O 15 de Março e a revolta generalizada no noroeste de Angola

O 15 de Março e a revolta generalizada no noroeste de Angola
A história dos protestos contra a presença colonial portuguesa, e posteriormente contra as práticas discriminatórias, remonta aos primeiros tempos da sua presença, ou seja, ao final do século xv, no Congo. As mesmas foram-se estendendo à medida que se conquistavam espaços territoriais, até princípios do século XX.
Estas lutas não podiam ainda, então, ser classificadas como «Luta de Libertação Nacional. As confrontações tinham por vezes, na sua génese, manifestações de sentido nacionalista, pela oposição ao invasor estrangeiro, mas outras vezes enquadravam-se em disputas tribais com portugueses aliados a uma das partes, ou ainda em meras manifestações de resistência às medidas coercivas de implantação do sistema colonial, ou ao comércio de escravos e recrutamento de mão-de-obra barata, à confiscação de terras, à cobrança de impostos, aos maus tratos, etc.
No início dos anos 60 as colónias portuguesas em África tornaram-se um campo de operações militares entre os patriotas africanos e as tropas dos colonizadores. O movimento de libertação que até então existira sob formas relativamente pacíficas atingiu, nos anos 60, a sua fase superior de desenvolvimento e tomou a forma de insurreição armada. Deste modo, a contradição fundamental, que durante décadas existiu nas possessões coloniais portuguesas, a contradição entre os interesses dos círculos coloniais e os interesses da classe escravizada das colónias entrou na fase da sua resolução revolucionária. O agravamento do antagonismo entre as forças coloniais e nacionalistas culminou em conflito armado aberto.
No início de 1955 inicia-se, pois, um intenso trabalho clandestino para a criação de células devidamente estruturadas e organizadas. É assim que, de 1955 a Março de 1961 as células da UPA em Angola, em geral, e em Luanda, em particular, desenvolveram um intenso trabalho político clandestino consciencializando politicamente aqueles que seriam os principais autores do início da luta de libertação nacional.
O 15 de Março de 1961, no Norte de Angola, deflagrou em parte na mesma região onde, entre 1913 e 1915, se deram as revoltas de Vita Nkanga (Álvaro Tulante Mbuta), no Ambwila, de Mbianda Ngunga, no Zombo e dos Mafula, no Pombo, em 1918. É, portanto, uma região repleta de acontecimentos históricos que enriquecem a amplitude do 15 de Março neste mesmo espaço geográfico.
Vita Nkanga (Álvaro Tulante Mbuta), Mbianda Ngunga e os Mafula não receberam armas, munições ou auxílios e conselheiros externos, como sucedera com o 15 de Março de 1961. O nacionalismo no seio dos Bakongo vai crescer no exílio, o que constituirá a maior distinção relativamente ao nacionalismo modernista nascido em Angola O ambiente francófono em que se encontravam e o tipo de sistema colonial aí estabelecido (administração indirecta), favoreceu esta particularidade. Os movimentos anteriores foram pouco. Conhecidos, pois foram pouco divulgados pelo pouco impacto que se presume tenham criado. Porém, nesse período, também não tiveram equivalentes em Angola até 1961. Quer isto dizer que, nessa altura, os cafeicultores contaram com o apoio de um movimento nacionalista sediado em Léopoldeville, depois Kinshasa.
Foi a facção Baptista dos Bakongo, exilados no Congo Belga, que constituiu a ponta de lança do movimento etno-nacionalista, cujas reivindicações sairão progressivamente do estreito quadro monárquico para se estenderem ao conjunto do grupo Bakongo, tomando, desde 1957/58, o estatuto de 'reivindicação política para a independência de toda a Angola.
O peso da opressão que os africanos carregavam, a necessidade de se libertar, a necessidade dos africanos de Angola terem de aceitar maiores sacrifícios para conquistar o seu lugar na luta de libertação, a liberdade do homem angolano da opressão física e mental construída a partir da fraqueza para a força e da derrota para a vitória, a proximidade de Angola com o Congo independente, a influência do Tocoísmo, Kimbanguismo e de outros movimentos religiosos, criaram igualmente condições para a resistência na região.
Foi em volta daquele núcleo duro e dessas influências que se organizou a sublevação do Norte de Angola em 15 de Março de 1961, tendo sido o único movimento nacionalista angolano que foi tomado a sério pelas potências ocidentais e pelos estados africanos já independentes e, por isso, o primeiro a beneficiar de apoios externos substanciais, permitindo-lhe assumir o monopólio das acções militares contra as forças armadas portuguesas em quase todo o Norte de Angola, a UPA ocupou uma posição vantajosa no início da luta de libertação nacional.
O 15 de Março de 1961 foi uma resistência puramente anti-colonial. Conseguiu entrincheirar-se verdadeiramente (com maior intensidade) no triângulo Bembe-Carmona-Nambuangongo e noutras regiões tão diferentes umas das outras como as que dependiam de outros distritos, como foram os casos de Quitexe e Aldeia Viçosa, que pertenciam ao Kwanza Norte, etc. Essa data não se revestiu de qualquer espontaneidade, já que por muito tempo se manteve o sigilo da operação. Os preparativos foram intensificados com a iniciação dos grupos militares no manejo de armas automáticas e semi-automáticas, asseguradas por contingentes tunisinos integrados nas forças das Nações Unidas estacionadas no ex-Congo Belga. Terminados os preparativos político-militares, tanto no interior como no exterior de Angola, foram traçadas as áreas operacionais e selecionados os seus principais comandantes operacionais

Apesar da falta de uniformidade, a diversidade de terrenos e a sua 'vegetação conferiram condições propícias à revolta e essa data passou a constituir um marco histórico importante da historiografia da Angola colonial, do início da segunda metade do século XX, na medida em que representou o culminar da impaciência que pairava contra o sistema administrativo colonial português, numa altura em que sopravam, no continente, os ventos da auto-determinação dos povos colonizados.