a aprendizagem do desenvolvimento da psique


INTRODUÇÃO

A psicologia educacional é uma sub-área de conhecimento, que tem como vocação a produção de saberes relativos aos fenómenos psicológicos constituinte do processo educativo. No período pré-escolar o desenvolvimento da criança é marcado  pela satisfação de atender suas necessidades vitais, e não de obter os resultados da atividade, ela pode desempenhar várias ações prazerosas, mas difere do resultado objetivo da atividade, se interessa apenas pelos meios (ações) que é a brincadeira. É na fase pré-escolar que a brincadeira é um processo secundário e é nesse período que brincadeira e atividade adquirem significados diferentes e invertem posições. E o brinquedo passa a ser o tipo principal de atividade. De fato esta posição lhe é conferida porque a criança vive cercada por objetos com os quais interage e os adultos fazem uso, embora sua limitação física lhe impossibilite de operá-los e a sua consciência das coisas são apresentadas em ação concreta.





O DESENVOLVIMENTO COGNITIVO E IMPLICAÇÕES QUE GERAM PROBLEMAS DE ATRASO MENTAL

Leontiev trata o problema de desenvolvimento mental atrasado em crianças que se mostraram incapazes de aprender adequadamente, em tempo preestabelecido e em condições consideradas “normais”. Ainda que não sejam diferentes de seus contemporâneos. 
Quando as crianças são colocadas em condições apropriadas e com uso de métodos especiais de ensino, apresentam progressos significativos, superando, assim, o seu próprio atraso. No entanto, sua atenção se volta para aquelas que permanecem com o quadro de desenvolvimento atrasado, lançando o seguinte questionamento: estas crianças têm de ser verdadeiramente postas à margem, ou seu destino está determinado pela ação de condições que poderiam ser mudadas, em circunstâncias que poderiam ser eliminadas para lhes permitir um desenvolvimento?
Responde a este questionamento a partir  do uso, por profissionais, dos testes psicológicos utilizados para diagnosticar as crianças dotadas de habilidades. Esses métodos rígidos excluem a maioria por não corresponder com os números padrões de classificação, seja por causa de problemas orgânicos ou de atraso no desenvolvimento mental, sedo que o segundo está ligado a fatores endógenos e biológicos; exógenos e ambientais, e por este motivo os testes para medir o ‘coeficiente de inteligência’ não são confiáveis, tendo em vista que não apontam as causas do atraso e nem como superar as deficiências intelectuais.
Leontiev (2005) destaca que o desenvolvimento da criança é resultado de assimilação ou apropriação da experiência acumulada pelo homem no decurso da história social, processo este completamente diferente do gênero animal. Neste, o seu comportamento é regulado por dois tipos de experiências, que são a filogênese (hereditariedade) e experiência individual, onde uma está ligada à outra, sendo que a filogênese possibilita a formação de comportamentos para realizar a experiência individual e esta permite a adaptação do animal para as mudanças no ambiente, mas a evolução apresentada só passará a fazer parte da filogênese lentamente. Assim, o desenvolvimento ontogenético é resultado desses processos que são dependentes.
O ser humano apresenta outro tipo de experiência, a histórico-social. No entanto suas experiências não ocorrem independentes da base herdada. Devido a experiência histórico-social, o ser humano desenvolveu características mentais superiores que mudam rapidamente em conseqüência das exigências do convívio social, mas, estas dependem dos diferentes modos de relações que estabeleceu com os saberes, como a apropriação ou a não-apropriação dos saberes.
Com isto, seu progresso histórico é transmitido de uma geração a outra, através da experiência filogenética (histórico-social), isto porque sua atividade principal é o trabalho.
Leontiev (2005) diz que o desenvolvimento filogenético dos animais ocorre “pela consolidação das mudanças na sua organização biológica”, no caso do ser humano o seu desenvolvimento histórico se consolida pelos “objetos materiais e em fenômenos ideais”. Desse modo, o desenvolvimento humano se dá pelos processos de assimilação ou apropriação do desenvolvimento evolutivo de gerações anteriores.
Defende que a criança não se adapta ao  mundo dos objetos e aos fenômenos que a rodeia, mas o faz seu, apropria-se dele, pois o seu desenvolvimento mental se dá em um mundo humanizado que tem como objetivo reproduzir no indivíduo qualidades, capacidades e características comportamentais. No contato  com estas capacidades se formam funções que surgem durante a ontogênese, sendo que a linguagem possibilita a formação destas capacidades, e, por outro lado, as características biológicas possibilitam as condições necessárias para a formação das funções.
Ressalta que para “se apropriar” dos objetos ou fenômenos é necessário executar uma atividade adequada ao conteúdo no objeto ou no fenômeno dado, mas as ações e operações estão relacionadas com o objeto. No entanto a criança não percebe as ações combinadas, mas as assimila quanto atinge o objetivo da atividade. As experiências da criança neste primeiro princípio são fixadas e não se  transmite pela hereditariedade e se desenvolvem por meio das relações práticas e verbais que existe entre elas e as pessoas que a rodeiam na atividade comum. Para Leontiev (2005, p. 68) o segundo princípio está pautado sobre o “desenvolvimento das ‘aptidões’ como processo de formação de sistemas cerebrais funcionais”, que para ele, os processos mentais superiores, quando formados, formam também órgãos cerebrais específicos para o seu funcionamento que, conseqüentemente, dão origem a novas formações. Esses órgãos funcionais apresentam três características específicas. A primeira funciona como órgão individual, a segunda tem longa duração e a terceira é a compensação. O seu processo de formação origina-se na formação de conexões  condicionadas pelos meios externo e interno, ações produzidas pelos efeitos motores dos reflexos ligados entre si.
Quando os componentes motores externos são separados as ações tornam-se cerebrais internas e quando evocadas tornam-se automáticas. Esta separação permite a inibição dos traços intermediários, em outras situações são evocados e dependendo dos estímulos tornam-se novamente eficazes. Portanto, Leontiev (2005, p.71-72) afirma que
[...] a criança não nasce com órgãos para cumprir funções que representam o produto do desenvolvimento histórico do homem; estes órgãos desenvolvem-se durante a vida da criança, derivam da sua apropriação da experiência histórica. Os órgãos destas funções são os sistemas funcionais cerebrais (órgãos fisiologicamente móveis do cérebro [...]), formados com o processo efetivo de apropriação.
Os órgãos funcionais não são produzidos  da mesma maneira em todas as crianças e tampouco em circunstâncias determinadas que seguem o processo de desenvolvimento, em algumas se formam em condições inapropriadas e em outras não se formam. Compreendendo que esse processo é possível de reorganizar e até formar sistemas motores e funcionais que permitam o desenvolvimento da criança, bem como ao que se refere à linguagem.
O terceiro princípio destacado está relacionado com a aprendizagem da linguagem para o desenvolvimento mental, pois a linguagem é um dos meios utilizados para consolidar a experiência histórico-social.
A criança já nasce rodeada por definições e conceitos, ao adquirir a linguagem sente a necessidade de aprender as noções conceituais, mas para isto tem que se desenvolver nela processos cognoscitivos. Leontiev (2005), esclarece que os processos de pensamentos da criança se dão pela assimilação da experiência generalizada do adulto, que apesar de estabelecer associações não significa que  perceba a correspondência com  conceitos científicos. Para aprender conceitos é necessário que a criança desenvolva ações adequadas, sendo essas ações primeiramente externas por se darem com a orientação do adulto e depois com ações internas.
A transformação ocorre quando as ações são  verbalizadas pela linguagem, indicando assim sua apropriação conceitual. Só então passa para o plano  mental e com características únicas internas do pensamento e é nesta etapa que o adulto pode interferir. Cabe ressaltar que este processo não é linear.
Para o ensino é necessário reorganizar as ações nos momentos apropriados para que o seu desenvolvimento transcorra normal, caso contrário a criança pode receber um diagnóstico de atraso intelectual. Conclui afirmando que os testes de inteligência são inadequados para avaliar a potencialidade intelectual, quando existe apenas um problema originado pela falta de reorganização de operações que gera um leve atraso e que pode ser superado pela criança com ajuda dentro das condições sociais em que vive e com assistência educativa que a estimule, tendo como ponto chave, a mudança da atividade principal como condição para a aprendizagem significativa.

A FORMAÇÃO DA PSIQUE INFANTIL A PARTIR DAS APROPRIAÇÕES SÓCIO-HISTÓRICAS DA CULTURA HUMANA

Uma contribuição à teoria do desenvolvimento da psique infantil” Leontiev (2001), descreve os estágios reais que a criança passa durante o seu desenvolvimento e que determinam o caráter psicológico da sua personalidade. Considerando que todo o ambiente em que ela se encontra sofre sua influência e se altera.
Afirma que na infância pré-escolar a criança toma contato com o mundo mais amplo, o assimila como ele é apresentado a ela, suas  ações são reproduções dos atos dos adultos com quem convive, isto porque as crianças entendem  que suas necessidades são supridas por eles.
Isto explica comportamentos determinados pelas relações pessoais que as motivam em seus acertos e as desencorajam em seus erros. Nesta fase se percebe a existência de dois mundos determinados pelas relações que compartilham com as pessoas que fazem parte de suas vidas.
De um lado está o grupo menor composto por seus familiares, é neste que suas atitudes comportamentais são influenciadas, e no maior estão aqueles com quem tem uma relação mediada pelas pessoas do primeiro grupo.
Embora exista esta distinção de relação de grupo para a criança, o que se sabe é que ela continua tendo a mesma compreensão de dependência do adulto mesmo que esteja com crianças de sua idade, ela necessita do adulto para mediar o seu relacionamento com os colegas, esses traços permanecem até aos seis anos ou quando é dada a ela uma função para desempenhar, a exemplo o papel de auxiliar sua mãe, sendo esclarecida a sua responsabilidade em determinada tarefa. Nesse caso, o seu caráter psíquico é reorganizado para dar um novo significado a sua atividade.
Normalmente a reorganização psíquica se dá com a entrada da criança na escola, quando compreende que seus deveres e obrigações  para com os seus pais e professores se expandem para a sociedade. Agora, de modo real, a partir das exigências que recebe das pessoas que convive, passa a dar importância que as pessoas dão quando ela tem de realizar um trabalho, onde o ambiente é modificado para favorecer o seu êxito. Com isto suas relações íntimas vão sendo determinadas pelas relações do círculo maior.
Além disso, quando obtém uma nota insatisfatória dada pela professora, a criança projeta um significado de rejeição tanto para a professora quanto para a nota, e isto marca as futuras relações e comportamentos à medida que o círculo se amplia, e por mais que se esforce e obtenha a nota máxima, esta não apagará o significado atribuído à nota anterior.
O novo estágio do desenvolvimento da consciência acontece na adolescência, quando ocorre a inclusão de formas de vida social diferentes das que participava quando criança, visto que já possui uma estrutura física, conhecimentos e habilidades que lhe permite assumir responsabilidades e ações próprias de adultos.
Para Leontiev (2001, p. 62) a marca deste estágio se dá por
[...] um crescimento de uma atividade crítica em face das exigências do comportamento e das qualidades pessoais dos adultos e pelos nascimentos de novos interesses que são pela primeira vez, verdadeiramente teóricos.
Esses novos interesses que surgem em cada estágio do desenvolvimento da psique, geram atividades externas e internas que contribuem para a passagem de um estágio para outro, no entanto o que permite o seu desenvolvimento são as condições reais de vida que a criança leva.
Neste sentido ressalta-se, a importância de se analisar o desenvolvimento da atividade da criança, a fim de elucidar o processo de construção na sua consciência, a partir disto é possível compreender o papel da educação, que deverá operar na reação da criança frente à realidade, sendo que esta reação que determina  a formação estrutural de sua psique e de sua consciência.
Diante disso, afirma que um tipo de atividade não ocorre em um único estágio, pois certas atividades são fundamentais no desenvolvimento psíquico da criança e outras servem de base para uma atividade geral. Assim a mudança de estágio está agregada a uma atividade que domina a relação da criança com a realidade.
Leontiev (2001) define que esta atividade principal apresenta três características observáveis. São elas:
Primeira é a atividade cujo papel desenvolvido tem sentido diferenciado da realidade, a criança projeta nos brinquedos as relações  e os comportamentos estabelecidos na sua convivência com os adultos. Esta atividade caracteriza-se na infância pré-escolar, em que aprende brincando.
A segunda atividade tem a predominância da reorganização dos processos psíquicos, onde a atividade principal é a que vai possibilitar a distinção do brincar com o dever. A atividade principal não está no brinquedo em si, mas na atividade que realiza. Neste estágio suas ações não são reproduções daqueles que a cercam.
A terceira atividade principal depende da força pessoal interna, a reestruturação vem com as mudanças psicológicas  da personalidade infantil. Neste estágio, durante um período determinado ela procura desempenhar ações que foram assimiladas nas funções sociais que projetava nos brinquedos.
Entende-se assim, que os estágios do desenvolvimento da psique infantil apresentam conteúdos mudáveis de acordo com a realidade vivida por cada criança, que ocorrem em uma seqüência para que se processem durante o seu desenvolvimento.
A auto-afirmação da criança na transição de  estágios provoca crises, isto se deve a maturações que surgem na sua psique. Leontiev (2004), ressalta que os momentos críticos são possíveis de serem controlados na mudança de atividade principal.
Leontiev (2001) assinala que as mudanças  indicadoras do desenvolvimento psíquico infantil apresentam características peculiares fundamentais para a compreensão das mudanças, no caráter psicológico da ação. A primeira característica consiste em perceber o objetivo da ação em relação ao motivo da atividade da qual faz parte. É necessário porque o propósito de um ato, dependendo da motivação, passa a ser percebido de modo diferente pela criança. Portanto, suas ações apresentam caráter psicológico diferente. Para melhor compreensão ele exemplifica dizendo que uma criança, ao resolver o problema da lição de casa, tem consciência do propósito desta tarefa, que é responder. Embora a motivação e a interpretação dada à ação sejam diferentes para seus pais, professores e ela própria.
As próximas características de mudança são aquelas ocorridas no campo das operações. Tal processo consiste no modo utilizado para executar a ação e atingir o objetivo da atividade. Isto é, existem meios diferentes para se executar uma ação, e será preciso criar condições que requerem modos seqüenciados de ação. É o que Leontiev (2001), chama de operações conscientes. Conforme seus experimentos, as operações convertem-se em ações dirigidas para se atingir um alvo, a cada avanço os procedimentos são realizados obedecendo uma ação dependente e seqüenciada.
Passemos ao último grupo de mudanças demonstradas no desenvolvimento da psique, o das funções psicofisiológicas. Neste grupo estão as funções sensoriais, as funções mnemônicas, as funções tônicas, e todas as funções base formadoras da subjetividade da consciência, entre outros exemplos podem-se citar as experiências emocionais e as sensações. As mudanças ocorrem quando uma função é dirigida a um alvo e durante seu percurso se une com um ou mais processos existentes nas funções psicofisiológicas. Para explicar a mudança Leontiev (2001) diz que as sensações se incrementam em conexões com o desenvolvimento dos processos de percepções dirigidos para um alvo. Mas as mudanças só se dão se tiverem espaço na atividade.
Leontiev (2001) aponta a possibilidade do processo inverso entre as funções psicofisiológicas e a atividade, que torna possível o funcionamento melhor independendo da que estiver no lugar da principal, já que são processos interligados. Durante a transição de estágios atos voluntários conscientes são convertidos em operações conscientes que irá realizá-los em estágios posteriores que podem ser observados na brincadeira ou jogo.

AS ATIVIDADES PRINCIPAIS NO DESENVOLVIMENTO DA PSIQUE

Elkonin e Leontiev afirmam que cada estágio de desenvolvimento da criança é caracterizado por uma relação determinada, por uma atividade principal que desempenha a função de principal forma de relacionamento da criança com a realidade. Para esses estudiosos, o homem a partir do desenvolvimento de suas atividades, tal como    elas se formam nas condições concretas dadas de sua vida adapta-se à natureza, modifica-a, cria objetos e meios de produção desses objetos, para suprir suas necessidades. A criança, nesse caso, por meio dessas atividades principais, relaciona-se com o mundo, e, em cada estágio, formam-se nela necessidades específicas em termos psíquicos. Leontiev (1987) enfatiza que o desenvolvimento dessa atividade condiciona as mudanças mais importantes nos processos psíquicos da criança e nas particularidades psicológicas da sua personalidade.
Os principais estágios de desenvolvimento pelos quais os sujeitos passam são: comunicação emocional do bebê; atividade objetal manipulatória; jogo de papéis; atividade de estudo; comunicação íntima pessoal; e atividade profissional/estudo. A comunicação emocional direta dos bebês com os adultos é a atividade principal desde as primeiras semanas de vida até mais ou menos um ano, constituindo-se como base para a formação de ações sensório-motoras de manipulação. Na relação da criança com a sociedade, num processo de assimilação das tarefas e dos motivos da atividade humana e das normas de relacionamento que as pessoas estabelecem durante suas relações, o bebê utiliza vários recursos para se comunicar com os adultos, como o choro, por exemplo, para demonstrar as sensações que está tendo e o sorriso para buscar uma forma de comunicação social. O sentimento de amor filial, a simpatia por outras pessoas, o afeto amistoso, entre outros aspectos presentes na relação do bebê com outras crianças e o adulto, são enriquecidos e transformados no processo evolutivo da criança, tornando-se a base indispensável para o surgimento de sentimentos sociais mais complexos.
Já no primeiro ano de vida, a conduta da criança começa a reestruturar-se e cada vez mais aparecem processos de comportamento em virtude das condições sociais e da influência educativa das pessoas que a rodeiam. Para Vygotski (1996), há no primeiro ano de vida uma sociabilidade totalmente específica e peculiar em razão de uma situação social de desenvolvimento única, determinada por dois momentos fundamentais: o primeiro consiste na total incapacidade biológica, pois o bebê é incapaz de satisfazer quaisquer das suas necessidades básicas de sobrevivência. São os adultos que cuidam do bebê, e o caminho por intermédio dos adultos é a via principal de atividade da criança nessa idade. Praticamente todo comportamento do bebê está inserido e entrelaçado com o fator social e o contato da criança com a realidade é socialmente mediado. A segunda peculiaridade que caracteriza a situação social de desenvolvimento no primeiro ano de vida é a seguinte: embora o bebê dependa do adulto, ele ainda carece dos meios fundamentais de comunicação social em forma de linguagem. A forma como a vida do bebê é organizada o obriga a manter uma comunicação máxima com os adultos, porém essa comunicação é uma comunicação sem palavras, muitas vezes silenciosa, uma comunicação de gênero totalmente peculiar. Assim o desenvolvimento do bebê no primeiro ano baseia-se na contradição entre a máxima sociabilidade (em razão da situação em que se encontra) e suas mínimas possibilidades de comunicação" (Vygotski, 1996, p. 286).
Em um segundo momento, ainda na primeira infância, a atividade principal passa a ser a objetal-instrumental, na qual tem lugar a assimilação dos procedimentos elaborados socialmente de ação com os objetos e, para que ocorra essa assimilação, é necessário que os adultos mostrem essas ações às crianças. A comunicação emocional dá lugar a uma colaboração prática. Por meio da linguagem, a criança mantém contato com o adulto e aprende a manipular os objetos criados pelos homens, organizando a comunicação e a colaboração com os adultos.
A primeira função da linguagem é a comunicação, um meio de expressão e compreensão entre os homens, que permite o intercâmbio social. Até mais ou menos os 18 meses, a criança ainda não consegue descobrir as funções simbólicas da linguagem, que é uma operação intelectual consciente e altamente complexa. Por volta dos dois anos, a criança apresenta grande evolução da linguagem, dando início a uma forma totalmente nova de comportamento, exclusivamente humana. Inicia-se a formação da consciência e a diferenciação do "eu" infantil. O "pensamento da criança evolui em função do domínio dos meios sociais do pensamento, quer dizer, em função da linguagem" (Vygotski, 1993, p. 116). Esta é uma mediação entre o sujeito e o objeto do conhecimento. Dessa forma, o conhecimento e as experiências advindas da prática social podem ser difundidos por todos e apropriados por cada um, por cada sujeito em particular. Embora a linguagem constitua uma forma de comunicação com os adultos, para Elkonin (1987), ela não é a atividade principal nessa etapa de desenvolvimento; sua função maior é auxiliar a criança a compreender a ação dos objetos, é assimilar os procedimentos, socialmente elaborados, de ação com os objetos.
Vygotski (1996) identificou as seguintes crises: crises pós-natal — primeiro ano (2 meses-1 ano); crise de 1 ano — infância precoce (1 ano-3 anos); crise de 3 anos — idade pré-escolar (3 anos-7 anos); crise dos 7 anos — idade escolar (8 anos-12 anos); crise dos 13 anos — puberdade (14 anos-18 anos); e crise dos 17 anos. Nesses períodos de crise — que podem durar vários meses, um ano, dois ao máximo — produzem-se mudanças bruscas, rupturas na personalidade da criança. Conforme Vygotski (idem, ibid., p. 256-257), algumas características estão presentes nesses períodos: 1a.) os limites entre o começo e o final da crise e as idades contíguas são totalmente indefinidas — as crises originam-se de forma imperceptível e é difícil determinar o momento de seu começo e fim; 2a) um grande número de crianças que vivem essa fase são difíceis de educar, elas podem ter conflitos com outras pessoas e consigo mesmas, no entanto não é sempre assim, pois os períodos críticos são distintos em diferentes crianças; 3a) o negativismo é uma característica marcante. Esses períodos, portanto, são caracterizados por uma atitude de negativismo com relação às exigências antes cumpridas: as crianças tornam-se desobedientes, caprichosas, contestadoras, e, muitas vezes, entram em conflito com os adultos que as cercam, geralmente com os pais e professores. Bozhóvich (1987, p. 255) reforça essa idéia afirmando que todas as peculiaridades das crianças que vivem um período crítico indicam frustração, que surge como uma resposta à privação de algumas necessidades essenciais ao sujeito. Portanto, o autor conclui que essa reação de frustração ocorre quando as crianças não satisfazem suas necessidades ou quando, inclusive, reprimem ativamente aquelas novas necessidades que surgem no final de cada etapa de desenvolvimento.
No desenvolvimento de períodos críticos, com relação aos períodos estáveis, passam ao primeiro plano os processos de extinção e retirada, decomposição e desintegração de tudo que se havia formado na etapa anterior e caracterizava a criança de dita idade. A criança perde o que já tinha conseguido antes de adquirir algo novo" (Vygotski, 1996, p. 257). Ela perde os interesses que ultimamente ocupavam a maior parte de seu tempo e atenção, e agora é como se houvesse um esvaziamento das formas de suas relações externas, assim como de sua vida interior.
Os períodos de crise que se intercalam entre os estáveis, "(...) configuram os pontos críticos, de mudança no desenvolvimento, confirmando uma vez mais que o desenvolvimento da criança é um processo dialético em que a passagem de um estágio a outro não se realiza pela via evolutiva, senão revolucionária" (idem, ibid., p. 258). As crises mostram a necessidade interna das mudanças de estágios, da passagem de um estágio a outro, pois surge uma contradição aberta entre o modo de vida da criança e as suas possibilidades que já superaram esse modo de vida. No entanto, de acordo com Leontiev (1998a), essas crises não são inevitáveis: o que são inevitáveis são os momentos críticos, a ruptura, as mudanças qualitativas no desenvolvimento. É por isso, segundo Leontiev (1978), que atividade se reorganiza. As necessidades internas e externas levam a criança a mudar de interesse, a formarem-se novas atividades dominantes, num processo dialético entre o "velho" e o "novo" em termos de capacidades, habilidades, aspirações e formações psicológicas. Utilizando, neste aspecto, as palavras de Davidov (1988), podemos dizer que o que era uma atividade principal, na passagem de um estágio para outro, torna-se "latente", exercendo uma influência "subterrânea".
As forças que movem o desenvolvimento da criança em uma ou outra idade acabam por negar e destruir a própria base de desenvolvimento de toda idade, determinando, com a necessidade interna, o fim da situação social do desenvolvimento, o fim da etapa dada de desenvolvimento no passo seguinte, ou ao período superior de idade.



CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com relação à periodização do desenvolvimento, a psicologia tomou como base as idéias elaboradas sobre o problema das idades e as crises pelas quais passam a criança no desenvolvimento ontogenético de sua personalidade. Nessa perspectiva, a infância tem um caráter histórico concreto e as particularidades, as especificidades de cada idade também são historicamente transformadas. Os autores russos, como Vygotski, Leontiev e Elkonin, propuseram uma periodização do desenvolvimento fazendo referência a uma sociedade socialista. Os estágios de desenvolvimento, possuem uma certa seqüência no tempo, mas não são imutáveis. Eles dependem das condições concretas nas quais ocorre o desenvolvimento. As condições histórico-sociais concretas exercem influência tanto sobre o conteúdo concreto de um estágio individual do desenvolvimento como sobre o curso total do processo de desenvolvimento psíquico como um todo. Como exemplo, podemos citar a atividade principal do trabalho que, em cada época da sociedade, alonga-se ou não, de acordo com as exigências sociais.



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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DUARTE, N. Vigotski e o "aprender a aprender": crítica às apropriações neoliberais e pós-modernas da teoria vigotskiana. Campinas: Autores Associados, 2000.      
FACCI, M.G.D. Valorização ou esvaziamento do trabalho do professor?: um estudo crítico-comparativo da Teoria do Professor Reflexivo, do Construtivismo e da Psicologia Vigotskiana. Campinas: Autores Associados, 2004.       
LEONTIEV, A.N. Uma contribuição à teoria do desenvolvimento da psique infantil. In: VIGOTSKI, L.S.; LURIA, A.R.; LEONTIEV, A.N. Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. 6. ed. São Paulo: EDUSP, 1998a. p. 59-83.        
LEONTIEV, A.N. Os princípios psicológicos da brincadeira pré-escolar. In: VIGOTSKI, PALÁCIUS, J. Introdução à psicologia evolutiva: história, conceitos básicos e metodologia. In: COLL, C.; PALÁCIUS, J.; MARCHESI, A. (ORG.). Desenvolvimento psicológico e educação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995. v.1. p. 9-26.        
VIGOTSKI, L.S. Linguagem e desenvolvimento intelectual na idade escolar. In: VIGOTSKI, L.S.; LURIA, A.R.; LEONTIEV, A.N. Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. 6. ed. São Paulo: EDUSP, 1998. p. 103-117. 




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