.
A
humanidade partilha a capacidade para a Cultura (todo o criado pelos seres
humanos), é este um carácter inclusivo; porém a gente vive em culturas
particulares (modos de vida específicos e diferentes) com certa homogeneidade,
uniformidade e harmonia internas, mas também com condicionantes ecológicos e
socio-históricos particulares.
2.2.5. A cultura inclui todo
Para os antropólogos ter cultura não é a mesma coisa que ter
formação académica (cultivo intelectual), refinamento, sofisticação e
apreciação das belas artes... Todo o mundo tem cultura no sentido antropológico
do termo. É assim como a antropologia tem uma perspectiva holística que presta
atenção a todas as manifestações e expressões culturais.
2.2.6. A cultura é partilhada
A cultura é partilhada pelas pessoas enquanto membros de
grupos. A cultura é aprendida socialmente, une às pessoas, está expressada em
normas e valores, e também é intermediária no sistema da personalidade pelos
actores sociais. Assim, a cultura converte-se num sinal de identidade grupal.
No interior duma cultura a distribuição dos bens imateriais pode ser tão
assimétrica e desigual como a dos bens materiais.
2.2.7. A cultura está pautada
A cultura é aprendida normativamente. Quer dizer que está
formada por umas regras ou normas integradas. Dispõe de um conjunto de valores
centrais, chaves ou básicos organizados num sistema. A conduta humana
governa-se por padrões culturais, mais do que por respostas inatas. Podemos
afirmar que as pessoas temos um “piloto” (a cultura) que nos orienta nas nossas
vidas.
` A cultura é uma pauta ou um conjunto de padrões
coerentes de pensamento e acção, uma organização coerente da conduta que inclui
a totalidade duma sociedade. A cultura é hereditária e aprendida, não genética;
tende à integração e à coerência, constitui configurações articuladas, é
plástica e realiza a função de atar e unir aos seres humanos ´.
(Benedict, 1971).
2.2.8. A gente utiliza criativamente a cultura
As regras culturais afirmam que fazer e como, as pessoas
interiorizam essas regras ou normas, mas não sempre seguimos o seu ditado. As
pessoas podem manipular e interpretar a mesma regra de maneiras diferentes,
utilizando criativamente a sua cultura, em vez de segui-la cegamente (Ex.:
Transgressão dos limites de velocidade).
Neste ponto
podemos distinguir entre o nível ideal
da cultura (o que a gente deveria fazer e o que diz que faz) e o nível real da cultura (o que fazem
realmente no seu comportamento observável). Mas não por isso o nível ideal
deixa de pertencer à realidade.
Desde este
ponto de vista podemos falar da cultura como produtora de mudança e conflito,
mas também como “caixote de ferramentas” (“tool kit”) de valor estratégico para
a acção social (Swidler, 1986). Portanto, a cultura podemos pensa-la como algo
externo que condiciona as nossas vidas ou como algo que como sujeitos (pessoas)
criamos em colectividades, isto é como um processo e um conjunto de
estratégias.
Nesta linha
podemos afirmar como a cultura é uma invenção social, isto é, uma construção
histórica constante (Wagner, 1975), portanto não é uma essência ou uma coisa.
2.2.9. A cultura está em todas as partes
“Comprei um tapete persa made in Taiwan numa loja
de chineses da Suíça”
A globalização
faz questão sobre a relação entre cultura e território, criando uma nova
cartografia cultural. Cai por si própria a ideia tradicional de cultura como
comunidade fechada, de acordo com a qual cada indivíduo só pode pertencer a uma
cultura. Hoje em dia o entre – cruzamento de culturas é uma realidade. A ficção
duma cultura uniformemente partilhada pelos membros de um grupo é pouco útil em
muitos casos. O conceito de cultura deve incluir heterogeneidade, mudança
rápida, empréstimos culturais e circulações interculturais. O conceito de
cultura acaba por fazer referência a 2 tipos de cultura:
1.
Ao
conjunto de especificidades duma comunidade territorialmente delimitada.
2.
Aos
processos de aprendizagem translocais.
Hoje dissolvem-se
muitas fronteiras entre culturas antes territorialmente delimitadas. É por isso
que as culturas volvem-se mais porosas. Vivemos numa economia-mundo
(Wallerstein, 1974) e a “a cultura está en todas partes” (Hannerz, 1998: 55). É
o indivíduo quem escolhe o seu repertório cultural. Na actualidade podemos
falar em sobremodernidade dos mundos contemporâneos (Augé, 1992) que se
caracterizaria pelo seguinte:
a) Uma
transformação mundial que alterou os conceitos de espaço, alteridade, identidade, etc. que a antropologia
vinha utilizando.
b) Excesso de Tempo (aceleração do tempo e
encolhimento do espaço).
c) Excesso de Espaço (acessibilidade
total, deslocalização do social, não lugares).
d) Excesso de Indivíduo (tendência à
individualização e perca das narrativas colectivas).
Hoje, o local intensifica a sua inter - conexão com o
global a partir do marco do Mercado, do Estado, dos movimentos e das formas de
vida (Hannerz, 1998). Robertson (1995) chega a falar em glocal como a síntese
relacional entre o local e o global, ultrapassando assim esta dicotomia. Esta
forma de caracterizar a noção
de cultura leva a alguns antropólogos a estudar as dinâmicas de viagem e não só
as de residência, e de ai que se sublinhem as “zonas de contacto” (Clifford,
1999). Outros falam em culturas híbridas (García Canclini, 1989), interligando
assim estrutura e processo, mas também salientando o papel do agente social na
dinâmica entre estrutura e acção. Assistimos hoje a uma mudança da afirmação de identidades culturais
diferenciadas para a afirmação
da interculturalidade. Hoje, corremos o risco de que o conceito de cultura seja
utilizado como uma forma de racismo (Benn Michaels, 1998), já que substitui
muitas vezes a biologia como argumento base da distinção entre os grupos
humanos, mas não é menos essencialista por isso. Podemos afirmar o seguinte:
“O indivíduo é um
prisioneiro da sua cultura, mas não precisa de ser a sua vítima” (Ferguson,
1987: 12)
Em síntese podemos afirmar o seguinte da noção antropológica de cultura:
- O
conceito antropológico de cultura afirma a dignidade equivalente de todas
as culturas.
- O
conceito antropológico de cultura tenta diminuir o etnocentrismo e o
elitismo do ocidentalismo.
- O
respeito às diferenças culturais deve ser a base para uma sociedade justa
(Kuper, 2001: 14).
- O
conceito antropológico de cultura defende o carácter local do
conhecimento.
- Muda
a maneira de olhar a realidade (uma diversidade criativa).
- O
significado antropológico de cultura como modo de vida global nega a
simples redução da cultura à actividades ligadas às belas artes.
- O
significado antropológico de cultura é como o açúcar diluído em água.
2.3. A CULTURA
MATERIAL E IMATERIAL
“Para
explicarnos a nosotros mismos nuestras ideas, necesitamos fijarlas en las cosas
materiales que las simbolizan” (Durkheim, 1993: 375)
A cultura é uma característica especificamente humana que
tem duas componentes:
- Uma
componente mental: produtos da actividade psíquica ora nos seus aspectos
cognitivos ora nos afectivos, significados, valores e normas.
- Uma
componente material: artefactos e tecnologia.
Porém, esta divisão tem motivado alguns debates que se podem resumir
na seguinte questão: Devem os
artefactos e a tecnologia ser considerados como parte da cultura?. Alguns
antropólogos como Robert Redfield, Ralph Linton, Murdock e outros têm
identificado a cultura só com os aspectos cognitivos e mentais: ideias, visão
do mundo, códigos culturais. Estes antropólogos consideraram a cultura material
como um produto da cultura e não cultura em si mesma.
Esta postura é difícil de defender
porque a cultura material (exemplo: os avances tecnológicos) exercem uma
influência muito grande nos aspectos cognitivos e mentais, ao mesmo tempo que
geram novos valores e crenças. A tecnologia permite que os humanos se adaptem
ao nosso contorno, do mesmo modo que os valores e as ideias. As catedrais
medievais e as pirâmides egípcias reflectem determinados interesses, fins e
ideias da cultura na qual nasceram. São a manifestação de ideias religiosas,
políticas e científicas. Os dois aspectos (materiais e não materiais) devem ser
considerados como partes integrantes da cultura, os dois estão estreitamente
ligados. Maurice Godelier (1982) chegou a afirmar que todo o material da
cultura se simboliza e que todo o simbólico da cultura se pode materializar.
Marshall Sahlins (1988) destaca como o
carácter constitutivo da cultura invalida a distinção clássica entre cultura
material e imaterial, plano económico e cultural. Ele integra os dois pólos,
pois os seres humanos organizam a produção material da sua existência física
como um processo significativo que é o seu modo de vida. Todo o que os humanos
fazem está cheio de sentido e de significado. Por exemplo, cortar uma árvore
(para lenha, para construir uma canoa, para criar uma escultura, para fazer
pasta de papel) pode significar modos culturais específicos. O valor de uso não
é menos simbólico ou menos arbitrário que o valor da mercadoria. Assim o
sublinha Sahlins:
“As calças são produzidas para os homens e as saias para as
mulheres em virtude das suas correlações num sistema simbólico, antes que pela
natureza do objecto per se, ou pela sua capacidade de satisfazer uma
necessidade material...” (Sahlins, 1988 ).
Exemplo etnográfico: Os bosquimanos do deserto do Kalahari,
cazadores-recolectores, mostram um carácter integrador na caça de animais, pois
as técnicas e estratégias de caça estão unidas aos rituais religiosos. Dançavam
e entravam em trance para superar as ansiedades da sua pobre tecnologia. É
assim como os elementos materiais e não materiais apoiam-se como elementos
inseparáveis da adaptação dos bosquimanos ao seu meio. Todos eles contribuem á
sobrevivência material do grupo humano.
2.4. A NOÇÃO SOCIOLÓGICA E A NOÇÃO ESTÉTICA DO CONCEITO DE CULTURA
“No sé cuantas
veces he deseado no haber oído nunca la maldita palabra” (Raymond Willians,
citado em Díaz de Rada, 2010: 17).
Raymond Willians (1976) distingue três maneiras de entender
e utilizar o conceito de cultura:
a) Antropológica.
b) Sociológica.
c) Estética.
Se a perspectiva antropológica de cultura entende a
cultura como impregnada em tudo, o sociológico entende a cultura como um campo
de acção específico juntamente com outros –economia, política-, que estão
estratificados de acordo com determinados critérios. Se a perspectiva antropológica
de cultura entende a cultura como o açúcar diluído, o conceito sociológico de
cultura é o pacote de açúcar sem dissolver. O conceito sociológico de cultura
entende esta como um campo de conhecimento dos grupos humanos. A noção
sociológica de cultura fala da cultura como produção e consumo de actividades
culturais, daí a sua ligação
com as políticas da cultura. Deste ponto de vista a cultura passa a ser
entendida como espectáculo, como política de cheque, como produção e consumo.
Para a noção antropológica a cultura é um processo resultante da participação e
da criação colectiva, não é um assunto de artistas e intelectuais, mas para a
noção sociológica a cultura é
uma “indústria cultural”. Os primeiros a utilizar este conceito foram Adorno e
Horkheimer (1979) em 1947. Segundo estes teóricos da Escola de Frankfurt, os
produtos culturais passaram a ser produzidos da mesma maneira que outros bens
de consumo e também consumidos pelas massas. Nesta linha, Gilles Lipovetsky
(2004) ao analisar o passo das sociedades modernas às hipermodernas afirma que nos
anos 1980 as sociedades desenvolvidas eram sociedades vazias e
hiperconsumistas, pois à diferença da cultura clássica, que tinha como fim
elevar o ser humano, as indústrias culturais hiperconsumistas tentam distrair
este.
Já o uso estético do conceito
de cultura descreve actividades intelectuais e artísticas como por exemplo a
música, a literatura, o teatro, o cinema, a pintura, a escultura e a
arquitectura. Este conceito define a criação artística como forma de cultivo humano do espírito. É sinónimo
de “Belas Artes” e exige niveis de instrução educativa formal. Por extensão
pensa-se que uma pessoa que conhece e pratica estas manifestações artísticas tem que ser diferente da
gente comum, atribuindo-lhe a categoria de culto, em oposição ao “inculto” ou
de “pouca cultura”. Portanto, a noção estética de cultura entende-se como “alta cultura” (ex.: ir à
ópera), a produção cultural de
uma minoria para uma elite letrada de iniciados. Esta perspectiva elitista, promovida na Europa refinada do século XIX, é
criticada pela noção antropológica de cultura, pois confunde niveis de
instrução com conhecimento e capacidade criativa, refinamento com habilidades
culturais para dar resposta aos problemas quotidianos.
Contudo é certo,
que hoje quebram-se as distinções entre “alta cultura” e “baixa cultura”, cultura de elite
e cultura de massas, cultura culta e cultura popular, ficando os limites muito
ambíguos. Isto não significa que não devamos programar alternativas de produção
cultural críticas e moralmente defendíveis. Por outro lado, importa destacar
que a cultura lixo (Bouza, 2001), muitas vezes promovida pelos “mass média”, já
não é popular (do povo), mas para o povo (de massas, mediática), o que é muito
criticável pela sua falta de ética e pela falta de humanismo. Verifica-se hoje
um processo de mercantilização e politização da cultura que
deve ser explorado e reflectido na sua complexidade.
2.5. OS CONTEÚDOS
DO CONCEITO ANTROPOLÓGICO DE CULTURA
Alguns elementos integrantes da noção de cultura são: as
crenças, as ideias, os valores, as normas e os signos culturais. Pela sua
grande importância debrucemo-nos um momento sobre deles.
As crenças e as ideias
Em primeiro lugar, qual é a diferença entre uma crença e uma
ideia? As crenças são definições
sociais sobre o mundo e a vida. Assim o afirmou o filósofo Ortega y Gasset:
“En efecto,
en la creencia se está, y la ocurrencia se tiene y se sostiene. Pero la
creencia es quien nos tiene y sostiene a nosotros” (Ortega y Gasset, 1968: 17).
Portanto, as ideias têm-se, nas crenças
estamos. As crenças não podem ser submetidas á proba de verificação com os
factos, pois é uma verdade indiscutível e sem dúvidas para quem a defende. No
momento em que uma crença é considerada susceptível de confrontar com os factos
passa a converter-se numa ideia.
As ideias
são formas de sabedoria susceptíveis de contrastar-se empiricamente com os
factos observáveis, podemos comprovar a sua verdade ou falsidade.
Tanto as ideias como as crenças são
modos cognitivos de apreender a realidade, de conhece-la. Nos processos de
mudança há ideias e crenças que perdem terreno em benefício de outras. As
ideias podem converter-se em crenças por repetição ou por convencimento da
ideia, cristalizando e internando-se na mente das pessoas. Por exemplo, na
auto-estrada não vai circular nenhum carro em sentido contrário pela nossa via.
Dentro de cada cultura as crenças
tendem a formar um sistema relativamente coerente, com reforços mútuos, isto
não quer dizer que não haja contradições internas e rupturas, só que há uma
tendência à coerência interna.
As ideias
são cada vez mais reconhecidas como elemento fundamental da cultura, assim
temos como grupos humanos como os ianomami do Amazonas reivindicam direitos culturais
sobre as terras, as células e o seu ADN mas também sobre a propriedade
intelectual das ideias. Igualmente uma parte dos membros do Congresso Geral da
Cultura Kuna (Panamá) rejeita a ideia de que a sua cultura possa ser
candidatada a património da humanidade, pois pensa-se que a sua cultura é deles
e não de toda a humanidade.
Os valores
Para a antropologia, os valores
são juízos de desejabilidade e aceitabilidade, isto é, aquilo que as pessoas
estimam como mais importante. Os valores são princípios morais incutidos na
vida das pessoas. Os valores partilhados geram identidades comuns e orientam a
vida social (Sanmartín, 1999).
Do mesmo modo também existem
contravalores correlativos, assim por exemplo:
Igualdade
|
Desigualdade
|
Solidariedade
|
Individualismo
|
Liberdade
|
Dependência
|
Os juízos de rejeitamento e oposição expressam também
valores de uma maneira não explícita. Eles são princípios ou critérios que
definem o que é bom e mau para um determinado grupo. A partir destes princípios
básicos ou valores geram-se um conjunto ideativo e normativo pelo qual se guia,
orienta e controla a conduta dos indivíduos. Mas igualmente, os valores também
são criadores de possibilidades e de novas realidades.
Os valores
não são qualidades das coisas, porém são relacionais, são valores para alguém.
São um critério de selecção da acção. Os valores que mantêm um grupo social
tendem a formar um sistema coerente. Este é um sistema de preferências
(Sanmartín, 1999: 4). Há uma axiologia ou hierarquia de valores dentro da
conexão entre os mesmos. Exemplo: Individualismo na cultura norte-americana,
conectado com o esforço e o êxito.
As normas culturais
As normas são
regras para comportar-se de um modo determinado, e indicam o que
especificamente devem ou não devem fazer as pessoas em situações sociais. Estas
normas sociais são diferentes das leis jurídicas, ainda que as leis são parte
também destas normas sociais. As normas sociais estão inspiradas em valores. Não estão
formalizadas juridicamente mas ainda assim mantêm um poder coercitivo. Na sua
base estão um conjunto de valores articulados socialmente, que
orientam e guiam a acção humana.
Os símbolos
A cultura, entendida como comunicação, conforma-se através da criação e utilização de símbolos culturais. Estes incluem sinais, signos e símbolos. Os sinais
(sinais de trânsito) são símbolos que incitam, convidam ou obrigam a uma acção
(STOP). Os indicadores (exemplo: o fume, que indica a existência de lume) não
obrigam a uma resposta imediata como os sinais. Os signos são aqueles
símbolos com um significante que representa um significado por uma associação
ou analogia consciente e arbitrária (exemplo: cadeira=cadeira). Os símbolos
apresentam uma relação metafórica ou metonímica entre o significante e o
significado. Um símbolo é uma coisa que está em lugar de outra ou uma coisa que
evoca e substitui a outra (exemplo: Vieira: Peregrinação a Santiago de
Compostela) (O Pintor holandês O Bosco pintava conchas de mexilhões, ameixas,
etc. junto com desenhos de burros, galos ou cervos. As primeiras simbolizavam o
sexo feminino, os segundos a sexualidade masculina. Tratava o pintor de
expressar a través de símbolos a fornicação).
Portanto, um símbolo requer de 3 coisas:
1ª. Um significante.
2ª. Um significado.
3ª. A significação: Relação entre o significante e o
significado. Esta relação é definida por um código, que deve ser conhecido e aprendido pelos sujeitos.
Precisa também de 3 elementos:
EMISSOR (Com um código de emissão baseado em símbolos)®MENSAGEM
(Com um código de descodificação)®DESTINATÁRIO (Ser humano)
Exemplo: O vestido.
-Significados (mais além do evidente, banal ou superficial):
1. Protecção do clima.
2. Hábito, adaptação ás normas e costumes
pautadas num grupo humano (ex.: vestido de um homem, vestido de uma mulher,
vestido de drag-queen).
3. Adorno, sentido decorativo ou posta em
cena da aparência ou imagem do eu.
Pode haver uma pluralidade de significados ao descodificar a
mensagem. Qual é que será o significado mais importante? A resposta é conforme
os casos específicos e o contexto cultural.
Outros conceitos básicos para melhor compreender a noção
antropológica de cultura, desde uma perspectiva de produção histórica das
relações sociais, são os seguintes:
a) Ideologia (Williams,
1977). A
ideologia é uma visão da realidade composta de ideias e valores organizados num
sistema que trata de essa realidade e que tenta reproduzir ou transformar esta.
Esta tentativa de reprodução ou de mudança não está isenta de lutas ideológicas
e de conflitos.
b) Outro conceito associado ao anterior é
o de legitimação, que é uma proposição normativa utilizada no controlo
social:
“Por legitimação entende-se um conhecimento
socialmente objectivado, que serve para justificar e explicar a ordem social.
De outro modo, as legitimações são as respostas a qualquer pergunta sobre o por
quê de cada solução institucional diferente... As legitimações não só lhe dizem
à gente o que deve ser. Às vezes limitam-se a propor o que é.” (Berger, 1999: 52).
c) Habitus (Bourdieu,
1980 ; 1988). O
habitus é para Bourdieu (1980 : 88) o seguinte:
“Sistemas de disposições duradouras e transponíveis,
estruturas estruturadas predispostas a funcionar como estruturas estruturantes,
quer dizer, enquanto princípios geradores e organizadores de práticas e de
representações”.
Assim o habitus é o que caracteriza uma classe ou um
grupo social, materializa a memória colectiva e incorpora uma moral e uma visão
do mundo naturalizada socialmente. É desde este ponto de vista um dispositivo
para a acção,
um conjunto de esquemas geradores de práticas e percepções que se expressam nos
gostos, hábitos de consumo e nas representações da realidade.
d) Capital simbólico (Bourdieu, 1999: 172). O capital
simbólico é uma propriedade dos indivíduos, uma força, uma riqueza e um valor percebido,
conhecido e reconhecido. Este capital detenta uma eficácia simbólica
(Lévi-Strauss, 1969), uma espécie de força mágica que responde a umas
expectativas colectivas e que geralmente não se questiona. Este capital, junto
com outros como o económico, é necessário para a reprodução social.
e) Capital cultural (Bourdieu, 1999).
O capital cultural
é a capacidade para interpretar e compreender os códigos culturais. Esta
capacidade está desigualmente distribuída entre as classes e os grupos sociais.
Estes grupos lutam por obter poder cultural através do exercício dos “gostos” e
procurando dividendos que afirmem o “correcto” e o “legítimo”. Através do
capital cultural tenta-se justificar certa dominação. Assim o parque de
“Asterix”, na França, nasce para combater o domínio da banda desenhada dos EUA
e também de Eurodisney.
2.6. OS UNIVERSAIS
DA CULTURA
Entre a diversidade de culturas é possível achar alguns
traços comuns. Neste ponto, a antropologia não só estuda as diferenças como
também as semelhanças entre os seres humanos. Não podemos ver as diferenças
culturais como barreiras enfranqueáveis, porém como expressões da diversidade
cultural humana em acção que se podem comunicar, traduzir e articular. Face ao
relativismo mais absoluto que defende a incomunicabilidade entre culturas,
adoptamos um certo universalismo que promove a compreensão do outro, um
inventário do transcultural, do mestiço e do parentesco entre culturas
(Balandier, 1993).
Neste
sentido, alguns traços culturais existem em todas ou em quase todas as
sociedades e denominam-se universais
culturais, que são aqueles que distinguem os humanos das outras espécies:
3. Viver em grupos sociais como a família e compartir
alimentos.
Excepções ao tabu do incesto:
Irmão com irmã nos casos da realeza de Egipto, Havaí e os
Incas. Nestes casos o casamento exigia-se entre seres da linhagem porque
casar com mortais era uma corrupção da divindade. Era também um meio de
conservar a propriedade dentro da família. Cleopatra mandou matar o seu irmão
de 12 anos, logo de casar com ele, para depois casar com Júlio César e Marco
António.
-Middleton,
R. (1962): “Brother-Sister and Father Daughter Marriage in Ancient Greece”,
|
5. O matrimónio, entendido como relação social estável e
duradoura entre pessoas.
8. O etnocentrismo
cultural. O conceito de etnocentrismo foi criado pelo sociólogo William
Graham Sumner, quem viveu entre 1840 e 1910 (Shone, 2004). O etnocentrismo é
uma tendência a aplicar os próprios valores culturais para julgar o
comportamento e as crenças de pessoas doutras culturas. A gente pensa que os
seus costumes são os únicos, correctos, apropriados e morais. As visões etnocénctricas entendem o
comportamento diferente como estranho e “selvagem”, mas também como inferior.
As pessoas pensam que as suas normas representam a forma “natural” de
comportar-se e os outros são julgados como negativos.
O
etnocentrismo é uma visão das coisas de acordo com a qual o próprio grupo é o
centro de todo, e todos os outros se medem por referência a ele. Cada grupo
alimenta o seu próprio orgulho e a sua vaidade, proclama a sua superioridade,
exalta as suas próprias divindades e mira com desprezo aos outros. O
etnocentrismo pode manifestar-se em diferentes níveis: tribo, aldeia, minoria
étnica, área cultural, classe, pessoa, indivíduo... O problema do etnocentrismo
é a intolerância cultural face à diversidade e o fechar as portas à curiosidade
pelo conhecimento. O etnocentrismo cultural é uma atitude que pode derivar numa
ideologia com práticas racistas.
Em relação com este conceito temos o
de “tempocentrismo” (Brian O´Neill, conferencia no ISCCSSPP, Lisboa, 4-06-2007)
segundo o qual o nosso tempo e a forma de entender este seriam destacados como
os melhores e os mais apropriados com relação aos outros.
Aqui temos que fazer uma chamada de
atenção. A noção de cultura pode, politicamente e etnocentricamente, ser
utilizada para separar grupos humanos, mas desde um ponto de vista humanístico
deveria servir para melhorar a convivência e construír uma sociedade democrática
justa. É o que se denomina “novo etnocentrismo” (Sánchez Durá, 1996), isto é,
pensar o mundo como um conjunto de identidades impenetráveis que afirmam sempre
a sua particularidade face a outras.
O oposto ao etnocentrismo é o relativismo cultural, uma das ideias
chave da antropologia. O relativismo cultural afirma que uma cultura deve ser
estudada e compreendida em termos dos seus próprios significados e valores, e
que nenhuma crença ou prática cultural pode ser entendida separada do seu
sistema ou contexto cultural. O comportamento numa cultura particular não deve
ser julgado com os padrões de outra. O relativismo cultural não só é uma teoria
antropológica como uma atitude, um olhar e uma prática antropológica, e também
uma forma de lidar com os outros em respeito pela diversidade. Esta atitude
implica que os nossos preconceitos não distorçam o conhecimento de outras
culturas, mas também uma atitude de diálogo aberto.
Podemos entender o relativismo cultural
de duas maneiras, uma como algo aberto e que defende a equivalência entre
culturas seguindo uma tolerância pela pluralidade das sociedades humanas; outra
como algo fechado e que defende a singularidade intransponível das culturas
(Gandra, in Cuche, 1999: 13).
No Ocidente
consideramos o infanticídio um crime, mas na cultura chinesa tradicional as
bebés eram às vezes estranguladas porque consideravam-se uma carga para a
família. Os judeus não comem porco, os hindus não comem vaca. Em Ocidente
beijar-se em público pode ser considerado algo normal mas noutras culturas é
desconhecido ou pensado como desagradável.
Tem limites o relativismo cultural? A
Alemanha nazi deve ser valorada igual de neutro que a Grécia clássica? Desde o
ponto de vista do relativismo cultural estremo sim, porque defende que não há uma
moralidade superior, internacional ou universal, que as regras éticas e morais
de todas as culturas merecem igual respeito. Esta perspectiva pode levar a um
niilismo.
Porém, desde o ponto de vista desde o
relativismo cultural ético há e deve haver limites válidos para toda a
humanidade. Não podemos tolerar todo, pois a tolerância sem limites equivale à
supressão de toda regulamentação do comportamento humano. Não toda diversidade
cultural significa enriquecimento moral para a humanidade e algumas vezes a sua
idolatria pode servir para discriminar os outros (Garzón Valdés, 1997).
Como deveria utilizar o antropólogo o
relativismo cultural? Um uso dogmático e absoluto do relativismo cultural pode
levar a entender os outros como entidades absolutamente diferentes,
intraduzíveis e sem os mesmos direitos que nós. O antropólogo deve apresentar
informes e interpretações dos fenómenos culturais, para entender estes na sua
complexidade, porém o antropólogo não tem que aprovar costumes como o
infanticídio, o canibalismo e a tortura. Exigem portanto uma condena moral e
uns valores internacionais e humanos de justiça e moralidade que nos fazem mais
humanos.
O relativismo cultural mais estremo
equivale à eliminação de toda regulamentação do comportamento humano e pode
cair no risco de justificar e/ou permitir a violência. Declarações de princípios como a dos direitos
humanos (http://www.unhchr.ch/udhr/lang/por.htm)
podem servir como orientação e guia, ainda que com compreensão das moralidades e as
suas diversidades. O antigo questionamento e até rejeição antropológica deles
pelo seu privilégio dos direitos individuais sobre os direitos culturais dos
grupos, tornou-se hoje em apoio explícito ao seu reconhecimento alargando estes
ao meio ambiente, a emancipação das mulheres e outros.
E face às críticas do
relativismo (subjectivismo, niilismo, incoerência, maquiavelismo, cegueira
estética, inexistência de universalismos), o antropólogo Clifford Geertz (1984)
escreve um texto intitulado “anti-antirelativismo”, no que critica o medo do
relativismo cultural. Sem pretender defender o relativismo, sim que combate os
seus críticos por não entender bem o esforço antropológico pela compreensão da
diversidade cultural. Segundo Geertz esta noção não irá desaparecer a menos que
desapareça a antropologia.
Em síntese, de um relativismo clássico
mais extremo que predicava a tolerância como relativismo cultural (ex. a
perspectiva de Herskovits) contra o racismo, passamos a partir da década de 1970 a defender um estatuto
transcultural de racionalidade que colocava limites à tolerância e os direitos
humanos mais alargados (Brown, 2008).
2.7. A MUDANÇA CULTURAL
A mudança cultural é o aspecto dinâmico da cultura, o “panta
rei” (todo se move, todo muda) dos gregos. É inquestionável que nenhuma cultura
é totalmente estática e de que a cultura construi-se através de processos
sociais.
As culturas
podem intercambiar traços mediante o empréstimo ou a difusão. A difusão é um mecanismo de câmbio cultural acontecido
durante toda a história da humanidade, porque as culturas nunca estiveram
isoladas. Os contactos culturais sempre existiram. Ex.: o vidro das janelas
ocidentais foi inventado pelos egípcios, a porcelana procede da China, a tortilha
espanhola é feita com batata procedente de América, o tabaco é fruto do
contacto europeu com as culturas pré-colombinas da América Latina.
A aculturação é outro mecanismo de
mudança que consiste no contacto e intercâmbio entre duas ou mais culturas. O
conceito foi criado em 1880 pelo antropólogo norte-americano J. W. Powell (in
Cuche, 1999: 92) para designar a transformação dos modos de viver e pensar dos
imigrantes nos EUA. Um exemplo são os pidgins (mistura de inglês com línguas
nativas de diversas zonas do mundo). Este contacto intercultural pode provocar
três efeitos (Panoff e Perrin, 1973):
a) Assimilação da cultura dominada pela
dominante. É um processo de desculturação ou perca a través do
qual um grupo culturalmente dominado incorpora-se a uma cultura dominante.
b) Integração ou combinação de culturas, tendo como resultado novas culturas
num certo plano de equidade.
c) Subculturas ou coexistência de culturas dominantes com dominadas.
A invenção
independente é um modo criativo de resolver problemas culturais. Ex.: A
invenção independente da agricultura no México e no Oriente Meio.
A globalização é outro motivo de mudança,
pois vincula a pessoas de todas as partes do mundo através dos meios de
comunicação:
“A
globalização está na boca de todos; a
palavra da moda transforma-se rapidamente num fetiche, um conjuro mágico, uma
chave com o destino de abrir as portas a todos os mistérios presentes e
futuros. Alguns consideram que a “globalização” é indispensável para a
felicidade; outros que é causa de infelicidade. Todos entendem que é o destino
irredutível do mundo, um processo irreversível que afecta da mesma forma e
igual medida à totalidade das pessoas” (Bauman, 1999:7)
A
globalização pode parecer um fenómeno novo, mas, para alguns teóricos, como
Wallerstein (1974) ou Ortiz (1998), a sua origem não é recente. De acordo com
Wallerstein (1974), a “economia-mundo” forjou-se no final da Idade Média e
definiu centros, semi-periferiais e periferias. Este é, portanto, um fenómeno
histórico, que atinge alguns períodos de auge no século XIX, de intensa
globalização e face a qual se produziram reacções de localização (ex.:
nacionalismos), ou seja, forças centrífugas que se confrontam com forças
sociais centrípetas. Neste sentido, o trabalho do antropólogo Jonathan Friedman
(1994) demonstra como a homogeneização é inerente ao processo de globalização,
mas também a fragmentação, a segmentação, a diversidade cultural e a
reorganização das identidades locais como reacção face ao processo de
globalização. Para Friedman (1994), a globalização representa uma fase mais da
dinâmica do sistema capitalista.
Desde
outra perspectiva, a globalização
é, na actualidade, um processo complexo que provoca mudanças socioculturais,
pois vincula pessoas de todas as partes do mundo, através dos meios de
comunicação, do turismo, do comércio, da Internet e dos fluxos. A globalização intensifica interrelações e
interdependências entre os grupos humanos, comprimindo o espaço e o tempo. O
teórico Ulrich Beck (1988) distingue dois aspectos deste processo: a) o
globalismo, que define como a ideologia que
tenta substituir a Política pelo domínio do Mercado e que significa combater a
diversidade cultural e criar uma homogeneização cultural (algo que, segundo o
autor, não é desejável para este autor); b) a globalidade, que significa mais
intercâmbios culturais, mestizagem cultural e trabalhar por um mundo mais justo
e solidário. Sintetizamos esta diferença na tabela a seguir:
GLOBALISMO
|
GLOBALIDADE
|
GLOBALIZAÇÃO
|
É a ideologia que tenta
substituir a política pelo mercado. Significa ir contra a diversidade
cultural e também a homogeneização das culturas. Não desejável.
|
Não há nenhum país, povo,
localidade, etc. que possa viver isolado dos demais. Significa mais
intercâmbios culturais, mestiçagem cultural e trabalhar por um mundo mais
justo e solidário.
|
Processos de inter-relação e
interdependência entre as nações.
|
Na linha do conceito de
globalidade de Beck, o antropólogo Arjur Appadurai (2007: 9) fala da
globalização das bases, isto é, da globalização desde abaixo protagonizada por
movimentos sociais e organizações não governamentais de activistas a prol dos
direitos humanos, o feminismo, a luta contra a pobreza, o meio ambiente e a
saúde. Appadurai (2007: 10) propõe colocar a globalização ao serviço dos mais
necessitados e dos pobres, tendo ele esperança na globalização e na
globalização da esperança.
No seguimento desta linha, o
antropólogo Isidoro Moreno (2005) diferencia entre mundialização e globalização. O primeiro conceito define
como os seres humanos se encontram mais próximos, em espaço e tempo, mas também
como se cria a interculturalidade e se estabelecem os diálogos entre culturas.
O segundo define a extensão de uma lógica única e absoluta que encerra diversos
fundamentalismos: a) a religião, entendida como verdade única revelada que deve
expandir-se a toda a humanidade; b) o estado-nação, como única forma de
organização sociopolítica desejavel; c) o socialismo, como única alternativa ao
capitalismo liberal; d) o mercado, com base na racionalidade capitalista e
apresentado como absoluto sacral.
A globalização não tem os mesmos
efeitos sobre diferentes contextos culturais, daí que não possamos pensá-la
como uma força exclusivamente vertical e linear. Boaventura de Sousa Santos
(1997) diferenciou quatro elementos fundamentais nos processos de globalização: a) o localismo globalizado, isto é, a
globalização com sucesso de um fenómeno local; b) o globalismo localizado,
quando se produzem práticas transnacionais com sucesso em condições e contextos
locais; c) o cosmopolitismo, quando se cria uma organização transnacional na
defesa de interesses comuns; d) o património comum da humanidade, que
responsabiliza todos os seres humanos pela tutela de determinados bens.
Desde esta perspectiva das relações
local-global, o conceito antropológico de cultura recebe um novo repto. Hoje, o
local intensifica a sua interconexão com o global, a partir do marco do
Mercado, do Estado, dos movimentos e das formas de vida, e de ai que possamos
falar em transnacionalismo (Hannerz, 1998). O antropólogo Arjun Appadurai
sublinha a importância do estudo dos fluxos de pessoas, informação, produtos e
capital –ethnoscapes, technoscapes, finanscapes, mediascapes,
ideoscapes- (Appadurai, 1990; 2004).
Robert Robertson (1995) pensa a globalização como um tipo de difusão cultural e
chega a falar em “glocal”, isto é, a síntese relacional entre o local e o
global. Esta forma de caracterizar a noção de cultura conduz alguns
antropólogos a estudar as dinâmicas de viagem e de movimento e não apenas as de
residência e localidade, as rotas e não só as raízes, os processos de produção
do global e não só os de produção do local, daí que se sublinhem as “zonas de
contacto” (Clifford, 1999). Outros falam em culturas híbridas (García Canclini,
1989), interligando assim estrutura e processo, mas salientando também o papel
dos agentes sociais nas dinâmicas entre estrutura e acção.
De
facto, a globalização é um processo que
se associa à uniformização cultural, assimetrias, imperialismos, desigualdades
e desconexões, mas isso não significa que estas sejam sempre as suas
consequências, nem que estas sejam as mesmas em todos os contextos. Face à
globalização produziu-se também uma emergência do que Manuel Castells (2000:
30) denomina identidades de resistência (ex.: movimentos sociais
anti-globalização, ambientalistas, etc.) e identidades projecto (ex.:
regionalismos, nacionalismos, etc...). Estas identidades estão protagonizadas
por actores sociais que, em muitos casos, lutam em prol da diversidade cultural
e da interculturalidade, do respeito pelo meio ambiente e do combate à pobreza
e extrema desigualdade social. Assim vista, a globalização converte-se num
desafio planetário e numa oportunidade para resolver problemas globais. O global
nem sempre substitui o local e o modo neoliberal de globalização não é o
único possível.
Na
mesma linha, Renato Ortiz (1998: XXII-XXIV) afirma que a globalização da
economia não significa homogeneização da cultura e da conduta humana, pelo
contrário, produz-se um renascimento das reivindicações locais, o mundo também
se fragmenta em mosaicos e particularismos. Particularismos e globalização não
são dicotómicos, pois diversidade e semelhança caminham juntos.
Um
aspecto importante da mudança cultural é a mestizagem, os sincretismos e
hibridismos. Estes podem produzir-se entre diferentes partes, mas também entre
o velho e o novo, entre o actual, o de antes e o de antigamente.
Para entender melhor estes processos de contacto e
mudança cultural é preciso ter em conta vários níveis da cultura:
|
|||
Na cultura
internacional as tradições culturais estendem-se mais além dos limites
nacionais. Nas culturas nacionais os seus traços são partilhados pelos
nacionais e nas subculturas os padrões culturais estão associados a subgrupos
específicos dentro de uma sociedade.
2.8. A MUDANÇA SOCIAL
“Quando vos digam
que é impossível mudar nada, perguntar-vos quem o diz e por quê o diz” (Ulrich
Beck, La Voz de
Galicia, 1-04-2006, p. 2, Culturas).
A preocupação
pela mudança sociocultural é muito antiga. Já na Grécia clássica face à ideia
de Parménides, quem afirmava que o mundo é estático e organizado, Heráclito
defendeu a ideia de que o mundo está em permanente mudança, que todo flui e
nada fica. A partir do século XIX, esta preocupação pela mudança social
acentua-se nas ciências sociais. Depois de ter vivido uma época de revoluções,
os cientistas tentaram explicar as mudanças e as suas leis racionais dentro da
nova organização da sociedade. Uma parte dos teóricos sublinharam os aspectos
estáticos (ex. Comte, Durkheim), e outros os seus aspectos dinâmicos, os
conflitos e as transformações (ex. Marx).
Qual o
peso da estrutura e qual o da acção social na mudança?
Comte respondeu a
esta pergunta com a distinção entre “estática” e “dinâmica”, o que se relaciona
com a diferença entre mudanças graduais e a de mudanças radicais.
Radcliffe-Brown
(1957) distinguiu entre “desajustes” (mudanças que não modificam a estrutura
social) e “mudanças de tipo” (que mudam de uma estrutura a outra).
As teorias sociológicas clássicas defendem a crença
da evolução para uma sociedade humana melhor, por meio da sucessão de etapas,
em termos de progresso pensado como necessário, natural e numa única direcção.
Ex.: A passagem da solidariedade mecânica à orgânica defendida por Durkheim.
Isto foi posto em causa logo da segunda guerra mundial, contexto no qual se
questionou que o progresso tecnológico não fosse acompanhado de um maior
humanismo e fraternidade entre as culturas e povos do planeta, que fomentasse
uma cultura de paz.
Sobre este problema da
mudança social, o materialismo histórico
descreve a evolução social como uma sucessão de modos de produção: produção
primitiva, escravatura, feudalismo e capitalismo. Cada modo de produção
corresponderia a um grau de desenvolvimento. Quando as relações de produção já
não são válidas para o crescimento das forças produtivas, acontece um período
de conflito social crescente que acaba numa revolução social e no nascimento de
um novo modo de produção e umas novas relações de produção. Assim a revolução
burguesa produziu-se quando as relações de produção feudais converteram-se num
obstáculo para a expansão económica, abrindo passo ao capitalismo. A fase mais avançada da evolução social seria
o comunismo, na qual o máximo desenvolvimento das forças produtivas permitiria
uma abundância material e o dar a cada pessoa de acordo com as suas
necessidades. Nessa fase comunista, as relações de produção seriam igualitárias
e não existiria propriedade privada dos meios de produção. As relações de
produção expressam-se na realidade social como lutas de classes (ex.:
camponeses e senhores feudais, proletários e capitalistas). A mudança social,
política e cultural é explicada pela mudança do sistema produtivo.
Uma crítica que se lhe pode fazer à interpretação
marxista da mudança social é que o marxismo não considerou a existência de
limites ecológicos à expansão material da civilização, portanto não pensou
seriamente nos limites ao intercâmbio entre a cultura e a natureza.
Noutra
linha algo diferente, a sociologia
compreensiva de Max Weber (1969)
analisa a realidade social por meio da construção de tipos ideais (aqueles que
descrevem como teria acontecido uma acção se os meios utilizados fossem
racionais para alcançar o fim proposto). Weber argumentou a influência central
dos valores religiosos, em especial os da ética protestante de inspiração
calvinista, para o desenvolvimento e a evolução do capitalismo em Europa. A mudança social
é para Weber resultado de duas coisas:
1)
O
progressivo desenvolvimento de uma nova estrutura social, a partir do
esgotamento das formas de dominação e da sua legitimidade carismática,
procedendo à substituição por umas novas formas de dominação e legitimidade.
2)
O crescente
processo de racionalização do sistema de crenças da cultura ocidental (ex.: a
passagem da magia para a ciência).
Contributos de Weber foram as seguintes ideias:
1.
Face
aos factores estruturais, especialmente de base económica no materialismo
histórico, Weber introduz os factores socioculturais no centro mesmo dos
processos de mudança sociocultural, demonstrando a importância dos valores
religiosos como factores da origem do capitalismo. Por que o capitalismo
originou-se em Europa e não em China (mais tecnologia que em Europa)? Pela
atitude face a riqueza (poupança do puritanismo calvinista).
2.
Os
factores económicos, políticos ou culturais não exercem uma acção exclusiva,
porém operam interligadamente nas transformações sociais.
3.
A
importância relativa dos factores da mudança variam de acordo com as
circunstâncias históricas.
Uma outra visão é a do estrutural-funcionalismo, que tem como
antecedente fundamental, Émile Durkheim, quem estava muito preocupado como o
equilíbrio e a estabilidade da estrutura social. Para Durkheim, a causa da
mudança sociocultural na época moderna era a divisão do trabalho. Para o
estructural-funcionalismo de W.E. Moore (1974) e S.N. Eisenstadt (1972), a
mudança é produto da modernização, é dizer, da passagem de uma sociedade tradicional
para uma moderna. A modernização é para eles um processo de passagem de um
estado a outro, de uma forma de organização social tradicional para uma forma
de organização social moderna (família nuclear, poucos filhos por família,
autoridade política legalista, mobilidade vertical alta, ...). O modelo
define-se como linear, e portanto, pretende homogeneizar de acordo com um único
modelo de modernidade.
CARACTERÍSTICAS DA MODERNIDADE
|
|
1)
|
Desenvolvimento
das comunicações.
|
2)
|
Hedonismo,
consumismo, secularização, individualismo.
|
3)
|
Preponderância
dos grupos associativos (escola, sindicato, partido, etc. ) face aos
comunitários.
|
4)
|
Autoridade
legalista e racionalidade burocrática. Consolidação do Estado.
|
5)
|
Industrialização
e urbanização.
|
6)
|
Institucionalização
do conflito e das mudanças na estrutura.
|
Críticas ao estrutural-funcionalismo seriam:
1. A
dificuldade para aplicar todos os atributos da modernidade e o seu
etnocentrismo (traços próprios da sociedade europeia e norte-americana).
2. A
arbitrariedade das classificações: tradicional, em transição, moderno.
Classificações sem teorias interpretativas ou explicativas.
3. A
dificuldade de escolher factores determinantes da mudança.
4. A
impossibilidade de estender por todo o mundo os modelos de consumo ocidental,
em relação com as desigualdades, a pobreza, a limitação dos recursos naturais,
etc.
A mudança social
também está interligada com a permanência e a sua importância para a
sobrevivência e adaptação humanas. Na sua relação com a permanência a mudança
pode ser de três tipos (Gondar, 1981):
1. Substituições.
Quando os objectivos que se tratam de satisfazer e a forma permanecem
inalterados. Ex.: Substituir o carro usado. Construir uma casa nova. Este tipo
de mudanças motiva poucos problemas, mudam o conteúdo ou as formas, mas as
categorias onde repousa o sentido não mudam drasticamente.
2.
Crescimento. O funcionário que sobe no quadro, o
camponês que incrementa o capital com uma aliança matrimonial ou uma boa venda,
etc. Aqui a situação não é especialmente desequilibradora, pois o crescimento é
quantitativo e amplia as estratégias a utilizar.
3.
Ruptura com o anterior. A mulher à qual lhe morre o esposo
(derrubamento do apoio económico, do apoio na educação dos filhos, das
anteriores relações com vizinhos, amigos e parentes). O emigrante que migra a
outro país muito diferente do seu (novo sistema normativo, simbólico e de
comportamento). Se nos dois tipos anteriores as pessoas podem perfeitamente
valer-se em tais situações, neste último caso o comportamento é totalmente
diferente: incompreensão, desconcerto, agressividade, etc. Estas mudanças
costumam ser problemáticas e nalguns casos traumáticas.
Nalguns casos as mudanças
sociais producen-se de forma muito rápida, pelo que as pessoas e os grupos humanos
reagem de diferentes formas. No caso da Galiza, estudado pelo antropólogo
Marcial Gondar (1981), este afirma que quando se produz o “boom” da emigração
nos anos 1960 transformam-se os valores, as pautas sociais e as formas de vida
(tanto as dos camponeses que permanecem como as dos que emigram). Relacionando
cultura e personalidade, as formas de reagir face a essa situação podem
resumir-se em quatro tipos:
1.
Afogados:
A esta categoria pertencem todos os que não compreendem a nova situação - a
maioria velhos -. São pessoas que dizem: "Este mundo não há quem o
entenda!". "Tudo anda do revés". "Não sei onde imos
parar". A consequência estrema desta situação é o suicídio. A Galiza ocupa
uma das mais altas taxas de suicídio em Espanha.
2.
Avestruzes:
São gente quase sempre velha, geralmente com muito carácter, que se resiste a
aceitar a mais mínima mudança que altere o modelo "tradicional"
(tendente a permanecer) no qual foram socializados. Ex.: O pai que se opunha à
compra de um tractor pelo filho (mecanização), argumentando que nem os seus
pais nem os seus avôs necessitaram de tal coisa e que "nunca faltaram
batatas nem milho". É como na cena de Dom Quixote lutando contra os
moinhos de vento pensando que eram gigantes. É ir contra a potência da sociedade
tecnológica moderna.
3.
Novos
ricos: Aqueles, geralmente novos, que quando se confrontam com modelos
urbanos de comportamento fazem um esforço por apagar ao máximo as suas origens
(os velhos esquemas camponeses nos quais foram socializados), interiorizando os
novos esquemas urbanos o mais apresa possível. Ex.: Galegos urbanizados que
falam castelhano com “gheada” e sotaque rural. Neste último caso a divisão está
dentro do próprio sujeito. As pautas nas quais um indivíduo foi educado desde a
sua infância é algo que não pode ser apagado da noite para o dia como se fosse
um quadro escrito. A tensão que vive o novo rico passa por tentar
constantemente apagar as formas da sua socialização primeira, que eles
consideram de inferior categoria. Mas a tensão radica em que não conseguem
apagar essas formas primeiras, e só podem ocultar as mesmas. Isto provoca um
comportamento traumático de uma pessoa que é alienígena de si próprio e que se
reconhece como tal.
4.
Camaleões.
São os que afirmam coisas do tipo "Alemanha è boa para ganhar dinheiro,
mas não é boa para levar aos filhos". Desdobra assim o emigrante os
aspectos económicos, considerados positivos, dos aspectos sociais e afectivos,
considerados como negativos. Os cemitérios galegos das aldeias estão cheios de
panteões que medram ao mesmo tempo que se abandonam as aldeias. Esto é
densamente significativo do sistema de valores em jogo. É uma "cultura
para a morte", o panteão é símbolo resumo do mundo no qual o emigrante foi
socializado de criança. O panteão é símbolo da "casa", não do
indivíduo, é por isso que no mundo rural a pergunta chave é: de que casa es?, e
não qual é o teu nome? ou como te chamas? Na actualidade a pergunta que se faz
aponta ao futuro: que queres ser quando sejas grande? À hora de fazer fronte à mudança,
estes emigrantes camaleões praticam uma integração entre passado e presente, a
diferença dos outros tipos, não esgaçam o passado e o presente. Aceitam o
presente sem esquecer o significado do passado. A identidade mantém-se desta
maneira mais saudável socialmente.
No meu ponto de vista, a estes
quatro tipos haveria que acrescentar o dos “bravú”, que são aqueles, fundamentalmente jovens, que estão
orgulhosos das suas origens rurais e das suas práticas culturais actuais,
qualificadas como rurbanas. Podem viver na aldeia, ainda que não propriamente
da agricultura, e sentem-se identificados com determinados elementos da
tradição (passado que tende a permanecer) que revitalizam com força (ex.:
língua, música, etc.). O nível de integração entre o passado e o presente
procura uma interpretação do sentido e da racionalidade que tem um mundo em
processo de mudança, são conscientes dos sentidos e das potencialidades dos
elementos da sua cultura de origem. Compreendem a importância do local e os
seus valores, junto com a interligação com um mundo global, face o qual matizam
novos sentidos e novos estilos de vida, resistindo-se à uniformização cultural
e à hegemonia de certos valores dominantes.
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